Alguém tem que morrer

“Alguém tem que morrer”- “Alguien tiene que morir”, Espanha, México, 2020

Direção: Manolo Caro

A imagem de um pombo assustado numa gaiola e os gritos que antecedem os tiros é um começo chocante. Principalmente para quem não suporta maus tratos a animais. Aqui, trata-se de um clube de tiro ao pombo.

Mas, essa crueldade, dita esportiva, impregna todo o cenário de uma Espanha sob o ditador Generalíssimo Franco, em meados da década de 1950. Não são só pombos inocentes que vão morrer.

A repressão envolve a todos. Duros e arrogantes, os burgueses de uma elite endinheirada. Amedrontados e perseguidos, os humildes e as minorias.

Não há proximidade nem entre os casais. Mulheres são submetidas. Raras as que escapam a esse destino. A sexualidade também se apresenta cruel. Os casamentos servem para resolver problemas financeiros e interesses diversos.

Duas famílias são o foco dos conflitos que a história vai contar. Gregório (Ernesto Alterio) comanda com mão de ferro a sua e compartilha com Don Federico (Manuel Morón), o pai da noiva impingida a seu filho, atos de corrupção. Vende trabalho escravo de prisioneiras do estado para a fábrica do futuro sogro do filho.

Não há humor nem carinho. A matriarca Amparo (Carmen Maura) não perde a classe e se esquiva para obter o que deseja. Um segredo do passado a envolve e também à nora Nina (Cecilia Suarez) e ao neto Gabino (Alejandro Speitzer) mas todos sustentam a aparente normalidade das relações familiares.

A casa escura e decorada com um luxo austero é cuidada pela empregada Rosario (Mariola Fuentes) que também esconde algo que a torna alvo de chantagem.

A ação vai começar de verdade quando Gabino chega do México, terra natal de sua mãe, onde passara dez anos. Por que? Não sabemos. Ele traz um amigo, Lazaro (Isaac Hernández), que é bailarino e quer conhecer as companhias clássicas europeias.

O pai mandara Gabino voltar porque a ideia é casá-lo com a filha de Don Federico, Cayetana (Ester Expósito).

O que vai apimentar essa história e mostrar a crueldade vigente é o fato de Lazaro, sendo bailarino, já ser tachado de homossexual, sem prova alguma, o que era considerado um crime pela lei de Franco.

A ninguém interessa que venham à tona os segredos guardados cuidadosamente e que escondem verdades incômodas. Assim, desviam a atenção, culpando uns aos outros pelo que não corre bem.

“Alguém tem que morrer” tem três capítulos, escritos pelo diretor e algumas interpretações que parecem exageradas. Mas penso que isso é algo buscado, de propósito, para que tais personagens não suscitem simpatias.

A produção é competente, as locações bem escolhidas e os figurinos inspirados. O roteiro prende o interesse, apesar de situações mal explicadas.

Tem um quê de Nelson Rodrigues na história, apesar da psicologia dos personagens não se aprofundar. Mas vale a pena ver.

 

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