Aliados

“Aliados”- “Allied”, Estados Unidos, 2016

Direção: Robert Zemeckis

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Um filme de amor? Um filme de guerra? Nem um, nem outro mas tem tudo isso no mais novo trabalho de Robert Zemeckis, que assina muitos filmes. Ganhou o Oscar com “Forrest Gump, o Contador de Histórias”.

A dupla romântica é o suprassumo da elegância. São da elite do cinema: Marion Cotillard, Oscar por “Piaf” e Brad Pitt, sem Oscar mas com muitos outros prêmios. Ela interpreta Marianne Beauséjour, francesa e ele Max Vatan, canadense, que se encontram durante a Segunda Guerra, em 1942, no Marrocos, na época Protetorado Francês.

E aqui, entra outro elemento interessante: espionagem e suspense. Os dois vão se empenhar em eliminar um general alemão, numa festa luxuosa na embaixada alemã em Casablanca, que vira um campo de guerra, com a vitória para a dupla que foge para a Inglaterra.

Lá eles se casam, tem uma filhinha e vivem uma felicidade de apaixonados numa casa em Londres.

Tudo parecia perfeito e só faltava a guerra acabar, quando o serviço de contraespionagem inglês acusa Marianne de ser uma espiã alemã. Será possível? O tenente-coronel Vatan faz tudo que pode para provar o contrário.

O roteiro de Steven Knight é baseado numa história real que ele ouviu contar há mais de 30 anos. O suspense é bem armado e a dupla, principalmente Marion Cotillard, comove e envolve a plateia.

Há cenas espetaculares como a de abertura do filme, em que Brad Pitt desce de paraquedas no deserto, entre as dunas amarelas ao sol brilhante e é recolhido por um carro. Lá dentro, abre uma valise e verifica documentos falsos, armas e dinheiro. O motorista passa uma caixinha de veludo para ele, onde brilha uma aliança. E diz:

“- Sua esposa o espera. Cherchez le colibri (procure o beija-flor).”

E, num clube noturno todo de mármore, cristais e elementos art-deco, lá está ela, deslumbrante, com o beija-flor bordado num xale de seda.

Aliás, os figurinos são um dos pontos altos do filme. Joanna Johnston foi indicada ao Oscar de melhor figurino, não ganhou mas fascinou quem gosta de moda com os vestidos de Cotillard. O sedutor peignoir de seda bordado com flores, o de paetês negro com decote nas costas, o verde água de cetim longo, com uma “basque” na frente e o bordado de uma pluma no ombro, distraem a atenção, de tão maravilhosos que são.

Marion Cotillard resplandece na tela, grávida de dois meses, segundo filho dela e do seu companheiro Guillaume Canet, ator e diretor francês.

Só isso já desqualifica o boato, que atrapalhou o filme, de Brad Pitt estar tendo um caso com ela. Diziam que havia detetives no estúdio onde eram rodadas as cenas. Aliás, isso deve ter contribuído para seu desempenho rígido e forçado, sem verdadeira entrega, destoando do estilo de Cotillard, que palpita tão verdadeira na pele da sua personagem.

O fato é que ela parece feliz e realizada e ele tenso e distante. A vida real apareceu nesse filme sem ser convidada. O casal Brangelina não existe mais. Acontece todo dia mas na realeza hollywoodiana isso faz manchete no mundo todo.

De qualquer modo, “Aliados” é um filme com uma pegada antiga que cai bem.

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A Garota Desconhecida

“A Garota Desconhecida”- “La Fille Inconnue”, Bélgica, França 2017

Direção: Jean-Pierre e Luc Dardenne

Já pensaram como a profissão de médico é parecida com a de um detetive? Para se fazer um bom diagnóstico é preciso levantar hipóteses, recolher dados, perguntar e ouvir mais do que falar. Usar a intuição mas ser rigoroso em não deixar nada de lado. Ter paciência.

A dra Jenny Davin (Adèle Hanel, excelente) é jovem, bonita mas sem grandes vaidades, séria mas dona de uma delicadeza amorosa que faz com que seus pacientes confiem nela. Não tem vida social, namorado, amigos. Não sabemos nada sobre sua família. Só a conhecemos no consultório, onde substitui um médico que vai se aposentar.

Julien, seu estagiário, conduz um exame clínico com a dra Davin. Ela faz perguntas sobre os achados e ele responde. Parece que ela o aprova.

Mas, de repente, ouvem-se gritos na sala de espera. Uma criança caída ao solo com uma convulsão. Ela acode rapidamente e pede um travesseiro a Julien que, estranhamente, está parado, sem iniciativa. Parece que não ouve o pedido da doutora.

Ela acomoda a cabeça da criança sobre um casaco e espera que ela desperte.

Por que Julien teve essa reação estranha? É o que a dra Jenny pergunta a ele:

“- Não consegui me controlar.”

“- Se você quer ser médico tem que aprender a controlar suas emoções.”

A campainha da porta soa. Julien prepara-se para descer a escada e abrir mas a doutora diz que não:

“- Mas e se for uma emergência?”retruca Julien.

“ – Se fosse, tocaria duas vezes. Já passou uma hora do horário do término dos atendimentos.”

Julien sai aborrecido, sem falar com ela.

No dia seguinte, a médica vai se desculpar com o estagiário. Porque ele estava certo. Ela também queria abrir a porta mas preferiu se impor. Sente-se culpada, porque quem tocou a campainha foi uma garota negra que foi encontrada morta na construção do outro lado da rua. Fratura de crânio.

A câmara de segurança mostra seu rosto assustado, tocando a campainha do consultório.

O que aconteceu? Foi acidente? Assassinato?

A culpa que a dra Davin sente vai levá-la a desempenhar a função de um detetive. Ela vai fazer tudo que puder para investigar quem foi essa mocinha. Sem celular, sem documentos, ninguém veio reconhecer o corpo e ela é enterrada como indigente.

Ninguém culpa a doutora pelo acontecido. E a polícia não vê com bons olhos suas investigações. Mas a médica vai tratar do caso como faz com seus pacientes.

Dedicada, sente-se culpada porque sabe que se tivesse deixado Julien abrir a porta, a moça não estaria morta. Mas ela vai por a culpa a serviço da vítima e se empenha em descobrir quem ela é. E um paciente da dra Jenny é o fio da meada que a leva à solução do caso.

A dra Jenny Davin é uma pessoa rara. Generosa com seus pacientes e doce, maternal com eles. Por que não seria assim com a garota morta?

E a pergunta que fazemos é a seguinte: ainda existe alguém assim num mundo egoísta como o nosso?

E os diretores, os premiados irmãos Dardenne respondem:

“Nosso cinema reflete um pensamento, uma sensibilidade. Pode parecer piegas mas fazemos cinema para abraçar o mundo.”

Ainda bem. “A Garota Desconhecida” trata justamente dessa sensibilidade tão necessária em tempos de individualismo exacerbado.

 

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