A Suprema Felicidade

“A Suprema Felicidade” – Brasil, 2010

Direção: Arnaldo Jabor

Voltar a filmar foi a suprema felicidade para Arnaldo Jabor.

Sente-se isso ao longo de todo o filme, o primeiro depois de mais de vinte anos de auto – exílio da terra do cinema.

Memórias como tema, ele volta ao passado no início do filme. Estamos no Rio de Janeiro do final da Segunda Guerra, quando ele, criança, começava a observar o mundo ao seu redor com olhos curiosos e pensativos.

“_ Levanta meu filho. Acabou a guerra!”, diz a mãe ao menino.

Todos saem para as ruas onde há um Carnaval misturado com um sábado de aleluia. A meninada malha Hitler como Judas. O pai, com o uniforme da FAB, dá tiros de revólver para o alto. Momento de alegria e luz.

Na tela, contra um cartão postal do Rio de Janeiro em preto e branco, destacam-se as letras coloridas do título do filme.

E é esse contraponto entre memórias vivas e coloridas e outras, mais desbotadas, que vamos ver por mais de duas horas. Aqui, o corte na sala de montagem, poderia ter deixado de fora alguns trechos menos felizes do filme. Mas digo menos felizes no sentido de menores, toscos até, quando a vontade de fazer rir prevalece e um deboche geral turva a cena.

Jabor é um excelente cronista e gosta de falar sobre si mesmo. Seus leitores já sabiam quase tudo que o filme conta. Em seus textos, ele consegue ser cinematográfico usando só palavras. Mesmo quando é contundente mantém a classe, apesar da prolixidade.

Ora, isso fica prejudicado no filme porque os atores conduzem com estilo dramático diferente os seus personagens. Ora farsa, ora drama realista. Por exemplo, Jorge Loredo (o padre que fala sobre o “vício solitário”) ou Elke Maravilha, a avó “polaca”, criam um tom de circo, enquanto outros como Mariana Lima, a mãe ou Maria Flor, a “pinup” espírita, descambam para o melodrama e outros ainda, como os três Paulinhos (Caio Manhente, o menino, Michel Joelsas, o adolescente e Jayme Matarazzo, o mocinho) e o pai (Dan Stulbach, ótimo como sempre) , optam por uma interpretação mais realista. Escolha do diretor ou direção confusa de atores?

Também por isso, cria-se uma colcha de retalhos com pouca ou nenhuma costura entre os episódios que são contados. Faltou trabalhar o roteiro? Jabor tinha pressa em voltar ao cinema?

O próprio diretor se justifica em entrevista à Folha:

“Os filmes atuais são obcecados pelo enredo. O que tem de felliniano no meu filme é que as sequências se somam, sem que uma explique, necessariamente, a outra.”

Pode até ser.

Mas para mim, o personagem do avô criado por Marco Nanini, com a habitual força e espontaneidade, é o destaque e a salvação de “A Suprema Felicidade”. Nele reside o melhor Jabor. Cabe ao avô conduzir o filme com empatia e calor, afastando-se tanto do melodrama quanto da caricatura e mantendo-se o mesmo, apesar da passagem do tempo. Memória afetiva conduzindo a câmera e a alma do diretor.

Tammy Di Calafiori também brilha com a criação singela e sexy de sua Marilyn. Dublando a trágica musa, ela empresta à personagem um frescor original.

Ela e Jayme Matarazzo são os responsáveis pela cena mais bonita do filme, na minha opinião. Um amanhecer em Copacabana tinge de tons rosa os corpos jovens e nús, entregues ao depois do amor. Raro momento romântico, num filme onde as mulheres não primam pela presença bela.

Arnaldo Jabor em “A Suprema Felicidade” não filmou um “tempo de delicadeza” como canta a música de Chico Buarque ao longo do filme. Aliás, a canção aqui é apenas música sem palavras…

Mas como as memórias subjetivas ou construídas são do Jabor, como diretor ele nos oferece o filme que quis fazer, depois de tanto tempo pensando nele.

“A Suprema Felicidade” é, para mim, um filme irregular que pode agradar aos fãs do colunista Arnaldo Jabor mas que pouco acrescenta à sua obra de cineasta.

Este post tem 0 Comentários

  1. Sylvia Manzano disse:

    Tinha lido 2 críticas bem desfavoráveis ao filme e esperava ansiosamente a a sua crítica.
    Eu gostei mto de “Toda nudez será castigada” e adorei ” Eu sei que vou te amar”.
    Na época cheguei a comprar o livro, que li de um fôlego só e tb adorei.
    Teve outro – que me falta o nome agora – que tb gostei mto – achei mto sofisticado, me lembro de uma sala com vários aparelhos de tv…
    Durante mto tempo gostava mto das crônicas do Jabor e até dos comentários que fazia na “Globo”, mas fui perdendo totalmente o gosto de lê-lo e ouví-lo e hj em dia, posso dizer que não suporto suas posições na política e sua insistência incansável em desqualificar o presidente Lula, de forma contundente beirando à
    grosseria.
    Confesso que gostei que a Elonora disse nem que sim e nem que não ao seu filme.
    Parece que todos concordam que o Nanini salvou o pouco que se tinha pra salvar no filme e ao contrário dela, eu detesto o ator Dan Stulbach.
    Acho exageradíssimo, não sei como está neste filme, mas pra mim, ele é sp uma caricatura de personagem.
    E mais uma vez eu me dou o direito de fazer comentário, sem ter assistido o filme.
    Meu querido Monteiro Lobato disse, certa vez, que queria que seus livros fossem uma casa onde as crianças pudessem morar.
    Eu me sinto um pouco assim nesse blog, me sinto “em casa” e vou dando aqui os meus pitacos, sem medo de ser feliz.

