Um Segredo em Paris

“Um Segredo em Paris”- “Drôle d’Oiseaux”, França, 2018

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É inverno em Paris e as árvores mostram seus galhos sem folhas. Uma moça bonita de uns 25 anos, vestida toda de negro, o que realça sua pele muito branca e cabelos ruivos, atravessa a ponte sobre o Sena. Ouvimos o grito das gaivotas.

Entra num café, tira uma caneta da bolsa e escreve num caderno. Em “off” ouvimos suas impressões sobre Paris: “… é grande mas menor do que eu pensava… dá para fazer toda ela a pé se alguém quiser…gosto muito das fachadas dos grandes edifícios…” Ela quer ser escritora.

De noite a vemos lendo, deitada no sofá do apartamento da amiga que a hospeda ( Virginie Ledoyen ), com seu gato Jacques. Mas o barulho enlouquecedor da transa no quarto de Felícia, a incomoda e ela sai para andar pelas ruas.

Olha uma estátua, a rua, o Sena que brilha, mas seus olhos parecem não ver. Perdida em seus pensamentos, leva um susto quando uma gaivota cai morta a seus pés. O que aconteceu? Mistério.

Dia seguinte, descobre um anúncio no café, no qual oferecem um emprego numa livraria. Lá, ela espera mas como ninguém aparece, sai. Logo volta porque a amiga continua na cama, com seu amor louco.

E quando a vemos de novo já está empregada, por um senhor de cabelos brancos, passado dos 70, mas elegante e ainda uma bela figura. Ela ocupa o pequeno sótão acima da livraria e recebe envelopes com bastante dinheiro das mãos do patrão. De onde vem aquele monte de notas? Ninguém compra livros ali…Outro mistério.

Esses dois personagens, nada comuns, vão se aproximar através de longos silêncios partilhados em passeios no carro dele, descobrindo vistas sobre a cidade. Ela precisa se ocupar e arruma as prateleiras da livraria e a mesa dele, sendo observada com cuidado. Apesar de ostentar um mau humor crônico, Georges tem um bom coração, que ele esconde bem.

A diretora Elise Girard é também a co-roteirista desse seu segundo filme, que tem um charme especial. Além de ter como estrela a filha de Isabelle Huppert, Lolita Chammah, que faz Mavie (em francês, o nome soa como “minha vida”), a moça do interior que vem para Paris “para respirar”, tem também o pai dela, Ronald Chammah, numa ponta brevíssima.

Mas o grande trunfo é Jean Sorel, 84 anos, como o livreiro Georges, depois de dez anos longe do cinema. Ele, o galã francês de primeira linha, de “Vagas Estrelas da Ursa” de Luchino Visconti e o marido de Catherine Deneuve em “A Bela da Tarde” de Luis Bunuel, faz a grande diferença no filme. Seu personagem misterioso e que ironiza a vida e o amor, vai retirar-se de cena para que Mavie possa ter o romance que ele já não pode dar a ela. O dele é um amor platônico e paternal que comove e que vai fazer Mavie chorar dentro do cinema e atrair um lenço de um rapaz (Pascal Cervo), também misterioso, à sua maneira.

Tão simples e tão sofisticado.

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Legítimo Rei

“Legítimo Rei “, “Outlaw King”, Reino Unido, Estados Unidos, 2018

Direção: David Mackenzie

A bela Escócia das “Highlands”, as montanhas verdes no verão, com riachos e arco-íris depois da chuva, é o cenário desse filme que conta a história de Primeira Guerra pela Independência, no século XIV.

Tudo começa com uma derrota.

Robert de Bruce (Chris Pine) e os lordes da Escócia se rendem ao Rei Eduardo I da Inglaterra (Stephen Dillane), a contragosto. Era a única saída. O exército inglês era poderoso, com muitos soldados bem armados enquanto que o escocês era quase inexistente.

Robert de Bruce volta às suas terras. Ele, viúvo, casa-se com Elizabeth de Bursh (Florence Pugh, ótima atriz) que se mostra à altura do que era esperado dela, muito mais jovem do que o marido. Alinhou-se ao lado de Robert e ajudou a criar sua filha (Rebbeca Rubin). Será a Rainha da Escócia depois de muitas provações.

São momentos românticos e leves num castelo austero e sem luxos mas mostrando um par em sintonia amorosa.

Um breve hiato, pois quando o mártir da Independência,  William Wallace, é morto e esquartejado pelos ingleses e tem seu corpo, em pedaços, espalhado pelas aldeias da Escócia para amedrontar o povo e seus líderes, acontece o que não se esperava. Há uma revolta enorme.

Isso vai fazer com que Robert de Bruce possa unir os clãs para lutar pela liberdade e tornar-se o Rei dos Scots, Robert I.

Mesmo que para isso tenha que haver um assassinato, cometido pelo próprio aspirante a rei.

O forte do filme de David Mackenzie, além das excelentes interpretações, está nos campos de batalhas. A força e a fúria dos homens que dão sua vida por essa causa, impressiona. Homens a pé enfrentam a cavalaria inglesa, ensanguentados e enlameados, valentes no corpo a corpo, numa luta feroz com punhos, espadas, facas e lanças.

O Rei está ao lado de seus soldados, lutando com eles. Exclama:

“- Eu sou o Rei dos escoceses e não Rei dessas terras.”

Não o movia a ambição de riquezas mas o ideal de liberdade, de um povo que queria comandar o seu destino, governado por um igual a eles. Estavam fartos de ter que pagar impostos aos ingleses.

Quem assistiu ao famoso “Coração Valente” de Mel Gibson, aqui verá uma outra história, a verdadeira, historicamente falando, do Rei Robert I, que encarnou um ideal que até hoje empolga boa parte do povo escocês, a liberdade de seu país, ainda unido à Inglaterra.

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