Retrato do Amor

“Retrato do Amor”- “Photograph”, Índia, 2019

Direção: Ritesh Batra

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A Índia é um país diferente dos outros. Enorme. População que passa de um bilhão e ainda existem as castas ditadas pela religião hindu. Casamentos mistos até nos dias de hoje são vistos com receio pela geração mais velha e tradicional.

Miloni é uma garota de classe média alta, estuda contabilidade e é a primeira de sua turma. Ela é suave, delicada e fala pouco. Na loja em que a conhecemos, a mãe é quem escolhe o seu vestido.

Miloni é bela. Cabelos curtos encaracolados, pele perfeita, perfil de camafeu, boca bem desenhada e olhos sombreados por cílios escuros e espessos. Tem uma beleza clássica.

Seus pais a querem casada com um indiano rico, que tenha estudado nos Estados Unidos e a faça feliz como merece.

Mas, estranhamente, a pessoa com quem Miloni tem mais afinidade na casa dela, é a criada que veio de uma aldeia do interior, veste-se com o traje tradicional, usa pulseiras nos tornozelos e dorme num colchãozinho na cozinha.

Miloni interessa-se pela vida no interior e a vemos respondendo a um pretendente que se sente cidadão do mundo:

“- Eu gostaria de morar numa aldeia. Cuidar da terra e dos animais de manhã e depois do almoço dormir debaixo de uma árvore.”

E é ela que é fotografada como se fosse uma turista, no Portal da Índia em Mumbai, quando descia da balsa. O fotógrafo é Rafi, pobre mas com algo de nobreza em seu modo de se comportar.

E ele tem um problema. Não tão jovem, precisa de uma falsa noiva para mostrar para a avó, que vem visita-lo e quer que lhe dê um bisneto.

Procura por Miloni com afinco e vai descobrir onde ela estuda. Ele explica o que está acontecendo e ela aceita passar por sua noiva frente à avó e agradar a Dadi, uma senhora espevitada mas tradicionalista. Foi ela quem cuidou do neto quando os pais de Rafi se separaram e sumiram, deixando dívidas que Rafi se esforça ainda para pagar.

Miloni e Rafi tem algo da Índia eterna, um país com cores jamais vistas e deuses e deusas para todos os acontecimentos da vida. Um país romântico, onde os filmes de Bollywood  são fantasias sobre o amor, com danças e cantos fora da realidade.

O que não é o caso desse filme, “Retrato do Amor”, que também fala de um amor romântico mas que tem que se cuidar para sobreviver e vencer obstáculos.

É uma história envolvente, delicada e solene em sua simplicidade. Não ficamos sabendo de tudo o que acontece porque o diretor deixa algo para a nossa imaginação trabalhar. E é obra do mesmo diretor e roteirista que nos presenteou com sucessos como “Lunchbox” de 2013 e “Nossas Noites” de 2017.

Ritesh Batra, que foi também produtor, apresentou seu filme no Festival de Berlim e agradou à plateia politizada e sofisticada com sua proposta de uma sedução delicada.

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Era Uma Vez em…Hollywood

“Era Uma Vez em...Hollywood”- “Once Upon a Time in...Hollywood”, Estados Unidos, 2019

Direção: Quentin Tarantino

Quando o filme estreou no Festival de Cannes desse ano, o diretor pediu à plateia que não revelasse o final. Queria evitar que o “spoiler” tirasse a graça do filme?

Ora, todos sabem que uma das características dos roteiros de Tarantino, central em “Bastardos Inglórios”, é incluir uma “revisão” da história. E, se ele diz para ninguém contar o final, todos ficam curiosos e quem viu tem um trunfo na mão.

Todo mundo que era gente em 1969 soube do crime hediondo. Sharon Tate era mulher do diretor polonês Roman Polanski que havia dirigido “O Bebê de Rosemary” em 1968. E ela esperava o filho deles, que chegaria em breve. Estava com amigos na noite do crime porque Polanski tinha ido para a Europa e voltaria para o nascimento. Todos que estavam na casa naquela noite morreram de maneira atroz.

Foi chocante saber dos detalhes do crime que estavam em toda a imprensa internacional. Charles Mason, o chefe do grupo conhecido como “a família”, não estava presente mas foi o mandante. Um psicopata perverso.

Tarantino mostra o líder demoníaco dando uma passada rápida pela tela, interpretado por Damon Herriman. Seus seguidores aparecem mais. Todos muito soturnos, drogados e fanáticos. Eles não eram “hippies”, “as crianças da flor e do amor”, mas jovens sujos, sem rumo, que queriam fazer notícia, matar para provocar.

Eles não são os personagens principais do filme. Leonardo DiCaprio, Brad Pitt e Margot Robie é que são.

Leonardo DiCaprio é Rick Dalton, ator de TV, que fazia o homem mau de uma série de faroeste que já acabou. Decadente, depende de participações especiais no programa de outros. Mas ele ainda pensa em subir na vida, trabalhar no cinema e aparecer. Tem raiva do que aconteceu com ele.

Brad Pitt é Cliff Booth, homem bonito, corpão. É o dublê de Rick. Também quer subir na vida. É rude, violento  e tem um cachorro que só gosta dele. Odeia outros humanos.

E Rick Dalton descobre que é vizinho de gente famosa. Quer ser convidado para uma festa e conhecer os VIPs de Hollywood e fazer carreira.

Até aqui só desilusões. Sharon Tate é a bela do filme.

E quem presta uma homenagem a ela é Margot Robbie que passa toda a beleza, leveza e inocência da atriz. Aquela que entra num cinema para se ver na tela. Extasiada com as imagens, põe os pezinhos nús e sujos na cadeira da frente e olha a tela e acompanha as reações da plateia com óculos da moda na época, grandes e redondos. Parece feliz.

O diretor Polanski (Rafal Zavierucha) tem uma ponta com sua bela mulher. Os dois confiantes no Aston Martin conversível, cabelos ao vento, vão a uma estreia.

“Era Uma Vez em…Hollywood”, um filme difícil e amargo, talvez queira contar da decepção que o cinema pode trazer para os que querem participar desse mundo de ilusão que promete fama.

O crime traz mais fama, parece insinuar Tarantino. Uma ideia diabólica mas que sabemos estar presente por trás de muitos dos massacres acontecidos nos Estados Unidos.

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