Therese D.

“Therese D.”- “Thérèse Desqueyroux”, França, 2012

Direção: Claude Miller

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No verão de 1922, num lugar chamado Esperança, no campo francês, vemos duas meninas, Thérèse (Audrey Tautou) e sua amiga e vizinha Anne (Anais Demoutier), de bicicleta, na floresta de pinheiros que pertencia à família delas.

Depois, as duas deitadas em um barco, aproveitando o sol. Anne relaxa e Thérèse lê.

Em outro dia, Anne, com um tiro certeiro, abate uma pomba. Thérèse olha, com curiosidade e quase horror, a amiga arrancar o pescoço da avezinha. Mau presságio?

Um veleiro de velas vermelhas passa na praia e um rapaz canta uma canção.

“- Um dia meu irmão vai se casar com você”, diz Anne para a amiga.

Em abril de 1928, Thérèse Laroque passeia de braços dados com Bernard, irmão de Anne.

“- Vamos juntar nossas terras quando casarmos.”

“- Bernard, vou casar com você por causa de seus pinheiros. Você também vai fazer a mesma coisa pelo mesmo motivo.”

“- Ah! Quantas ideias falsas nessa cabecinha!” retruca o noivo.

“- Você vai ter a chance de destrui-las”, responde ela.

No belo casarão da família Desqueyroux, a mãe diz para o filho (Gilles Lellouche):

“- Me incomoda que a sua futura esposa tenha mais terras do que nós… E depois, ela fuma como uma chaminé!”

Mais tarde, Thérèse diz para Anne:

“- Minha cabeça está cheia de ideias. É isso que me dá medo, não o casamento com seu irmão, Annette. O casamento vai me salvar dessa desordem na cabeça. Escolhi a paz.”

Mas o casamento vai cobrar, cada dia, que ela esqueça de ter uma vida individual, já que pertencia à família do marido.

Será que o romance proibido da agora cunhada Anne com o belo rapaz português, que mora em Paris, e é judeu, mexeu com Thérèse?

É ela que é mandada pela família para falar com o rapaz para que termine o namoro. E escuta dele (Stanley Weber):

“- Mas eu nunca pensei em casamento! Anne teve a chance de amar o homem de sua vida. Depois ela vai se casar como você, como qualquer mulher da província.”

Thérèse, que sempre fora pálida, vai ficando mais fria e distante. Só os olhos, vivos e atentos, parecem procurar uma saída.

Quando a filha nasce, ela não é maternal nem se preocupa em cuidar do bebê.

Sua cabeça fervilhava de ideias malsãs.

Uma aparente placidez escondia uma turbulência interna perigosa, delirante, que buscava uma libertação daquela prisão onde ela se sentia fenecer.

Audrey Tautou, 36 anos, está maravilhosa na pele dessa mulher que conquista seu espaço pagando um preço muito alto.

Claude Miller, que morreu antes de ver seu filme nas telas, adaptou o livro de 1927, escrito por François Mauriac (1885-1970), prêmio Nobel de literatura.

Quem leu o livro, que dizem ser sombrio, percebe que o diretor não concorda com a punição e o desprezo que o escritor reservava para sua personagem Thérèse. Claude Miller disse a Audrey Tautou que queria fazer um filme feminista e foi com esse viés que dirigiu “Thérèse D.” Percebe-se que ele sente simpatia por essa mulher aprisionada por costumes rígidos e uma tradição cruel que dava pouca importância aos desejos de afirmação das mulheres que viveram naquela época.

Uma bela fotografia e minuciosa direção de arte são um atrativo a mais nesse interessante filme de época.

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Sejam Muito Bem-vindos

“Sejam Muito Bem-vindos”- “Bienvenue Parmi Nous”, França 2012

Direção: Jean Becker

Aquele senhor tem um problema. Vê-se pelo modo como fala, como olha as pessoas, como se movimenta.

“- O dia está lindo!”, diz sua mulher.

Mas ele está cinzento e, ao invés de comprar o pernil encomendado por sua esposa, traz para casa um rifle com pouquíssima munição.

“- Desistiu da pesca? Vai caçar javalis?”, tinha perguntado o dono da loja de esportes.

Não. O senhor Taillandier, pintor de sucesso, conhecido na cidadezinha onde mora, não vai caçar. Quer se matar…

O filho estranha o jeito do pai quando recebe no almoço seu presente de aniversário:

“- Uma viagem para a Itália com mamãe!”

Ele sai da mesa:

“- Não tenho fome…”

A neta comenta:

“- O que tem o vovô? Está nervoso…”

E o filho pergunta para a mãe:

“- O que é que o papai tem?”

“- Não sei… Acho que é depressão. Tentei falar com ele mas você sabe como ele é…”, responde desanimada.

Isso pode acontecer com os melhores seres humanos. Ao ver que a vida vai acabando, a juventude que se foi, aquilo que não aconteceu, a pessoa se depara com uma grande tristeza, raiva e mau humor com tudo e todos. É a depressão, como rótulo.

Taillandier ( o grande ator Patrick Chesnais) deixa então um bilhete para sua mulher (Miou- Miou) e sai sem rumo pela estrada.

A câmara fixa seus olhos baços e seu rosto contraído, que são o retrato de uma encruzilhada onde ele se encontra e não decidiu ainda para onde ir.

Quer viver, apesar de tudo ou morrer? O rifle está no porta-malas.

Chove muito e no farol, alguém invade o carro do pintor perdido. É Marilou (a estreante Jeanne Lambert), uma garota de 15 anos, que foi expulsa de casa pela mãe e pelo padrasto.

Ela parece tão perdida como Taillandier.

Mas esse encontro casual vai selar uma mudança na alma daqueles dois. Um vai despertar no outro algo que parecia inexistente antes de se encontrarem.

Jean Becker, filho do grande diretor de cinema Jacques Becker(1906-1960), que dirigiu “Les Amants de Montparnasse”(1958), e que faz 80 anos em maio, é conhecido do público brasileiro por “Minhas Tardes com Marguerite” (2010) e “Conversas com Meu Jardineiro” (2006). São filmes que falam do ser humano com carinho e de como precisamos do outro para nos reinventarmos. Seus personagens são pessoas que gostaríamos de conhecer.

Alguns acharam o filme chinfrim, raso e simplório. Talvez porque não perceberam que a força dos filmes de Jean Becker é olhar o ser humano com simplicidade e delicadeza.

Adaptando o romance de Eric Holder, o diretor de “Sejam Muito Bem-vindos” privilegia, como sempre, o carinho que mostra com seus semelhantes, mostrando que a vida oferece sempre uma oportunidade de crescimento em uma nova direção.

Muita gente gosta de ir ao cinema para ver isso.

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