O Ano Mais Violento

“O Ano Mais Violento”- “The Most Violent Year”, Estados Unidos, 2014

Direção: J.C. Chandor

Oferecimento Arezzo

Enquanto ele corre (Oscar Isaacs, excelente), exercitando seu corpo de uns quase 40 anos, sua atraente mulher ruiva (Jessica Chastain, bela e boa atriz) se pinta, fumando, na frente do espelho.

Abel e Anna tem duas filhas e acabam de mudar-se para a casa de concreto, vidro e uma porta azul.

Ele vem de família de imigrantes latinos. Foi caminhoneiro quando jovem e apaixonou-se pela filha do patrão.  Esse homem  inteligente e determinado, dirige agora sua própria empresa de distribuição de óleo combustível para calefação, que comprou do sogro. Todos necessitam aquecer suas casas no inverno de New Jersey e Nova York. E Abel Morales sabe vender e ensinar seus novatos a valorizar seu produto.

Mas ele enfrenta um problema grave. Sua carga de óleo está sendo roubada dos caminhões da Standard Heating Oil e os motoristas agredidos covardemente. Apesar de ter informado à polícia, não parece fácil resolver esse problema.

Anna, sua mulher, visita um dos motoristas, Julian, que foi parar no hospital:

“- Quebraram o maxilar dele…, comenta ela.”

E mais baixo para só Abel ouvir:

“- Quer que eu fale com o meu irmão?”

“- Nem com ele, nem com seu pai.”

“- Estamos numa guerra”, responde Anna.

“- Eu não estou”, retruca o marido.

Abel estava prestes a fechar um grande negócio, o sonho de sua vida. Naquele dia, dera o sinal para a compra de um terminal junto ao rio, que iria fazer seu negócio dar um salto. Acesso ao rio, o óleo diretamente despejado em seus tanques, podendo ser estocado:

“- Posso comprar na baixa e vender na alta do preço, com bom lucro.”

Mas há perigo. Não será fácil para Abel ater-se ao seu código de conduta, que não permite aos seus caminhoneiros o uso de armas:

“- Não sou um gangster”.

E o ambicioso promotor negro (David Oyelowo) não acredita que o negócio de Morales esteja correto ou vê nele um bom alvo que o ajude a subir politicamente e o ameaça com acusações de fraude e não pagamento de impostos.

Anna sempre cuidara de toda a contabilidade da companhia, desde os tempos do pai dela. Entendia do negócio que aprendera com ele. Parece haver amor entre o casal mas eles são diferentes. Abel é mais idealista e Anna tem seus pés no chão.

Na hora certa, haverá uma decisão difícil a ser tomada por Abel, que pode arruinar seu casamento e sua vida.

Nova York sob uma luz dourada, vista da terminal do rio em New Jersey, pode ser a realização de um sonho ou o começo de um pesadelo para aqueles dois.

O diretor J.C. Chandor, 40 anos, em seu terceiro filme (“Margin Call”e “All is Lost”), mostra a que veio, fazendo de “O Ano Mais Violento” um filme elegante, com belas imagens e ótimos atores, que deixa algumas perguntas no ar sobre ética e capitalismo.

Ler Mais

Vício Inerente

“Vício Inerente”- “Inherent Vice”, Estados Unidos, 2015

Direção: Paul Thomas Anderson

Sei que muita gente vai sair do cinema e dizer que não gostou, que não entendeu nada. Bem, eu precisei ver duas vezes para entender o que tem que ser entendido.

Basta ter paciência e pesquisar um pouco.

Paul Thomas Anderson, ou PTA para os cinéfilos, tem 44 anos e é considerado um dos diretores mais criativos da cena atual.  Bastaria citar “Magnólia”1999, “Sangue Negro”2007 e “O Mestre”2012, para quem gosta de cinema saber de quem se trata.

Só que “Vício Inerente” tem algo diferente. PTA adaptou para o cinema um livro de um autor “cult” americano, que ninguém achava possível colocar em imagens.

Thomas Pynchon, 77 anos, premiadíssimo, não dá entrevistas, não tem foto atual e faz mistério sobre onde ele mora. Mas sabe-se que ele viveu nos anos 60 e início dos 70, do século passado, numa praia da California, onde adotou um estilo de vida “hippie”. Seu livro “Vício Inerente” tem, portanto, a qualidade do vivido. E, como todos os livros do autor, é escrito com uma estrutura complexa, com ligações e referências a muitos assuntos diferentes e personagens que parecem saídos de uma viagem lisérgica.

PTA, admirador de Pynchon, resolveu filmar o livro, reservando-se o direito de colocar no roteiro aquilo que achou mais relevante.

A ação se passa na California, Gordita Beach, início dos anos 70, quando o modo “hippie” de ser estava saindo da moda, a guerra do Vietnam matava garotos e o grupo de Charlie Mason assustava o sonho americano.

O personagem principal é um detetive particular, Doc Sportello (Joaquim Phoenix, doce e extraordinário), que fuma baseados o tempo todo, “para clarear a mente”, explica.

Visitado por sua ex-namorada e sempre amada Shasta Fay (Katherine Waterston, bela e sexy), fica sabendo que ela namora um grande empresário do ramo imobiliário, Mickey Wolfmann (Eric Roberts). Ela pede ajuda a Doc porque acha que a mulher de Wolfmann montou um esquema com seu amante, para internar o marido e roubar todo o dinheiro dele.

A história principal é logo embaralhada com várias outras, às vezes perdidas no meio do caminho, com personagens surreais. Assim, desfilam na tela o policial “Big Foot” (Josh Brolin) que adora bananas cobertas de chocolate, fazendo o durão mas que é frágil e inseguro como uma criança na casa dele, os participantes da Fraternidade Ariana que tem negócios com os Panteras Negras, a prostituta oriental Jade que comanda uma casa de massagens e pede que Doc tome cuidado com o Canino de Ouro, algo que não se sabe o que é, o advogado de Doc (Benicio Del Toro) que parece ser o único a entender o que acontece, um casal que se droga muito (Jena Malone e Owen Wilson), a namorada de Doc que trabalha na promotoria (Reese Whiterspoon), o priápico dr Rudy que chefia um sindicato de dentistas que atende viciados em heroína, com dentes corroídos. Só para citar alguns dos personagens.

A sensação de confusão invade nossa mente e ficamos meio em transe, procurando entender aquilo que sempre nos escapa. Perdemos ou esquecemos de algo importante? Essa é uma possível identificação do espectador com um drogado como Doc, cuja mente não foca  em nada por muito tempo. Se nos deixarmos ir, acontece uma imersão num universo alucinante, paranoico e delirante. É tudo verdade ou eu sonhei?

A única coisa que permanece é o amor por Shasta que nunca abandona Doc. O “vício inerente”, que é um termo que se usa em seguros marítimos para indicar o que não se pode evitar. A voz suave e envolvente da narradora, a cantora e harpista Joanna Newson, chama a atenção para essa ligação forte e cármica.

Coragem. Enfrente esse filme difícil e empolgante e troque um olhar verde e cúmplice com Joaquim Phoenix na cena final.

Ler Mais