  2. Sylvia Manzano disse:

    SEramigo, eu sou passante dos 38 há mto tempo e tinha pelo Jabor algo semelhante ao q vc disse, uma gde admiração, mas agora…
    Qto à mídia, quem precisa dela agora que temos a blogosfera, o Twitter e o twitcam no Twitter, uma televisão na internet???
    See u.

  3. seramigo disse:

    Vai aí uma admiração pela sua “justeza”, Eleonora, ao escrever sobre ”A Suprema Felicidade” do Jabor. Temos em vc, – que ÓTIMO – uma “crítica” de cinema que sabe ver/ler Qualificações, além de suas sim&antipatias, diferenciando aspectos da Pessoa, do Profissional e até mesmo chegando ao requinte de sua especificidade (jornalista e diretor). Que me lembre, é a 1ª vez que a “leio” reforçando marcada/e aspectos “negativos” que viu no filme, mas seu equilíbrio é de uma Pessoa e de uma Profissional invejávei; alio-me à Sylvia,… “qdo crescer, quero ser cvc”!!!

    Desde qdo Jabor apareceu na tv, eu me espelhava nele, tipo alter ego, gostando de sua “performance”, dando-lhe o direito de ser livre e feliz no jeito dele, cabendo a mim e a todos o direito de “ler/ver” sua comunicação sob minha ótica, tipo, diz aí o que quiser, que eu, aqui, tiro MINHAS conclusões.
    Odeio grosserias tbém, mesmo porque existem recursos “às pencas” de se COM+VIVER c/ mais inteligência e sutilezas.
    Vou ver o filme, sim, por ser tbém Jabor e rever nostalgicamente outros tempos; cotar à distancia os enfoques masculinos e femininos de “nossa” época de “antanho”!(p/ os “passantes além dos 3.8”, que por aqui devem ser poucos!!!!).
    Sylvia, aproveito p/ agradecer sua dica no comentário do filme anterior (embora não seja muito “minha praia”; “don´t to question, please!!!); e dizer que tbém gosto, muito, de seus “pitacos” & “quetais”, como aliás, já manifestei nos inícios desse blog da Eleonora.
    E olhe que nem sempre nossos enfoques convergem,…. e daí?! A Vida é mais Rica p/ quem sabe CONVERGIR na DIVERSIDADE. “Unidos e Compreensivos” (sic). E, – se me permite dizer, -(qto à Mídia), que é um direito nosso reagir c/ “ira justa”, mas um “paz e amor” talvez revolucione mais que o chicote (tbém ele, válido, claro, às vezes), mesmo porque, parodiando Alguém (ñ me recordo) que a unanimidade nem sempre é “unânime”!!!
    Então, “mais um” por aqui – tbém esperando pacientemente p/ outros comentários – p/ reforçar que “A vida gosta de quem gosta dela.” (sic)

  4. Sylvia Manzano disse:

    Admiro mto esse seu grau de civilidade, qdo eu crescer, quero ser como vc.
    Hj em dia, não existe mais pra mim, esse apesar de…
    Ou então, só vale o : “apesar de vc, amanhã há de ser, um novo dia”.
    Não aguento a sistemática campanha da midia (ainda bem que agora temos a Tv Record, a revista Carta Capital, desde sempre, a revista Isto é, independente, até a Band de vez em qdo) em desqualificar um presidente que é líder mundial no combate à fome, reverenciado e aplaudido por todo o planeta.
    Essa insistência em não ver o que está escancarado aos olhos do mundo, me faz crer que a inveja cega ou mata, como diz o ditado.
    Obrigada pela informação, depois eu tb lembrei do nome do filme, que gostei mto.
    Eu tb gostaria mto que outras pessoas escrevessem e agradeço mto o seu apoio às minhas mal traçadas linhas.

  5. Eleonora Rosset disse:

    Sylvia querida,
    É mesmo…Vc tem toda a razão.
    Mas eu queria saber também pq ninguém escreve suas opiniões…
    Só nós duas?
    Que pena..

  6. Eleonora Rosset disse:

    Querida Sylvia,
    Pois é. Pelo que vc leu no meu comentário pode perceber que ao cineasta prefiro o colunista. Apesar de discordar politicamente dele e odiar as grosserias…
    O filme das televisões é o “Eu te amo” com a Sonia Braga.
    Qto ao nosso espaço, gosto dos seus pitacos e seu jeito de não ter medo de ser feliz.
    Oxalá outros fizessem o mesmo!

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