Ferrugem e Osso

“Ferrugem e Osso” - “De Ferrouille et d’Os”, França, 2012

Direção: Jacques Audiard

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Às vezes, o amor floresce onde menos se espera. Nada parece unir aqueles seres, aparentemente sem nada a ter um com o outro.

O que acontece, talvez, é que a agressividade, mal usada, afasta quem poderia ser descoberto pelo coração. Uma crise pode uni-los, ensinando a usar a agressividade em benefício próprio. “Ferrugem e Osso” é a história de duas pessoas assim.

Uma delas é Ali (o excelente ator belga Matthias Schoenaerts), ex-lutador de box e pai por obrigação, que vai procurar a irmã em Antibes, sul da França.

Ela acolhe os dois e cuida de Sam que tem cinco anos. Ali procura emprego e vai ser segurança numa boate.

É lá que ele conhece Stéphanie (Marion Cotillard), que ele resgata ensanguentada do chão, em meio a uma briga. Ela é parecida com Ali, violenta e quieta.

Depois de culpar a moça pela briga, por causa dos trajes que ela usa, ele a leva para casa. Lá ele vê as fotos com as orcas e pergunta surpreso:

“- É você?”

O rapaz que vive com ela faz cara feia mas ela não dá atenção e providencia gelo para a mão machucada de Ali, que deixa seu telefone com ela.

No Aquário de Antibes, a música anuncia o show das orcas. Stéphanie e seus colegas, aparecem no palco.

O voo dos belos animais, suas piruetas no ar, aquelas enormes baleias obedecendo às mãos dos seus treinadores, maravilham o público.

Mas, naquele dia, fora do programa, em câmara lenta, uma orca invade a passarela. Destroços boiam. O corpo inerte de Stéphanie flutua na água azul ensanguentada.

Horror.

Ela sobrevive mas preferia ter morrido. Afunda em depressão.

Nesse momento de sua vida, Ali reaparece. Ele não tem pena dela. Mas ajuda do jeito certo. A história deles vai começar.

“Ferrugem e Osso” foi adaptado de um conto de Craig Davidson pelo diretor Jcques Audiard, conhecido por seu filme “O Profeta” de 2009, indicado ao Oscar de melhor filme estrangeiro e que ganhou o Grande Prêmio do Juri no Festival de Cannes.

A grande estrela do filme é Marion Cotillard, indicada novamente a melhor atriz do Oscar por esse papel. Ela já tem um, por “La Vie en Rose”, onde interpreta Piaf e já foi dirigida por grandes diretores, inclusive Woody Allen, em “Meia Noite em Paris”.

“Ferrugem e Osso” é uma história bem contada com elementos dramáticos emocionantes. Jacques Audiard conduz o filme num ritmo sem tropeços e existem cenas lindas de arrepiar.

A preferida de Marion Cotillard é a que ela filmou com a grande orca no Aquário, depois da tragédia de sua personagem. Há uma relação comovente entre a baleia e a atriz, filmada sem truques, em grande enquadramento. Põe a plateia em silêncio e alguns em lágrimas.

“Ferrugem e Osso” é daqueles filmes imperdíveis e inesquecíveis. Vai agradar a todos pela verdade e força das interpretações e da direção firme e sensível de Jacques Audiard, um nome que devemos guardar na memória.

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A Aventura de Kon-Tiki

“Kon-Tiki”- Idem, Noruega/ Dinamarca/Reino Unido, 2012

Direção: Joachim Roenning e Espen Sandberg

Na tela, um céu azul claro e montanhas com pinheiros e neve.

Um vulto surge ao longe e o vemos aproximar-se, em uma única tomada sem cortes. Aos poucos, distinguimos dois meninos. O de olhos azuis olha fixo para a câmara. Vê-se determinação no rosto infantil.

“- Thor, não faça isso!”

Outros meninos rodeiam Thor que, à frente de um buraco no lago gelado, pula para um pedaço de gelo que flutua e balança perigosamente com o peso do menino. O pior acontece. E Thor cai na água gelada.

Debate-se e afunda.

Não conseguimos saber quem foi mas um dos meninos consegue iça-lo para a superfície. Thor, pálido, treme da cabeça aos pés, deitado na neve.

Na cena seguinte, Thor está na cama, em silêncio, ouvindo seus pais comentarem preocupados:

“- Não sei por que você foi fazer isso…”, diz a mãe.

“- Promete que nunca mais vai voltar a fazer algo perigoso? Promete?”, diz o pai.

Parece que ele não prometeu nada. Porque aquele menino louro viria mais tarde a ser o chefe da expedição Kon-Tiki, uma aventura suicida, como comentavam na época.

Thor Heyerdahl, interpretado pelo norueguês Pal Sverre Valheim Hagen, em 28 de abril de 1947, sai do porto de Cullao, no Perú, com outros cinco tripulantes, em uma frágil jangada, feita exatamente como era construída pelos povos pré-colombianos há 1.500 anos atrás. Seu desejo é provar a tese de que a Polinésia foi descoberta pelos antigos povos que habitavam a região que hoje é o Perú, e não por asiáticos, como se acreditava até então.

Tudo começou porque Thor e sua esposa Liv (Agnes Kittelsen) viveram por 10 anos em Fatu Hiva, na Polinésia francesa. Estudaram a cultura, a fauna e a flora da ilha e a vida do dia a dia levou Thor a observações interessantes:

“- Nossa! Como esses povos asiáticos devem ter sido fortes para conseguir remar contra a correnteza para chegar aqui…”, diz Liv a Thor, os dois remando uma canoa.

Depois:

“- Como vocês vieram parar aqui?” pergunta Thor a um chefe tribal.

“- Nós acreditamos que o deus Sol, Tiki, trouxe-nos para essas ilhas a partir da terra por trás do mar. Viemos do leste. Tudo vem do leste. As correntes do mar também. Os Tiki navegaram o Sol.”

Juntando observações como essas, Thor Eyerdahl construiu sua teoria:

“- Os antigos não viam o mar como uma barreira mas como uma estrada.”

O filme é o relato fiel dessa expedição e dos perigos e contratempos que esses homens louros e corajosos enfrentaram. Navegaram 8.000 quilometros, em 101 dias, impulsionados pelas correntes e pelo vento, em meio a calmarias, tempestades, tubarões, ondas gigantes e o pior de tudo, o medo de morrer.

O menino, que ficou tão traumatizado com a queda na água gelada que nunca conseguiu aprender a nadar, conseguiu provar sua teoria, escreveu um livro sobre a expedição Kon-Tiki que vendeu 50 milhões de exemplares e rodou um documentário durante a viagem na jangada que ganhou o Oscar de 1950.

O filme é um tributo da Noruega a seu herói, Thor Heyerdahl (1914-2002) que viveu essa aventura fascinante, que acompanhamos com emoção nesse filme (indicado a melhor filme estrangeiro no Oscar de 2013), como se estivéssemos na jangada com ele e seus companheiros.

“A Aventura de Kon-Tiki” é um filme envolvente, muito bem dirigido, que sabe narrar a aventura, mostrar o épico e o dramático, além do perfil psicológico desses corajosos desbravadores.

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