La Sapienza

“La Sapienza”- Idem, Itália, França, 2014

Direção: Eugène Green

Oferecimento Arezzo

Ao som de um coral que canta música barroca de Monteverdi (1567-1643), vemos detalhes de uma arquitetura refinada, que sabemos ser italiana da mesma época.

Janelas, portas, colunas emplumadas, são percorridas pela câmera que se aproxima dos entalhes no mármore, mostrando sulcos e restaurações. Abóbadas de igrejas douradas, azuis, enormes anjos de asas fechadas que são colunas e o olhar sobe mais, atingindo o cimo da torre dos sinos, onde uma cruz pousa leve.

Em “off” ouvimos: “A sabedoria é mais ativa que todas as ações.”

Em Paris, o arquiteto premiado Alexandre Schmidt, agradece o reconhecimento de sua obra por seus pares:

“- Herdei de meu pai o ofício, de minha mãe a preocupação com os outros. Não faço igrejas nem sinagogas, mas fábricas, que são as catedrais do mundo moderno. Acho que a arquitetura existe para assegurar a felicidade dos homens.”

Depois, o casal, Alexandre (Fabricio Rongione) e Aliénor  (Cristelle Prot Landman), a sós, em silêncio, jantam num restaurante vermelho e dourado. Ela é bela mas seus olhos claros e expressivos mostram tristeza. Ele parece frio e rígido. O casal vai mal.

Frente a um conselho, ele fica sabendo que seu projeto premiado terá que ser modificado:

“- Sou contra a destruição de Tourreles para ocupar o espaço com construções desumanas…” diz o arquiteto.

Mas o conselho é inflexível e dá dois meses para ele apresentar novo projeto.

Desanimado, o arquiteto decide então partir para a Itália para finalmente acabar de escrever seu livro sobre Francesco Borromini (1599-1667), um dos maiores gênios da arquitetura barroca.

E o casal parte para Stresa, ao lado de Bissone, uma vilazinha suiça onde nasceu Borromini.

Hospedam-se frente ao lago Maggiore e passeiam pelo lugar, onde encontram, por acaso, os irmãos Lavinia e Goffredo.

A partir desse momento, o quinto filme de Eugène Green, o original diretor e roteirista nascido na América mas naturalizado francês, separa marido e mulher e compõe dois novos pares com os irmãos italianos.

Vai ser uma experiência iniciática para os quatro.

Goffredo (Ludvico Succio), que tem 18 anos e quer ser arquiteto, vai para Veneza depois das férias. A convite dos franceses parte com o homem mais velho para Torino e Roma, nas pegadas de Borromini. Visitam suas obras. Sendo que a igreja de San’t Ivo alla Sapienza é o poster do filme.

Aliénor, que é cientista social interessada pela psicanálise, fica em Stresa e aproxima-se de Lavinia (Arianna Nastro) que sofre de estranhos desmaios. Conversam em francês e “Madame Bovary” de Flaubert e Molière com sua última peça, “O Doente Imaginário”, serão seus guias numa viagem interior. Para as duas, o passado vai ser o lugar onde se esconde a chave para o futuro, libertas que são de seus fantasmas sombrios.

Já Goffredo e o arquiteto aprenderão um com o outro e vão encontrar aquilo que não procuram.

“La Sapienza” é um filme raro e belo, recomendado para quem se interessa por cultura e não se assusta com um modo peculiar de contar histórias.

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Ricki and The Flash – De Volta para Casa

“Ricki and The Flash – De Volta para Casa”- “Ricki and The Flash”, Estados Unidos, 2015

Direção: Jonathan Demme

Um rosto enche a tela.

É Meryl Streep, a multifacetada atriz, fazendo Ricki, a roqueira de trancinhas do lado, cabelo comprido e unhas prateadas, sob uma luz azul neon. Ela, na guitarra e vocalista, comanda a banda The Flash.Todos os integrantes passados dos 60.

Eles tocam e ela canta “American Girl” e é aplaudida pelo pessoal num bar da Califórnia.

“- Eu adoro você, Ricki!” grita o barman.

“- Essa foi a “American Girl” de 77 e me orgulho de ser uma, nascida no melhor país do mundo! Somos a banda que está nessa casa desde 2008, o ano em que elegemos vocês sabem quem…” e faz uma careta.

Pronto. Apaga-se Meryl e passamos a ver Ricki Rendazzo, de carne e osso, forte, encrenqueira, mulher de opinião própria e irreverente.

Só que, para ser como ela é, teve que abdicar de muita coisa. Para ser livre e ter o palco no centro de sua vida, deixou muita gente de lado.

Linda Brummel abandonou marido e três filhos para levar a vida que escolheu.

E Greg (Ricky Springfield), seu braço direito na banda, não tem o reconhecimento do lugar afetivo que ocupa na vida dela. E se ressente com isso.

Quando o celular toca e ela ouve a voz do ex (Kevin Kline) pedindo que venha ver Julie (Mamie Gummer, a própria filha da atriz) que está péssima porque foi abandonada pelo marido, ela sabe que não vai poder ignorar o chamado, do outro lado do país.

Mas a volta para o mundo que ela deixou não é uma coisa simples.

É aqui que o roteiro de Diablo Cody (Oscar por “Juno”2007) mostra a que veio, discutindo o porquê de uma mulher ser censurada por deixar os filhos para seguir uma carreira e o mesmo não ser cobrado dos homens. Mas são apenas tintas feministas, rodeadas de tiradas clichês, sobre a vida burguesa versus o desprendimento e o charme  da vida boêmia, num filme para divertir e a plateia admirar a versatilidade de Meryl Streep.

Bem, uma boa dose de egoísmo é necessária para a sobrevivência, disse Freud, mas, no caso de Ricki, a auto-complacência se alia a um egoísmo gigante. E ela vai se deparar com acontecimentos que vão mexer com ela.

O filme, dirigido pelo também oscarizado Jonathan Demme, 71 anos (“Silêncio dos Inocentes”1991), é aquilo que é: uma oportunidade de ver uma excelente atriz metamorfosear-se no que ela também pode ser e já mostrou em “Mamma Mia!”, em 2008. É uma ótima cantora.

 

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