Nós

“Nós”- “Us”, Estados Unidos, 2019

Direção: Jordan Peele

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Vocês viram “Corra!”, o filme de Jordan Peele que apareceu na lista dos indicados a melhor filme do ano no Oscar 2017? Ele levou o prêmio de melhor roteiro original. E o diretor foi o primeiro negro a ganhar nessa categoria. Seu filme era original, divertido e os elementos de terror eram usados de maneira diferente da comum.

Nesse “Nós”, Jordan Peele surpreende de novo. Também pode ser visto como outro filme de terror original mas aqui, além do racismo, como em “Corra!”, há uma leitura sofisticada sobre a psicologia do duplo, fala-se sobre o medo do que está escondido dentro de nós nas zonas de sombra, mostra-se a falência do sonho americano e discute-se a massa e sua força terrível e descontrolada. E, claro, cada um pode descobrir outros temas nesse filme tão instigante.

Porque Peele é bastante inteligente ao lidar com esses assuntos, tão contemporâneos, de modo a possibilitar várias leituras do seu filme. Há aqui muitas camadas de compreensão, se pararmos um pouco para pensar. Mas não é obrigatório. “Nós” pode ser visto apenas em sua superfície, como um filme de terror que não deixa o espectador sossegado, com passagens divertidas e sustos bem colocados.

Tudo depende da nossa possibilidade de lidar com metáforas e entender os símbolos. Cada um vai ver um filme diferente do que o outro viu? É bem possível, porque a realidade é sempre subjetiva e lemos o que está na nossa frente com a bagagem adquirida ou não ao longo da vida.

Quando o filme começa há uma alusão a tuneis não mais utilizados ou com propósitos desconhecidos nos Estados Unidos. Mostra-se também que 6 milhões de americanos se uniram para combater a fome no país.

E tudo se inicia num parque de diversões decadente em 1986. Uma família de negros tenta se divertir na Praia de Santa Cruz mas o ambiente não é agradável. Destaque para um sujeito mal encarado e sujo que segura um cartaz que diz “Jeremias 11:11” (“Portanto assim diz o Senhor. Eis que trarei mal sobre eles, de que não poderão escapar e clamarão a mim mas eu não os ouvirei. ”)

Enquanto a mãe vai ao banheiro e o pai joga numa máquina, a menina Adelaide afasta-se da família. Desce uma escada para a praia. E como começa a chover ela se abriga num lugar que parece ser um brinquedo do parque. Um letreiro diz: Venha se Conhecer.

O local é um labirinto de espelhos. Uma coruja dá um susto na menina, uma voz fala da Mulher Aranha e de repente tudo fica escuro. Quando vê o luminoso de “Saída” a menina corre para lá. Mas bate numa parede de espelho. Ela assobia para disfarçar o medo e atrás dela aparece um outra menina igual a ela. Olhos de pavor e a outra a agarra.

Depois dessa experiência, a menina fica muda e os pais a levam numa especialista que diagnostica síndrome pós traumática.

Passam-se os anos e Adelaide (Lupita Nyong’o), casada, com dois filhos, vai com o marido passar férias de verão numa casa próxima à praia de seu trauma infantil.

Mesmo não gostando da ideia, pela manhã acompanha o marido e os filhos à tal praia. Lá encontram os vizinhos (Elisabeth Moss e Tim Heidicker) com as filhas gêmeas.

E aí vai começar a segunda parte do filme. À noite, os clones vermelhos, “The Tethered”, os Amarrados, atacam.

Lupita Nyong’o está formidável em seu papel duplo. Custamos a acreditar que se trata da mesma atriz. Aliás todos os atores estão muito bem dirigidos por Jordan Peele, que também escreveu o roteiro e produziu o filme.

E mais não digo porque é o tipo do filme que quanto menos você souber, mais vai ser impactante.

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Um Crime Perfeito

“Um Crime Perfeito”- “A Perfect Murder”, Estados Unidos, 1998

Direção: Andrew Davis

Entramos pelas janelas de um “loft” em Nova York, que é um ateliê de pintor. Espalhadas no espaço em cavaletes, outras no chão, numa mistura agradável, as obras do pintor convivem com materiais que ele usa em seu trabalho como tintas, solventes, pincéis. Mas ele não está trabalhando. Na cama, um casal faz amor. Não vemos os rostos. Só as joias dela na mesinha ao lado.

Agora é o Central Park e a câmara acompanha quem adivinhamos ser a companhia do pintor. Num casaco elegante, ela caminha pela calçada, cabelo louros bem cortados, maquiagem suave e as joias que já vimos.

Ela entra num rico apartamento. Móveis antigos, veludos, sedas macias e arte nas altas paredes.

Emily Taylor (Gwyneth Paltrow) surpreende-se com a presença do marido Steven (Michael Douglas), que acreditava estar num jantar com clientes. Ele é um grande investidor da Bolsa. Está vestido num “smoking” alinhado e a saúda com um “dry martini”:

“- Aos momentos roubados…”

“- Mudou de ideia? Pensei que não iríamos…”

“- Meus investidores ingleses perderam o avião. ”

E depois de um momento, onde ela sai para se vestir também, ele a segue. Ela está no telefone mas desliga quando o vê entrar em seu quarto de vestir. Diz algo sobre papéis que esqueceu em sua mesa na ONU, onde trabalha e pega um vestido do armário.

“- Prefiro este”, diz ele, autoritário, passando o cabide com um longo. Ela obedece mas deixa transparecer contrariedade.

Chegam ao Metropolitan Museum para a noite beneficiente e os fotógrafos a cercam. São “beautiful people”, como chamam os colunáveis.

Ela, com um colar de brilhantes discreto, tem os cabelos num coque que realça o belo pescoço, e é elogiada pelas mulheres atentas.

Ela se afasta do grupo e procura quem sabemos. Quando o encontra trocam olhares interrogativos:

“- Disse que não vinha…”

“- Ele mudou de ideia. Não consegui te avisar…”

Ele é David (Viggo Mortensen) com quem ela passou a tarde. Alto, cabelos longos, rosto atraente.

São esses os personagens da trama do filme que inclui o triângulo amoroso e crime.

Ainda não sabemos mas ela é uma rica herdeira e o marido passa por dificuldades financeiras.

“Um Crime Perfeito” é uma adaptação de um clássico de Alfred Hitchcock de 1954, estrelado por Grace Kelly, Ray Milland e Robert Cummings que, por sua vez era uma adaptação de uma peça de sucesso na Broadway escrita por Robert Burks.

Com um bom roteiro de Patrick Smith Kelly, atores talentosos e um visual atraente, “Um Crime Perfeito” tem suspense num crescendo e reviravoltas que surpreendem o espectador.

Andrew Davis conseguiu uma boa direção, muito diferente da de Hitchcock. Melhor assim porque tentar copiar um gênio nunca dá certo.

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