Interestelar

“Interestelar”- “Interstellar”, Estados Unidos, Inglaterra, 2014

Direção: Christopher Nolan

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O personagem principal de “Interestelar” lembra Ulisses, o herói grego, no espaço. Mas também lembra o drama dos primeiros homens saindo de suas terras natais, nômades, em busca de um lugar melhor para viver. Pensamos nos vikings em seus barcos, lutando por novas conquistas, nos navegantes portugueses querendo chegar às Índias. E, assim por diante. A história da humanidade foi escrita por pioneiros, homens que ousaram sair de casa e tentaram voltar com boas ou más novas.

Em “Interestelar” o mundo está fadado à extinção. A poeira tudo invade. Voltamos à condição de um povo que vive do que planta mas grandes tempestades de areia ameaçam os homens e o fogo toma conta das plantações.

Cooper (Mattew McConaughey, ótimo), um fazendeiro que já tinha sido piloto da NASA, pai de Tom de 15 anos e de Murph, uma menina inteligente e curiosa de 10 anos, é chamado pelo professor Brand (Michael Caine, sempre convincente), para comandar uma missão destinada a encontrar um lugar para ser o novo lar da humanidade.

Vai com ele, Amélia (Anne Hattaway), filha do cientista, que faz assim a vontade do pai.

Para Cooper, entretanto, é muito difícil deixar a família e ele promete à filha (Mackenzie Foy quando criança e Jessica Chastain como adulta, duas atrizes competentes) que vai voltar.

O visual de “Interestelar” tem algo de “O Mágico de Oz”1939, dá uma piscadela para os velhos seriados da TV em preto e branco como “Star Trek – Jornada nas Estrelas”, inspira-se em “2001 – Uma Odisseia no Espaço” 1968, de Stanley Kubrik e “Solaris”1972, de Andrei Tarkovski e tem coisas de “Gravidade”2013, de Alfonso Cuarón.

Mas “Interestelar” tem vida própria e será lembrado pelas magníficas cenas no espaço, filmadas em cenários, sem recorrer aos efeitos do “chroma-key”, por outras ainda, nos planetas desconhecidos onde ondas do tamanho de montanhas causam mais medo que mil tsunamis e colinas geladas são geleiras sem fim (filmadas na Islândia). Ousa mesmo entrar num buraco-negro, onde Cooper vive uma situação exposta pela Física contemporânea, comunicando-se através de uma dobra no tempo/espaço e contrariando o que vulgarmente pensamos sobre o universo em que vivemos e provando que o amor é a maior força conhecida.

É longo, reclamam alguns. É difícil de entender, murmuram outros.

Mas não será assim para quem sente palpitar em sua alma aquela fagulha que levou a humanidade a sobreviver e progredir. E será comovente para quem sente no coração uma ternura pelo pai que ama a filha da maneira como Cooper ama Murph.

Christopher Nolan, 44 anos, que dirigiu “Inception – A Origem”2010 e a trilogia Batman, escreveu o roteiro com seu irmão Jonathan e mais uma vez encanta a quem é fascinado pelo cinema.

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Uma Viagem Extraordinária

“Uma Viagem Extraordinária”- “The Young and Prodigious T.S. Spivet”, França, Austrália, Canadá, 2013

Direção: Jean-Pierre Jeunet

 

Aparentemente, este é um filme para crianças ou adolescentes. Ou para adultos com espírito juvenil, já que as aventuras mostradas são as de um garoto antiquado.

Nada disso. “Uma Viagem Extraordinária” é o oposto do que parece ser. E, para entender o filme dessa maneira, precisamos prestar atenção em quem é o narrador. O menino prodígio T.S. Spivet, 10 anos, vive um drama que se passa em cenários internos, em sua alma.

A família dele vive numa fazendinha no oeste dos Estados Unidos, mostrado por ele num mapa enorme.

Ilustrações infantis e outras inscrições que parecem complicadas vão aparecer ao longo do filme, como um charme a mais, muito bonitas no 3D.

Mas, a primeira coisa que ficamos sabendo, é que ele tem um irmão, Layton, gêmeo não idêntico.

Estranhamente, vemos uma cena onde T.S. faz uma apresentação de uma luta marcial, com a espada, num cenário vermelho.

“- Infelizmente, eu sabia que nunca seria um guerreiro…” comenta ele.

E vamos entender que o comentário tem a ver com o irmão, que é o preferido do pai, sempre com uma espingarda a tiracolo.

“- Ele atirava em tudo que se mexia…”

E tememos pela vida do gato na mira da espingarda, já sabendo quem é o guerreiro a que aludiu T.S.

O pai (Callum Keith Renie), alvo dos ciúmes de T.S., é descrito assim:

“- Meu pai nasceu com 100 anos de atraso. Tinha a alma de um cowboy.”

Seu escritório é uma sala de troféus, com bichos empalhados, que assustam o nosso herói.

A mãe (Helena Bonham Carter, atriz fabulosa), dra Clair, é uma excêntrica e suave especialista em insetos, completamente diferente do pai.

“- Como meus pais se apaixonaram é um mistério…”

E, de supetão, introduz o assunto principal:

“- Layton morreu no ano passado num acidente dentro do galpão. Ninguém nunca fala disso. Eu estava presente…”

E, a história da viagem que ele conta durante o filme, para ganhar um prêmio no Smithsonian Institute em Wahington, parece sair da imaginação de uma criança que quer chamar desesperadamente a atenção, da maneira mais complicada.

Não é à toa que, contando sobre ele e Layton serem gêmeos, ele diz:

“- Fui eu que fiquei com os neurônios.”

Já que o irmão ficara com toda a valentia e com o pai.

E o tal acidente, que faz crescer um clima depressivo na fazendinha, mostrada em cores de cinemascope, é  ponto central do problema de T.S. Spivet.

Sentindo-se culpado desde sempre pelos desejos proibidos de eliminar o irmão e ter pai e mãe só para ele, o menino encarna todas as crianças do mundo, vivendo a rivalidade fraterna.

E com que graça e beleza o diretor Jean-Pierre Jeunet, e co-autor do roteiro, inspirado no livro de Reif Larsen “O Mundo Explicado por T.S. Spivet”, conta essa história na tela. Ficamos encantados com o “Leonardo da Vinci de Montana”. O ator Kyle Catlett atua como gente grande.

E nós, na plateia, certamente vamos relembrar algumas das lutas fratricidas que vivemos. Mas, sem drama, apenas com um sorriso nostálgico. E esperando que elas desapareçam com a idade.

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