Os Belos Dias

“Os Belos Dias”- “Les Beaux Jours” França, 2012

Direção: Marion Vernoux

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Quantos belos dias teremos ainda em nossa vida?

Essa pergunta não é para os muito jovens. Nem mesmo para os que ainda estão entre os 40 e os 50 anos.

São as pessoas de 60 que começam a se fazer essa pergunta que não tem resposta certa.

Caroline (Fanny Ardant, elegante e bela) perdeu sua melhor amiga para um câncer e sombra num luto que todos confundem com enfado.

Ela era dentista e se aposentou depois de uma feia discussão com uma cliente. Agora tem tempo de sobra. Para quê?

O pior de tudo é que ninguém se dá conta da culpa que Caroline arrasta para um clube de aposentados, onde o marido (o ótimo Patrick Chesnais) e as duas filhas nos trinta, casadas e com filhos, acham que ela se distrai.

O clube de aposentados “Beaux Jours” é um lugar que deprime Caroline mais do que ela pode suportar.

Mas lá vai ela, como um castigo, às aulas de teatro, cerâmica, yoga e enologia. Nessa última, ela está mais interessada em beber do que aprender o que já sabe. Ela é uma mulher sofisticada e deprimida.

Eis que, de repente, surge Julien (Laurent Lafitte), o professor de informática, um sedutor que atrai Caroline para sua rede. E ela não reclama.

Ele é bonito, alto, sexy mas vulgar e paquerador. Tem idade para ser seu filho.

Alguns, irão explicar esse caso de uma mulher mais velha com um homem mais jovem e com tempo de sobra (como diz sua filha), como uma busca pela juventude, pelos “belos dias”.

Outros, percebendo que Caroline está de luto, vão dizer que ela se engana com o amante, para não pensar na morte da amiga, que a tortura e enche de culpa e medo inconfessáveis.

A diretora Marion Vernoux não emite julgamentos morais. Só mostra o que acontece e nós deduzimos o que vai acontecer.

“Os Belos Dias” foi adaptado do romance “Une Jeune Fille aux Cheveux Blancs”, que pode ser traduzido como “Uma Garota de Cabelos Brancos”, escrito por Fanny Chesnel, que foi co-autora do roteiro com a diretora. Os diálogos são bem naturais e nos momentos em que Caroline passeia pela praia, ao por do sol, aproveitando seus belos dias, a luz é suave e romântica.

A verdade é que não é fácil envelhecer. Para ninguém. Muito menos para uma mulher bela, que quer ter um espelho amoroso que a faça esquecer da decadência inevitável.

Fanny Ardant, que sempre foi um ícone de mulher no cinema, conhece o que é passar por um luto. Sua personagem perde a amiga e ela perdeu o amor de sua vida, o diretor François Truffaut (1932-1984), aos 35 anos. Só ela sabe como conseguiu superar isso. Está envelhecendo muito bem, como se pode ver no filme, elegante e bela aos 64 anos.

“Os Belos Dias” é um filme agridoce. Divertido para quem está de fora e não se preocupa ainda com a contagem regressiva. E levemente amargo para os demais.

Mas, ajuda a estes últimos porque induz a uma reflexão que todos que gostam da vida deveriam fazer.

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Gravidade

“Gravidade”- “Gravity”, Estados Unidos/ Inglaterra 2013

Direção: Alfonso Cuarón

 

A doce curvatura da Terra azul preenche a tela. Silêncio.

Imagens deslumbrantes em 3D mostram pessoas que trabalham em trajes de astronautas no espaço, onde a vida é impossível, a 600 km do nosso planeta.

O grande passo que a humanidade deu, quando o primeiro astronauta pisou a Lua, segue seu curso. Homens e mulheres trabalham dentro e fora dos veículos espaciais que gravitam em órbita da Terra.

A Dra Ryan (Sandra Bullock), engenheira-médica, novata no espaço, conversa com Houston em terra firme, enquanto faz um reparo na nave. Chega perto dela outro astronauta, o veterano Matt Kowalski (George Clooney), que consegue pegar um parafuso que se soltara da mão dela.

“- Desculpe. Eu trabalho num laboratório onde as coisas caem no chão”, brinca ela.

Os dois ouvem Houston informando:

“- Uma estação russa foi atingida e criou uma nuvem que pode atrapalhar vocês.”

Mas eles trabalham tranquilos.

“- A vista daqui é inigualável”, diz Kowalski olhando para a Terra. E continua:

“- O que você gosta mais aqui?”

“- Do silêncio”, responde ela.

“- Tenho um mau pressentimento sobre essa missão. O mesmo que senti em 19997 num Carnaval…” e ele continua a contar um caso, quando ouve-se uma voz alarmada:

“- Explorer! Aqui é Houston. Missão abortada. Restos de um míssil atingiram outra nave e a nuvem de detritos é perigosa.”

Kowalski diz para a dra Stone:

“- Melhor voltarmos.”

De repente, toda aquela aparente tranquilidade se transforma em desespero e terror.

Assistimos a tudo apavorados, como se estivéssemos lá, com eles. De um momento para o outro, a nave é atingida e a Dra Stone é arremessada para longe e cai para cima, em direção a um vazio de um turbilhão de estrelas.

Com o coração apertado, escutamos sua respiração curta, em estado de pânico e a vemos girando e girando.

“Gravidade” é um filme que toca a todos os humanos, porque trata de nossos medos mais primitivos. Faz com que a plateia sinta o perigo mortal e lento da asfixia, o pavor de cair para sempre e o horror de sentir-se impotente para controlar uma situação que pode ser aniquiladora.

Nossa fragilidade está em primeiro plano, companheira de uma solidão total.

E o paradoxo, que tanto o roteiro como o modo de filmar  da câmera nos mostram, é que, apesar de percebermos que somos como a Dra Stone, um quase nada perante a força da destruição à volta dela, também somos aquela fagulha humana que consegue recuperar o controle e ter esperança.

O filme concretiza uma condição psíquica depressiva, claustrofóbica, na qual se é levado a crer que a morte, o largar-se, seria a única opção. Mas ir até o limite do insuportável, faz descobrir novas forças e coragem para enfrentar o que se imaginava, antes, que era uma situação sem saída.

Não à toa, a Dra Stone vivia na Terra um luto patológico. Precisou quase perder a vida para valorizá-la e acreditar de novo em razões para viver.

A fotografia de Emmanuel Lubezki cria imagens que guardamos como quadros em nossa mente, enquanto que o roteiro, co-escrito pelo diretor mexicano de 51 anos, Alfredo Cuarón (que dirigiu o aclamado “Harry Potter e o Prisioneiro de Askaban” 2004) e seu filho, o também diretor Jonás Cuarón, conta uma história simples e terrível, quase sem diálogos e alguns monólogos.

Sandra Bullock consegue mostrar um talento, até então escondido, que comove. Seja no corpo cansado, assumindo a posição fetal, flutuando, quando consegue se livrar do pesado traje de astronauta, seja em seu rosto expressivo, olhando a inesquecível lágrima que flutua em frente aos seus olhos. Momentos que são o umbigo emocional do filme.

“Gravidade” beira o sublime. Imperdível.

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