Vincere

“Vincere”, Itália, 2009

Direção: Marco Bellocchio

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Desde as primeiras cenas, o diretor, Marco Bellocchio, aos 70 anos, impressiona. Mostra um fanfarrão que desafia Deus e uma mulher extasiada perante esse homem de gestos teatrais e olhar escuro. Tudo está ali. Os elementos da tragédia se apresentam com simplicidade magistral.

“Vincere”, baseado no livro “O filho secreto do Duce” de Pieroni, com roteiro assinado pelo próprio Bellocchio e Daniela Ceselli, conta um episódio desconhecido da história da Itália pela voz de uma mulher que foi riscada da história oficial. Ida Dalser, a primeira mulher de Benito Mussolini e seu filho, vão ser cruelmente destituídos de liberdade e condenados a uma morte em vida, ambos trancados em manicômios, onde morreram.

E ela acalentara tantos sonhos… Chegara a vender tudo o que tinha, para ajudar o homem que adorava a fundar o jornal “Il Poppolo d’Italia”, embrião do Partido Fascista.

Na cama com ele, seus olhos fechados de amor, não viam os dele, abertos, procurando outro êxtase em fúria contida. Casam-se em 1914 e ela tem um filho, reconhecido pelo pai (o ator Filippo Timi faz os dois papéis com intensidade feroz).

Quando estoura a Primeira Grande Guerra, ele se alista e ela só vai reencontrá-lo em uma cama de hospital, ferido, assistido pela mulher Rachele (Michela Cescon), por quem fora preterida.

E aqui começa um calvário que Bellocchio filma de maneira empática e solene.

Ida Dalser (Giovanna Mezzogiorno, belíssima e excelente atriz) nunca aceitou deixar de ser a mulher do Duce e mãe de seu primeiro filho, apesar de ter todos os documentos dessa união destruídos pelos fascistas. Calada de forma brutal, ela não se deixa abater. Proclama alto e bom som que ela é a verdadeira mulher do homem que todas as italianas queriam.

Diz Bellocchio:

“Essa mulher aceitou a própria destruição. Mas não foi por loucura. Ela escolheu a rebelião absoluta, o que prova uma coragem extrema.”

Mas essa coragem torna-se a obsessão de uma vida.

Após o episódio do hospital, no qual ela encontra a mulher que seria a esposa oficial até o fim, é no cinema que Ida e nós, espectadores, vamos vendo as imagens reais, em preto e branco, da ascensão de Mussolini, não mais um ator, mas ele mesmo. As imagens das notícias passadas nos cinemas da época impactam e mostram como Bellocchio é um mestre da narrativa.

Aliás o diretor usa o cinema dentro do filme com sensibilidade. Em uma passagem, afastada do filho, Ida assiste a “The Kid” de Charles Chaplin. Sua dor, identificada à dramaticidade da dupla separada na tela, emociona. O psiquiatra que tenta ajudá-la no manicômio, assiste ao seu desespero e alude aos tempos difíceis que todos viviam sob o fascismo. É preciso ser ator e suportar a humilhação para sobreviver.

Mas Ida não sabe ser razoável…Ela tem um lado Medéia que a empurra para a tragédia.

Eis que uma mulher representa uma nação: a Itália busca um “Salvador”. Benito Mussolini ascende à sua sacada em Roma onde discursa socando o ar, mãos na cintura e “rictus” facial de um possuído, para o povo que o aclama. Ele grita: “E vinceremo!”

Mas tanto a mulher quanto a nação vão passar do amor enlouquecido à decepção e ao ódio.

Marco Bellocchio já mostrou na tela a loucura das Brigadas Vermelhas em “Bom Dia, Noite” (2003) que trata do seqüestro e assassinato de Aldo Moro em 1978.

Em “Vincere” expõe a loucura do fascismo, mostrando como sua ideologia de extrema direita faz Mussolini aliar-se a Hitler e jogar a Itália em uma guerra da qual o país sai combalido.

Tanto na vida privada como na pública, Mussolini foi o algoz onipotente, obcecado pela vitória a qualquer preço.

O mundo não pode esquecer essa história cruel de fanatismo e impiedade. “Vincere”, com grande arte, cumpre esse papel de nos fazer lembrar das conseqüências arrasadoras da tirania no poder.

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Salt

“Salt” – Estados Unidos, 2010

Direção: Phillip Noyce

Filmes de ação não fazem o meu gênero. Mas fui ver “Salt”, ainda que de pé atrás.

Aliás, fui ver Angelina Jolie. E tenho que confessar que me diverti. O filme é ela. Pulando, escalando, correndo, lutando, matando gente ruim. E sem quebrar uma unha. Mentira. Vi uns arranhões no joelho e algum sangue no rosto e na camisa rasgada, quando ela enfrenta um pelotão sozinha.

Sim, porque a gata Jolie sempre cai em pé, além de ter sete vidas e muito fôlego. E, de quebra, esbanja beleza com seus olhos de uma cor que mais ninguém possui. Para não falar daquela boca que só fica linda nela.

“Salt” não quer ser um filme realista. Longe disso. É pura fantasia e entretenimento. O diretor e roteirista, o australiano Phillip Noyce, consegue engatar uma coisa na outra usando, além de muita ação, reviravoltas de enredo, surpresas, complôs e jogo de espelho. E por isso a gente fica se perguntando o filme inteiro: quem é Salt?

Aparentemente Evelyn Salt, a personagem de Jolie, é uma agente da CIA e ponto final. Mas, por trás daquela aparência mansa esconde-se uma fera inesperada.

Casada com um biólogo alemão que encontrou no borboletário de um museu, sem mais aquela, ela se transforma de borboleta em aranha.

E mais não conto porque seria estragar a graça do filme.

O roteiro de “Salt” tinha sido imaginado para Tom Cruise que desistiu do projeto porque percebeu que iria fazer mais do mesmo. Achou o roteiro muito parecido com “Missão Impossível” e foi rodar “Encontro Explosivo”com Cameron Diaz.

E dá para entender porque Cruise não quis e Angelina pegou correndo. “Salt”só tem graça com uma mulher no papel principal. Faz toda a diferença. Mérito dela ter percebido isso.

Aliás, Angelina Jolie estreou cedo no cinema, aos 6 anos, em um filme com o pai, o ator John Voight, em 1982. Mais tarde foi modelo, estudou cinema na Universidade de New York mas apareceu mesmo para o grande público só em 1998, através de um papel num filme para a TV, no qual fazia Gia, uma top-model drogada que morria de AIDS.

Colecionou vários prêmios em sua carreira, desde então, mas o principal foi o Oscar de melhor atriz coadjuvante em 2000 que ela mereceu pelo papel de uma sociopata no filme “Garota Interrompida”, ao lado de Winona Ryder.

Mais tarde, em 2005, durante a filmagem de “Mr e Mrs Smith”, conheceu Brad Pitt e daí em diante todo mundo já sabe o que aconteceu.

Hoje, o casal mais bonito do cinema está separado e é uma pena… Eles tem no total seis filhos, sendo três adotivos e três biológicos. E aquela que colecionava tatuagens e punhais, não falava com o pai e se drogava, tornou-se embaixadora da Boa Vontade da ONU e frequentemente participa de missões humanitárias para ajudar refugiados na África, Cambodja e Paquistão.

A antiga “ovelha negra”de Hollywood transformou-se e parece que quer esquecer o passado sombrio. Dizem que de tudo que ela ganha, uma grande porcentagem vai para a caridade.

Ela merece o sucesso que tem.

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