A Nossa Espera

“A Nossa Espera” - “Nos Batailles”, França, Bélgica, 2018

Direção: Guillaume Senez

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Estamos num imenso galpão onde pessoas embalam os mais diversos objetos que serão empilhados em prateleiras. Alguns estão de gorro e luvas. É inverno. Não há calefação.

Olivier (Roman Duris, excelente ator) preocupa-se com as condições de trabalho dos funcionários. Ele é chefe de equipe e participa do sindicato. Mas naquela manhã ele vai ao escritório de Agathe (Sarah Le Picard), do departamento de Recursos Humanos, para tentar interceder a favor de um amigo, mais velho, que será despedido.

Mas não consegue impedir a dispensa de Jean-Luc que prometera se matar se perdesse o emprego. E a ameaça terrível se concretiza. O suicídio abala a todos.

E Olivier, tão atento à defesa dos interesses de seus amigos no trabalho, se abate com esse fracasso e com a tragédia, mas parece não perceber o que acontece dentro de sua própria casa.

Vemos Laura (Lucie Debay), mulher de Olivier e mãe de dois filhos pequenos, Elliot e Rose, na médica com o filho maior. Um acidente, que não ficamos sabendo como foi, queimou o peito do menino que precisou de enxertos e ainda necessita de cuidados especiais. Pela expressão da mãe e da médica, parece que, de alguma forma, a mãe foi responsável pela queimadura do filho.

Essa mãe carinhosa, que põe os filhos na cama e lê toda noite para eles, está à beira de uma crise emocional. No banheiro, dá vazão a um desespero contido e chora sem fazer barulho. Parece que o suicídio acontecido mexeu com ela.

No dia seguinte, Olivier é chamado à escola das crianças. A mãe não aparecera para buscá-los. Surpreso e preocupado, vai à loja onde Laura trabalha. Ninguém tem notícias dela.

Olivier vai ter que enfrentar a realidade. Batalhar para cuidar dos filhos e batalhar para aguentar o baque que sofreu.

Sempre na espera que Laura volte, Olivier sobrevive graças à ajuda da mãe dele e da irmã Betty (Laeticia Dosch). Mas cada uma delas também tem suas batalhas pessoais.

O diretor franco-belga Guillaume Senez conduz seu segundo filme num ritmo que prende a plateia. Mas não se trata de um filme de suspense. É uma história que lida com angústias contemporâneas. Ninguém é julgado. Todos são observados pela câmera em sua dimensão humana e sofrida.

Todos temos que enfrentar as batalhas diárias que a vida propõe com a esperança de encontrar as forças necessárias para a sobrevivência digna. Não é fácil mas também não é impossível. É o que “A Nossa Espera” propõe.

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O Confeiteiro

“O Confeiteiro”- “The Cakemaker”, Alemanha, Israel, 2018

Direção: Ofir Raul Graizer

Estamos em Berlim e Oren, que vive em Jerusalém, cada vez que visita a cidade a trabalho, gosta de ir no Kredenz Café e pedir o bolo de chocolate Black Forest. Sem esquecer de comprar biscoitos de baunilha para levar.

Um dia, Oren (Roy Miller) pergunta a Thomas (Tim Kalkhof), o jovem dono do café, se ele teria uma sugestão para o presente de aniversário do filho dele. Thomas sugere um trem e se oferece para levar Oren à loja que ele conhece.

Os dois descobrem que tem muito em comum, já que um ano depois, toda vez que Oren vem a Berlim, hospeda-se com Thomas. A câmera é discreta mas percebemos o quanto um gosta da companhia do outro.

Oren não esconde que tem família, mulher e um filho, em Jerusalém. E conta que Anat (Sarah Adler) vai abrir um café.

Thomas que fora criado pela avó, longe de Berlim, porque sua mãe morrera cedo, estava acostumado a ser só e valorizava a única vinda de Oren, uma vez por mês.

Quando Oren vai embora esquecendo as chaves e os biscoitos, Thomas se preocupa e liga no celular dele. Mas só dá caixa postal e ele deixa recados.

E Thomas não sossega, quer notícias. E vai ao trabalho de Oren. Chocado ouve que Oren morreu num acidente em Jerusalém.

Quando Thomas se decide a ir para Jerusalém, com passagem só de ida, ficamos apreensivos, tanto por ele quanto pela viúva. Por que ele quer ficar próximo do mundo de Oren? O luto é um sentimento complicado.

Vai ao café de Anat, pobre e sem graça, com comida kosher para ter o certificado religioso de funcionamento. Mal paga as contas. Mas depois de alguma insistência, tudo vai mudar quando Thomas é contratado e vira o confeiteiro.

Mas e o perigo de Anat descobrir tudo? Parece que Thomas não pensa nisso. Ele quer ocupar o lugar de Oren? O mesmo desejo inspira Anat a vesti-lo com as roupas do marido?

Thomas sonha com Oren e dorme com a sunga dele, deixada no Centro Esportivo. A chave esquecida abriu o armário.

Nada é dito claramente mas pode ser que a mãe de Oren tenha intuído a verdade sobre Thomas e o filho Oren. Mas ela gosta dele. Cozinham juntos e se dão bem.

Thomas, que não teve mãe mas avó, gosta do ambiente feminino de uma cozinha onde sabe o que fazer. Ele é principalmente muito carente. Alguém que é solitário mais por timidez que por escolha.

Muitas perguntas vão ficar no ar com esse primeiro filme de Ofir Raul Graizer. Mas o roteiro escrito por ele permite ao espectador que pense em tais questões, que não precisam se ater a uma única reposta.

E essa fluidez de territórios no preenchimento das carências humanas abriga melhor os personagens dessa história. Thomas e Anat não seguem regras? Não devem ser os únicos nesse mundo complexo em que vivemos.

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