Além da Estrada

“Além da Estrada”- “Por El Camino”, Brasil/ Uruguai, 2010

Direção: Charly Braun

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Como se preserva uma boa lembrança?

Essa parece ter sido a intenção do jovem diretor Charly Braun, quando filmou “Além da Estrada”, seu primeiro longa, do qual foi também co-autor do roteiro.

O Uruguai, país de sua avó e onde mora seu pai, lugar de suas férias de verão, é aqui um território afetivo e sentimental mais do que geográfico e turístico.

Há uma história simples, ingênua até. Um argentino ruivo de 30 anos (Esteban Feune de Colombi) chega a Montevideo para iniciar uma viagem que o levará ao terreno que seus pais, mortos em um acidente de carro, deixaram para ele como herança.

No caminho, Santiago dá carona a uma jovem belga, Juliette (Jill Mulleady), que procura um antigo namorado que ela sabe que vive numa comunidade perto de Punta Del Este.

Pela estrada, esses dois vão se conhecendo, brincando juntos, trocando olhares e descobrindo a paisagem.

Aos olhos deles descortinam-se os imensos campos brumosos, as praias com um mar cinzento sob um sol pálido, as grandes pedras e os cactus floridos, ruínas, nuvens carregadas no céu, animais e homens toscos. Tudo vai passando, fixado na película para sempre.

Não há pressa, nem nos personagens nem na câmara do diretor, que vai mostrando o “seu” Uruguai, lugar que ele não quer esquecer e que parece estar fadado a se tornar um outro país, com a chegada de gente nova que compra terras para fazer condomínios.

Há uma despedida inevitável em “Além da Estrada”.

Perde-se o passado, a infância e até o presente, se não se abre o olho, como aconselha tio Hugo (Hugo Arias), que mora numa fazenda em uma belíssima casa de pedra.

“Além da Estrada”ganhou o prêmio de melhor direção no Festival do Rio em 2010, o de melhor filme no I Festival Lume de Cinema Internacional e o do público em Saint Petersburg na Rússia.

A bela Guilhermina Guinle, irmã de Charly Braun por parte de mãe, faz uma participação charmosa no filme. Naomi Campbell, a “top model”, também aparece fazendo ela mesma.

Na cena final, uma antiga ponte inacabada, que vai ser demolida para a construção de uma nova, é uma metáfora para a vida que só acaba com a morte.

Quem viveu os momentos felizes que Charly Braun viveu na infância, ao lado do pai Martin e da mãe, a suave Rosa May, nas praias do Uruguai (cenas de vida real que vemos em filminhos que passam durante os créditos finais), ainda vai ter muita coisa para viver e histórias para contar.

Que venham os próximos filmes, para você continuar a nos encantar com o seu talento promissor, Charly Braun.

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Uma Doce Mentira

“Uma Doce Mentira”- “Des Vraies Mensonges”, França, 2010

Direção: Pierre Salvadori

 

A filha é magrinha, cabelos negros e curtos, com aquele sorriso tão característico de Audrey Tautou, que já nos conquistou no papel de Amélie Poulain.

A mãe tem uma beleza madura, cabelos alourados, silhueta desejável e aquele “je ne sais quoi” que as francesas esbanjam.

Ora, mãe e filha, costumam ser um par complicado. Quase sempre, sentimentos conflitivos e ambivalentes cercam essas duas mulheres. E quando isso é bem usado em um roteiro, já temos meio caminho andado.

Em “Uma Doce Mentira”, a nova comédia romântica francesa de Pierre Salvatori, vamos assistir a vários qüiproquós envolvendo Émilie, a filha (Audrey Tautou) e Maddy, a mãe (a veterana e ainda bela Nathalie Baye).

Na tradição da comédia francesa, como em Feydeau, preparem-se para uma série de trapalhadas que aproximam e afastam os personagens. No caso, a jovem cabelereira que parece frágil mas se faz de durona, sua mãe que não se conforma com a separação que aconteceu há quatro anos e Jean (Sami Bouajila), o moço tímido que mexe com o coração das duas.

Cartas anônimas de amor circulam para lá e para cá entre esse trio, na cidadezinha de Sète, à beira-mar, no sul da França.

E é tudo na melhor das intenções. Mas algo dá errado e vamos percebendo que as confusões envolvendo mãe e filha são fruto de nós mal resolvidos. Felizmente, aqui não encaramos a tragédia, porque o filme é uma comédia leve, divertida e sobretudo charmosa.

As situações engraçadas de “Uma Doce Mentira” fazem a platéia rir com gosto e, diferente de um outro tipo de comédia muito em voga hoje em dia, não precisam para isso que alguém seja ridicularizado ou que se use uma linguagem vulgar.

Trata-se de uma comédia que brinca com traços comuns nas pessoas como a timidez, a sensação de inferioridade frente a alguém mais estudado que nós, a dor de ser abandonado e trocado por outra pessoa mais jovem, a teimosia em não querer reconhecer que estamos envolvidos com alguém por puro medo do amor, coisas simples de gente como a gente. Pitadas de ciúmes, maldadezinhas e vinganças temperam as muitas reviravoltas.

E é original a cena na qual ouve-se uma confissão atrás de uma cortina, à qual assistimos acompanhados de outros dois personagens. Um cinema dentro do cinema.

Pierre Salvadori, diretor e co-autor do roteiro, sabe fazer bem esse gênero de comédia leve, bem humorada, com personagens de carne e osso, interpretados por atores que convencem por seu talento e sua entrega aos tipos que vivem na tela.

“Uma Doce Mentira” agrada e deixa todo mundo de bem com a vida na saída do cinema. O que não é pouca coisa.

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