Loucas de Alegria

“Loucas de Alegria”- “La Pazza Gioia”, Itália, França, 2016

Direção: Paolo Virzi

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Um mar de um azul espantoso é o pano de fundo da primeira cena que vemos. Uma mulher jovem com um carrinho de bebê, da ponte, olha o mar lá embaixo. Um arrepio de medo se insinua.

Mas já estamos em uma vila toscana transformada em hospital psiquiátrico judiciário. A movimentação e a gritaria só cessam na hora em que as pessoas são sedadas para dormir. Aliás, nem isso, porque algumas zanzam pela casa.

E salienta-se uma loura espalhafatosa que fala alto e dá ordens a torto e a direito. É Beatrice ( Valeria Bruni-Tedeschi, ótima) uma aristocrata que surtou e arruinou a família. Considerada perigosa, não pode sair da vila.

Quando chega uma jovem tatuada, suja, descabelada, andando de muletas, com a perna machucada, chama logo a atenção de Beatrice que se aproxima dela.

As duas são o centro de “Loucas de Alegria”. O que as une é a vontade de fugir.

A depressiva Donatella (Micaella Ramazoti, excelente), é empurrada para a vida por Beatrice, que não tem medo de nada, sempre enfática e a mil por hora.

E as aventuras das duas vão fazer a plateia rir e depois chorar. Tão diferentes, no fundo são parecidas. Ambas dividem uma infância triste e vidas interrompidas por atos de violência que acabaram estigmatizando-as como indesejáveis à sociedade.

E entramos com elas num turbilhão, comandado por Beatrice, a quem não faltam ideias grandiosas, sempre envolvendo uma vida de luxo e riqueza que ela perdeu.

Já a mais moça tem na cabeça um filho, que ela não sabe onde procurar. E lembramos do mar azul do início. Mãe e filho corriam perigo mesmo.

Paolo Virzi, diretor de “O Capital Humano” de 2013 com Valeria Bruni-Tedeschi e de “A Primeira Coisa Bela” de 2010 com Micaella Ramazoti, une as duas ótimas atrizes em “Loucas de Alegria” e conquista nossa aflição pelas duas, perdidas na noite e dia que passam fugidas da Villa Biondi.

Vamos entendê-las melhor e perceber que é a angústia o que as move.

A agitação maníaca de Beatrice a impede de pensar sobre o porquê da sua internação. Seu surto foi a sua ruina, impedindo-a de viver a realidade. Uma paixão bandida foi um mergulho na insanidade.

Já Donatella, movida pelo amor e ódio, tomou decisões trágicas que vão condená-la à solidão e auto-destruição.

Mas a fuga é um elo de união entre elas. E as meninas tristes que não tiveram apoio ou não souberam se aproveitar dele, afastadas do mundo, descobrem uma amizade que poderá ser um benefício terapêutico e uma esperança de dias melhores.

E uma lágrima rola ao som de “Senza Fine”, cantada por Gino Paoli, ao fim de “Loucas de Alegria”, uma bela comédia dramática que nos envolve e comove.

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A Comunidade

“A Comunidade”- “Kollektivet”, Dinamarca, Suécia, Holanda, 2015

Direção: Thomas Vinterberg

Um professor de arquitetura (Ulrich Thomsen), Erik, herda do pai um casarão perto do mar, em Copenhague. Ele pensa em vender o imóvel, dado o alto custo de manutenção. Mas sua filha adolescente Freja (Martha Sofie Wallstrom Hansen) adorou a casa e sua mulher, a apresentadora de televisão, Anna (Trine Dyrholm, fantástica), convence o marido a convidar pessoas interessantes para viver com eles em comunidade e assim dividir as despesas.

Ela não esconde uma certa monotonia na vida do casal e pensa que o convívio com novas ideias iria oxigenar o ambiente familiar.

Dito e feito. E os convidados começam a chegar. Cada um tem um motivo para querer mudar para a casa aprazível.

Estamos nos anos 70 e há uma atmosfera “hippie” no ar, “faça o amor não a guerra” e um gosto por roupas diferentes das tradicionais. Todo mundo quer ser jovem e feliz.

No começo, a convivência na comunidade é alegre e festiva. Canta-se muito, há banhos em pelo no mar gelado, muita bebida, comida e cigarros.

O primeiro sinal de que algo não vai bem ou que a vida é cheia de surpresas mesmo, atinge o habitante mais jovem da casa, um menino de 6 anos, que tem um problema cardíaco e desfalece em plena noite de Natal.

Todos sabiam dessa doença da criança mas, o próprio pai brincava dizendo que ele contava essa coisa de que não ia viver muito para atrair e interessar as meninas.

Havia algo de errado naquelas pessoas da comunidade. Uma alegria forçada que não combinava com a realidade.

O roteiro escrito pelo diretor e por Tobias Lindholm (os mesmos de “A Caça”, indicado ao Oscar de melhor filme estrangeiro), inspira-se nas experiências do próprio Thomas Vinterberg, que cresceu numa comunidade “hippie”.

Talvez, por isso, a personagem da menina adolescente pode ser um alter-ego do diretor e personifique mesmo a peça fundamental de toda a história, já que ela descobre o amor justamente quando vê o casamento de seus pais desmoronar. Ela observa os adultos e começa a vida amorosa com medo de sofrer.

Os atores principais, excelentes, protagonizaram o filme mais famoso de Thomas Vinterberg, do movimento Dogma, “Festa em Família” de 1998 e são o principal foco do filme.

Anna, que era a que mais queria viver a ideia de comunidade, é a que é mais prejudicada, já que o marido não embarca como ela nessa aventura. De repente, sua vida foge do seu controle e ela tem que enfrentar o fato do passar dos anos.

“A Comunidade” passa uma reflexão de que a vida não é o que se sonha e que quanto maior for a idealização, maior o sofrimento e a decepção.

Um filme menor de Thomas Vinterberg mas digno de nossa atenção.

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