Meia Noite em Paris

“Minuit à Paris”, Estados Unidos/Espanha, 2011

Direção: Woody Allen

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“Plus ça change, plus c’est la meme chose”, diz o dito popular francês que quer dizer mais ou menos isso: quanto mais se muda, mais fica a mesma coisa.

Woody Allen, o diretor americano que já tinha filmado Paris em belíssimas tomadas no Sena em “Todo Mundo Diz Eu Te Amo” (1996), em seu novo filme “Meia Noite em Paris” vai demonstrar a sabedoria do ditado francês, além de homenagear a “ville lumière” (cidade das luzes).

Mostrando-se claramente à vontade entre personagens da cultura e vida parisiense do começo do século XX, Woody Allen presenteia o público que gosta dele com uma deliciosa comédia. E, aproveitando para não deixar de ser ele mesmo, vem novamente nos falar sobre a condição humana e seus tropeços.

A insatisfação crônica é marca do homem contemporâneo?

Woody Allen diz que não. Em “Meia Noite em Paris” ele demonstra como sempre existiu, e existirá, essa vontade de estar em outro lugar, em outra época, para poder ser alguém diferente do que se é.

Sabemos como a saudade de um passado que não se viveu e o desejo de voltar no tempo são temas recorrentes na literatura e no cinema.

Nessa comédia sofisticada tudo isso vai ser revisto sem mau humor, nem castigos superegóicos, como acontece às vezes em outros filmes do cineasta Woody Allen.

Paris é uma festa? Depende de como você olha.

Para Gil (Owen Wilson), um frustrado escritor americano que só escrevia roteiros para Hollywood, Paris estava sendo um lugar chato, onde a família burguesa de sua namorada se divertia muito em férias.

Mas Woody Allen faz a fada madrinha e, como em um conto de fadas, à meia noite, em suas andanças às cegas por Paris, ele encontra por acaso a porta que o leva para os anos 20, numa cidade de sonho, freqüentada por todos os escritores e artistas que ele sempre admirou.

Qual Cinderela às avessas, é à meia noite que passa a carruagem de Gil, um Rolls Royce principesco.

Ele vai conhecer “le tout Paris” dos “anos loucos” à “Belle Époque” e vai se inspirar para escrever seu tão adiado romance.

“É a Paris mítica do imaginário de todos os americanos”, disse Woody Allen quando foi entrevistado em Cannes, onde seu filme abriu o festival e foi aplaudido de pé pela platéia seleta.

Conviver com Zelda e Scott Fitzgerald, Ernest Hemingway, Gertrude Stein (uma ótima Kathy Bates) e de quebra, Picasso, Luis Buñuel, Man Ray, Josephine Baker, faz o americano Gil (o alterego de Woody Allen dessa vez), querer abandonar o século XXI e sua noiva (Rachel McAdams) para se apaixonar e se perder na Paris dos sonhos dele.

E a musa de todos os pintores da Paris dos anos 20, encarnada por Marion Cotillard (“Piaf”), brilha no filme de Woody Allen, que assim fala dela:

“Marion é maravilhosa. No início, a personagem era uma norte-americana em Paris. Mudei só para tê-la no elenco.

Ela chegou vacilante, estressada, sem saber se conseguiria fazer o papel. Eu tinha certeza. Marion representa a própria sedução da França na tela.”

E Carla Bruni-Sarkosy? Sim, ela também está no filme “Meia Noite em Paris”. A primeira dama da França faz um pequeno papel de guia dos americanos e, nos poucos minutos que ocupa a tela, é ela mesma, com aquele jeitinho sedutor com que canta suas canções.

Porque ninguém diz não a Woody Allen que, aos 76 anos, parece ter se rendido à sabedoria que a idade traz, podendo fazer tudo que quer na tela do cinema.

E como todo ano tem um novo Woody Allen, vamos ver esse com delícia e esperar pelo próximo que será rodado em Roma, “The Wrong Picture”, com Penélope Cruz e Alec Baldwin.

Porque a gente sempre quer mais em se tratando de Woody Allen.

