Um Dia de Chuva em Nova York

“Um Dia de Chuva em Nova York”- “A Rainy Day in New York”, Estados Unidos, 2018

Direção: Woody Allen

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Na nova comédia romântica, o 49º filme de Woody Allen, que quase não foi lançado por problemas com a Amazon, Gatsby Wells (Timothée Chalamet) e Ashleig, sua namorada (Elle Fanning), estudam em Yardley, uma universidade pequena e seleta, frequentada por uma elite endinheirada.

Ele tem uma família rica em Nova York e uma mãe que opina muito em sua vida. Está chegando a data da festa black-tie que ela dá anualmente no apartamento da família em Nova York e ela quer que ele venha.

Os dois namorados combinam um fim de semana em Nova York. Ele quer levá-la a conhecer lugares imperdíveis na opinião dele. Afinal, ela vem de uma família do Arizona, que não tem a cultura da dele. Mal conhece a cidade e só se lembra de ter comprado uma Birkin na rua, baratinha. É uma moça caipira e ingênua.

Ela estuda jornalismo e tem que fazer uma entrevista com um diretor de cinema importante, Rolland Pollard, para o jornal da faculdade.

No ônibus que os leva para Nova York, ela pede que ele ajude com as perguntas que deve fazer. Além de citar nomes de diretores famosos e se atrapalhar com a nacionalidade deles, ela pouco sabe sobre cinema.

Hospedam-se numa suíte do Pierre porque Gatsby, um jogador com sorte, quer mostrar o Central Park no outono para Ashleigh. Mas está quase na hora da entrevista no Soho e ela não quer se atrasar. Combinam um almoço no Daniel’s.

Ashleigh é loura, alta, bonita e jovem. De suéter e saia curta, impressiona homens mais velhos. Até por isso, gostando de ser admirada e deslumbrada com o mundo das celebridades do cinema, ela se divide entre o diretor (Liev Schreiber) que quer levá-la para o sul da França, como sua musa, o roteirista (Jude Law), que está sendo traído pela mulher dele (Rebbeca Hall) e um ator famoso (Diego Luna).

Ashleigh bebe muito, fuma um baseado e vai acabar com o fim de semana de Gatsby. Nunca está disponível para nenhum dos programas que tinham combinado. E se mete em encrencas divertidas.

Gatsby, por sua vez, encontrou por acaso a irmã mais nova de uma antiga namorada, Shan (Selena Gomez). Depois de alguns beijos para o filme de um amigo comum, acabam no apartamento dos pais dela porque começa a chover e ele quer trocar de roupa.

Há um momento melancólico e romântico quando Gatsby senta-se ao piano e canta com uma inesperada afinação “Everything Happens to Me”. Chove muito lá fora.

Reparem na cena em que há um close de Shan na janela, onde a água da chuva e luzes verde e rosa transformam o rosto dela num Renoir vivo. Ela é uma moça sem frescuras, inteligente e irônica. E sexy.

No MET, cercados por Renoirs, impressionistas e retratos de John Singer Sargent, acabam na ala egípcia, onde Gatsby dá de cara com os tios. Vai ter que ir na festa da mãe.

Sozinho, no piano-bar do Carlyle, ele recruta uma profissional lindíssima para a festa da mãe (Cherry Jones). Lá haverá uma conversa que vai mudar o jeito dele viver a vida. Ele amadurece à força e é levado a procurar o que realmente tem a ver com ele.

Toda sua insegurança, ansiedade e o resto, estavam dentro dele e não fora.

Woody Allen, 83 anos, conseguiu novamente. “Um Dia de Chuva em Nova York” é um filme que parece tratar de coisa sem importância mas o diretor nos ensina que a vida é assim. Somos frágeis e estamos à mercê dos acontecimentos. Temos que ter sorte e talento para aproveitar os bons momentos.

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A Vida Invisível

“A Vida Invisível”- “The Invisible Life of Eurídice Gusmão”, Brasil, Alemanha, 2019

Direção: Karim Ainouz

A perda do paraíso. Mal sabem as irmãs Guida e Eurídice, que se amam, que tudo aquilo será só uma lembrança triste. O Rio, Corcovado, Redentor, Pão de Açúcar, ali só para os olhos delas. E os ouvidos escutam o canto dos pássaros, o barulho das ondas e a algazarra dos micos na floresta. As duas sentadas nas pedras frente ao mar.

“- Vamos. Vai chover. ”

Sobem a encosta abandonando o mar mas logo Eurídice (Carol Duarte) perde Guida (Julia Stockler) de vista:

“ – Guida! Cadê você? ”

E ouvimos a voz de Guida responder lá do futuro:

“ – Você me disse vai, Eurídice. Você sempre teve as piores ideias. E eu te dei corda. Por que eu fui? Tinha que ter me trancado no quarto e engolido a chave. ”

Do que fala Guida?

O sonho de Eurídice era seu piano. Queria ir estudar no conservatório de Viena. Já Guida queria sair e festejar. Encontrar Yargos, o marinheiro do navio grego e partir. Ingênua, acreditava que ele ia casar-se com ela e Eurídice acobertava, preocupada, suas fugas noturnas.

Ao longo do filme vamos ver as irmãs perderem seus sonhos e sua ingenuidade. Vidas separadas, imaginando-se distantes. E sofremos com as cartas de Guida para Eurídice, que nunca tinham resposta. Ouvimos Guida implorando para a mãe que, se estivesse lendo a carta, que a mandasse para Viena. Depois, decepcionada, imaginando que talvez as cartas nunca tivessem sido enviadas para a Europa, onde a irmã certamente levava uma vida maravilhosa de concertista, Guida se cala.

Não foi por falta de Eurídice procurar a irmã que elas nunca mais se encontraram. O preconceito com o filho sem pai de Guida as separou. O castigo de Guida foi também o castigo de Eurídice. Um mundo machista e misógino impediria a aproximação das duas para sempre.

Karim Ainouz nos leva a seguir a vida das duas irmãs desde os anos 50, fazendo mergulharmos num mundo sufocante e em tudo dramático para aquelas mulheres que perderam seus sonhos mas ainda assim resistem, lutadoras.

E, se no princípio o Rio é uma cidade que se mistura com a floresta, com casas antigas e ruelas, cores intensas e meio borradas, como se as cenas fossem quadros, vai depois caminhando para menos sonho e mais realidade, com cores menos berrantes e foco.

Inspirado no romance de Martha Batalha, produzido pelo brasileiro de Hollywood, Rodrigo Teixeira, “A Vida Invisível” ganhou o prêmio de melhor filme da Mostra “Un Certain Régard” no último Festival de Cannes, com as cenas finais emocionantes a cargo da estrela maior, Fernanda Montenegro.

Agora espera a lista dos cinco filmes estrangeiros que irão concorrer ao Oscar. Se não ganhar, de qualquer forma ganha o Brasil mais um filme precioso. Aplausos para o talento de Karim Ainouz, que já nos deu “Madame Satã” 2002, “O Céu de Suely” 2006 e “Praia do Futuro” 2014.

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