Entre Nós

“Entre Nós”, Brasil 2013

Direção: Paulo Morelli

Oferecimento Arezzo

Sempre haverá, dentro de nós, saudades de um tempo que já se foi. Mesmo quando ainda somos jovens.

“Entre Nós” conta a história de um grupo de amigos que, em 1992, quando quase todos tinham 20 anos, resolvem escrever cartas secretas que só seriam abertas dez anos depois e lidas entre eles.

A natureza verde das montanhas e colinas sob uma luz dourada, é o cenário onde eles se divertem e brincam, entre baseados e garrafas de bebida. Amores nascem em segredo enquanto outros são vividos. Muitos sonhos nas mentes e corações de quase adolescentes.

Já há pares formados. Lucia (Carolina Dickmann) namora Gus (Paulo Vilhena) e Drica (Martha Nowill) está com Cazé (Julio Andrade). E os três que ficam de fora, naquela hora em que os outros estão namorando, reclamam:

“- Mas nada impede que a gente faça a própria sacanagem”, diz insinuante, Silvana (Maria Ribeiro), dona do sítio onde estão.

Felipe (Caio Blat) e Rafael (Lee Taylor), os amigos literatos, se revezam beijando a moça quando, de repente, tomam um susto. Cai algo de uma árvore, aparado pela planta que cresce na enorme pedra onde os três estão sentados. Um passarinho é resgatado com delicadeza e voa.

Passado o momento breve em que se ocuparam com algo fora deles mesmos, a conversa volta a ser auto-referente e trata do livro que Rafa escreve num caderno de espiral com uma caneta Bic:

“- Você deixou o Felipe ler?” diz Silvana indignada. “Mas a gente tinha combinado de ler junto…”

Um drama vai acontecer e esse livro vai servir de pomo da discórdia entre eles todos, na reunião de 2002.

Dez anos mais velhos, muitos sonhos desmoronados, o sucesso de uns será objeto do ciúme de outros, que pouco conseguiram da vida.

Máscaras vão cair e a sensação de que algo importante foi perdido perpassa o grupo. Haverá mágoa e desilusões.

“Entre Nós”, um filme a quatro mãos, pai e filho, Paulo e Pedro Morelli, tem personagens muito bem desenvolvidos e interpretados com talento por um elenco escolhido a dedo.

É um filme raro e ousado no cinema nacional, já que se acredita que os brasileiros só querem rir em comédias recheadas de palavrão.

“Entre Nós” tem o que a vida das pessoas comuns também tem, momentos leves e outros pesados. Mas tem também suspense e segredos, traição e mentiras, em doses de vida real.

E, por isso, tem tudo para agradar a um público que tenha sensibilidade.

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O Congresso Futurista

“O Congresso Futurista”- “The Congress” Israel/Alemanha/Polonia/Luxemburgo/França/Bélgica, 2013

Direção: Ari Folman

Deixar-se levar pela imaginação é algo que não amedronta Ari Folman, 50 anos, o diretor israelense de “O Congresso Futurista”, que também é roteirista e produtor do filme e que já nos deu “Valsa com Bashir”2008, misto de documentário e animação sofisticada sobre os terríveis massacres de Sabra e Chatila, nos anos 80, no Libano.

Quem decidir ver o filme, deve tentar relaxar, deixar-se levar e mergulhar, principalmente na segunda parte da história, quando tudo é animação, sem se perguntar muita coisa, seguindo o fluxo das imagens e sem cobrar lógica ao enredo. E isso porque  estamos no registro dos sonhos, das alucinações, das fantasias e de nossos desejos loucos.

Robin Wright é ela mesma. Uma atriz de 44 anos que fez sucesso e depois, por causa de más escolhas, cai para um segundo time. Ela tem dois filhos, Sarah (Sami Gayle) e Aaron (Kodi Smit- McPhee). O menino tem uma doença rara que exige um tratamento caro.

O agente de Robin (Harvey Keitel, numa ponta bem aproveitada) leva-a a pensar sobre a dura realidade que ela vai ter que enfrentar. Precisando de dinheiro e fora do circuito de sucesso, ela vai ter que obedecer ao estúdio, que a chama para uma conversa sobre sua carreira.

Então, pressionada, Robin resolve aceitar a proposta do estúdio, que quer escanear sua imagem, reações e sentimentos, para usá-la em todo tipo de filmes, por um bom dinheiro. Faz parte do contrato, que dura 20 anos, que ela prometa não atuar mais, nem no cinema, televisão ou teatro.

E o produtor Jeff (Danny Huston) faz ela perceber que esse é o futuro do cinema. Daqui por diante, diz ele, quase todos os atores serão estocados como imagens, propriedade dos estúdios.

Ari Foldman não apenas faz um filme original mas também, através dele, critica os caminhos que conduzem os megaestúdios a querer que seus atores e atrizes ganhem dinheiro para eles, através de sucessos de bilheteria, que sempre são mais do mesmo, para um público preguiçoso e viciado.

Infelizmente, o talento vai ficando fora de moda no cinema.

Voltando ao enredo, passados 20 anos, Robin é convidada para “O Congresso Futurista”, evento do estúdio que quer homenageá-la, por causa do sucesso dos filmes do seu avatar.

E as cores enchem a tela. Ela própria se vê como animação no espelho do carro prata conversível, modelo antigo, 2013. As duas laterais da estrada são mares coloridos com peixes gigantescos.

Zepelins passam o trailer do último filme de Robin, ela muito jovem e interpretando uma heroina agressiva, tudo com muito sangue, aviões, guerra.

E claro que ninguém vai reconhecê-la. Ela agora é uma senhora de cabelos brancos num coque elegante.

Há ampolas de uma droga que é distribuida aos convidados e que faz a pessoa ser quem deseja ser. Portanto ninguém ali é real, só ela.

Vendo o filme com um outro olhar poderíamos pensar que tudo não passa de um sonho ou uma alucinação de Robin.

Afinal, Aaron, o filho que a levou a assinar o famigerado contrato, pode ter morrido depois dos 20 anos que se passaram. A mãe, melancólica, embarcaria então numa viagem louca, à procura daquele que não existe mais. Encarar a dura realidade a aterroriza. Enlouquece para fugir da dor.

Seja como for, quem gosta de originalidade, criatividade e belas imagens psicodélicas, não pode perder esse filme único, belo e muito, muito louco.

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