Minhas Mães e Meu Pai
“Minhas Mães e Meu Pai” – “The Kids Are All Right”, EUA, 2010
Direção: Lisa Cholodenko
Oferecimento
Leon Tolstoi, escritor russo do século XIX, começa assim o seu conhecido romance, “Anna Karenina”: Todas as famílias felizes são iguais. As infelizes é que são diferentes. Cada uma infeliz à sua maneira.
Pensei nisso enquanto saia do cinema depois de assistir ao novo filme de Lisa Cholodenko, “The Kids Are All Right”, ou seja, “As Crianças Estão Bem”.
O tradutor brasileiro, com a evidente intenção de vender o filme, tratou de batizá-lo com um título que cairia bem em uma daquelas velhas chanchadas da saudosa Atlântica: “Minhas Mães e Meu Pai”.
Ora, a pergunta então é: este é um filme “gay”?
E a resposta é sim, se pensarmos no casamento de 20 anos que une harmoniosamente a durona ginecologista Nic e a frágil paisagista Jules. As duas formam um casal que se dá bem na cama e lê-se afeto em suas presenças mútuas.
E a resposta é não, se, prestando atenção nos filhos das duas, Joni que vai fazer 18 anos (Mia Wasikowska) e Laser de 15 (Josh Hutcherson), nos envolvermos com as cenas de café da manhã e jantares na cozinha da família e sessões-pipoca no sofá. Não há nada de diferente, nada fora do comum. As mesmas conversas e as mesmas situações que estamos acostumados a ver num cenário convencional.
E tudo continuaria assim, se Laser e Joni não se metessem a procurar o pai biológico deles. Concebidos cada um por uma das mães, as crianças são fruto de inseminação artificial, sempre com o mesmo doador.
E aí começa uma situação que lembra “Teorema”, o filme de 1968 de Pasolini, quando o aparecimento de um intruso abala as estruturas de uma família burguesa.
Claro, o “doador de esperma”, Mark Ruffalo, esplêndido no papel, vai mexer com o equilíbrio conquistado por essa família.
Os filhos, imediatamente se envolvem com esse simpático e irresponsável sedutor que tem um restaurante “cool”, na moda, e que cultiva hortaliças e frutas orgânicas para os pratos de sua cozinha. Com esse pai tudo é uma festa, o que põe as mães sob uma luz menos brilhante.
Ele, por sua vez, está encantado com aqueles filhos que ele nem desconfiava que tinha, prontos, bonitos e sem problemas. O famoso “Édipo”vai comparecer nas vidas deles, fazendo a jovenzinha retraída descobrir a sexualidade e a rebeldia e o garoto, a competição com o pai e o ciúme.
As mães também se envolvem com aquela novidade na vida deles e, cada uma à sua maneira, vai ter que tomar uma atitude.
O filme é cativante. Muito graças à atuação dos cinco atores principais que se colocaram de corpo e alma nos personagens.E também devido ao roteiro muito bem escrito pela própria diretora e Stuart Blumberg.
“The Kids Are All Right”causou sensação em todos os festivais de que participou e foi sucesso de bilheteria nos Estados Unidos.Vamos ver como reage o público brasileiro.
Lidar com situações de vida real e preconceitos frente às neo-realidades da família e do casamento é cada vez mais um assunto para todos nós. Há no Brasil pessoas que julgam com muita severidade opções diferentes daquelas escolhidas por seus pares. A esses eu recomendaria vivamente o filme. Pode surpreender e fazer bem a pessoas que nunca se aproximaram do assunto com mais leveza e simpatia.