Dovlátov

“Dovlátov”- Idem, Rússia, Polônia, Sérvia, 2018

Direção: Aleksei Guerman Jr

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Estamos na antiga União Soviética, atual Rússia, em 1º de novembro de 1971, em Leningrado, atual São Petersburgo. Vamos ficar seis dias por lá e vai ser necessário ter paciência com o ritmo do filme porque isto é essencial para que o diretor possa passar para a plateia o clima psicológico que as pessoas vivem nesse momento.

Um homem jovem aparece na tela. E escutamos em “off ”:

“- Fui expulso da escola… fui carcereiro… a relativa liberdade dos anos 60 acabou. Nem eu nem meus amigos podemos publicar nada do que escrevemos. Os anos 70 começam com uma geada…”

Trata-se do poeta e escritor russo de ascendência armênia e judeu, Serguei Dovlátov (1941-1990), que caminha com seu cachorro no colo numa neblina que será onipresente durante todo o filme. Ele é interpretado por um ator sérvio, excelente, Milan Moric, que foi dublado já que não fala russo.

O escritor Dovlátov não pertence à União dos Escritores, já que seus escritos não são aprovados por seus chefes. E então não pode ser publicado.

Ele e seus amigos sobrevivem como podem, pedindo dinheiro emprestado, escrevendo artigos sobre animais e entrevistas com operários. São dissidentes do regime e estão vivendo ou morrendo à mingua. Outros emigraram para o Báltico.

O clima do filme é melancólico, faz muito frio mas há um certo humor nas conversas regadas a muita bebida, ao som de jazz cantado tristemente.

Outro aniversário da revolução está sendo celebrado. Há feriados. Mas não há liberdade no país sob o comando de Brejnev.

Dovlátov está se separando da mulher, Lena (Helena Sujecka). A filha pequena, Katya, quer uma boneca do seu tamanho e a pede ao pai. Ele pergunta a todos que encontra onde pode achar a tal boneca, mesmo sabendo que não pode comprá-la. Há desejos insatisfeitos em toda a parte. Mas não há revolta.

Dovlátov exilou-se nos Estados Unidos nos anos 80 e lá conseguiu ser publicado em russo, ficou famoso e hoje em dia é um dos autores mais lidos na Rússia, onde só foi publicado depois de sua morte, aos 48 anos.

O filme de Aleksei Guerman Jr, exibido no Festival de Berlim desse ano, ganhou o Urso de Prata, prêmio para a melhor contribuição artística.

No circuito comercial europeu, “Dovlátov” obteve algum sucesso e foi visto como uma obra de contestação ao governo Putin, que também usa de censura para calar os que se colocam contra o governo.

Agora, como antes, há um regime autoritário no país, que viveu sob os czares e o comunismo. Alguns são muito ricos, outros muito pobres e a corrupção é constante como a neblina que envolvia Dovlátov em Leningrado.

O filme tem imagens de um sonho melancólico onde nada de bom pode acontecer. Dirige-se a um público especial.

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Minha Amada Imortal

“Minha Amada Imortal”- “Immortal Beloved”, Reino Unido, Estados Unidos, 1994

Direção: Bernard Rose

Quem foi a “amada imortal” de Ludwig van Beethoven (1770-1827)? A carta endereçada a ela foi encontrada entre os pertences do compositor depois de sua morte, aos 56 anos, devido à falência do fígado. Dizem que ele tinha hepatite crônica e bebia muito.

Apesar da fama de feio, Beethoven teve muitos casos amorosos, dado o carisma de sua personalidade e a fama que tinha. No filme, interpretado com talento por Gary Oldman, podemos ter uma ideia sobre seu temperamento violento mas também romântico.

Seus biógrafos escrevem que ele começou a sentir mais fortemente o comprometimento da audição aos 25 anos e que aos 46 estava completamente surdo. Mas continuava compondo. Parece que a surdez deveu-se a uma doença na infância e aos maus tratos do pai, que batia nele na cabeça, exigindo que estudasse quatro horas ao piano por dia. Ele queria exibir o filho como menino prodígio, tal Mozart, mas não teve êxito. Chegou até a mentir a idade do menino e o próprio Beethoven pensava que era dois anos mais moço do que realmente era.

Muito jovem, tornou-se arrimo de família, dado o alcoolismo do pai. Mas sempre estudou piano e aos 12 já compunha.

O filme mostra o empenho de seu secretário e amigo, Anton Schindler, na procura de quem seria a mulher para quem Beethoven escrevera a carta. Jeroen Krabbé faz Schindler, devotado a essa causa, último desejo de Beethoven.

Ele vai atrás de Giulietta Guicciardi (Valeria Golino), que era sua aluna e para quem o compositor dedicou a “Sonata ao Luar”, da húngara Anna Marie Herdody (Isabella Rossellini) e de Johanna ter Steege (Johanna Reiss), que se casou com o irmão de Beethoven. Até hoje há desacordo entre os biógrafos sobre a identidade dessa mulher. O mistério permanece.

O diretor Bernard Rose escreveu o roteiro em ordem cronológica e há “flashbacks” sobre a vida do compositor.

A cena mais bela acontece depois que o menino leva uma surra do pai, foge de casa e vai até o lago, iluminado pelas estrelas. Ele boia entre as luzes do céu enquanto ouvimos os acordes da “Nona Sinfonia” que quase todos consideram sua obra prima.

Belo filme sobre um gênio, dono de uma música divina.

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