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Namorados para Sempre

“Namorados para Sempre”- “Blue Valentine”, Estados Unidos, 2010

Direção: Derek Cianfrance

O que será que cria um par e mantém esse casal unido?

O amor, responderia a maioria das pessoas.

Mas logo alguém perguntaria: e o que é o amor?

E aí entramos em um terreno complicado…

Porque muitos sentimentos complexos podem passar aos olhos de todos e, mesmo do casal que vive a realidade desses sentimentos, por amor, sem o ser na verdade.

E, como já dizia o poeta, tem que ser “eterno enquanto dura”, ainda por cima…

A melhor saída seria, então, acompanhar as assim chamadas histórias de amor, para podermos ver mais claramente o que se esconde e se mistura atrás desse rótulo.

E, com a certeza de que, cada par enamorado vai desenvolver esse tema com variações próprias.

É o que acontece no filme “Namorados para sempre”, péssima tradução para o titulo original “Blue Valentine”, que poderia ser algo como “Tristes Namorados” no plural ou no singular “Triste Namorada/o”, porque o inglês tem dessas coisas sutis.

De qualquer modo, “Namorados para Sempre” é uma história de amor.

E, como já vimos, só pode ser um amor com características próprias, como todos os amores que são sempre únicos. Nisso, o amor acompanha a singularidade dos seres humanos que, por mais que se pareçam, sempre são diferentes.

Cindy (Michelle Williams) e Dean (Ryan Gosling) moram em uma casa modesta em meio à natureza, nos subúrbios de uma cidadezinha anônima americana. Tem uma filhinha de 5 anos.

No começo do filme vemos Frankie (a estreante Faith Wladyka) chamando sua cachorrinha:

“- Megan! Megan!”

E como não consegue achá-la, corre para o pai.

Ryan Gosling faz muito bem o papel de pai amoroso, brincalhão, participante intimo da vida da filha. Eles fazem um par adorável.

E onde está a mãe dessa família?

Dormindo.

A seu favor podemos dizer que ela trabalha muito e que o marido não tem emprego fixo, tomando para si alguns afazeres domésticos e cuidados com a filha.

Assim, quando a mãe de Frankie é acordada pelo par de “tigres”, pai e filha que pulam em cima dela, em clima de brincadeira solta, vemos seu belo rosto jovem crispar-se.

Não só não entra na brincadeira, como tudo nela é censura.

Michelle Williams foi indicada ao Oscar por esse papel e mereceu.

Ryan Gosling não fica atrás. Apesar de esquecido no Oscar, foi indicado junto a Michelle Williams ao Globo de Ouro. Sua atuação faz com que seu personagem cresça durante o filme e que dispute, palmo a palmo com a atriz, a admiração pela naturalidade com que se entrega à relação amorosa da história que une pessoas tão diferentes. Ele, mais simplório que ela, muito envolvido na tarefa de criar uma família de verdade, com o coração aberto e disponível. E ela mais contida e ambiciosa e parecendo querer rever suas escolhas de vida.

No desenrolar da trama vamos ver em “flashbacks” como os dois se encontraram e de que modo casaram.

E, no presente da cena, como tentam salvar seu casamento deteriorado com a passagem do tempo e o fim das ilusões.

Uma noite em um motel barato vai revelar mais do que sabiam um do outro até aquele momento.

Com o filme, vamos entender que, às vezes, a gratidão pode ser confundida com amor.

Bem como vamos observar que carências afetivas graves podem levar as pessoas a se agarrar, como se um fosse a tábua de salvação do outro, em meio às tempestades da vida.

E aí, sob a luz azul do motel, que expressa a qualidade triste daquele casal tão jovem e já desiludido, nosso coração se aperta e torcemos para que o amor exista e resista.

Esse é o maior charme do filme bem dirigido por Derek Cianfrance, que usa música, luz e bela fotografia para nos conquistar, sem pudor.

Refletir sobre o amor faz a gente amadurecer e tentar fazer com que ele seja real em nossas vidas. Ou que, ao menos, deixe uma doce lembrança.

Tarefa difícil mas recompensadora.

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