Alice no país das maravilhas

"Alice no País das Maravilhas" - "Alice in Wonderland", Estados Unidos, 2010

Direção: Tim Burton

Crescer é um desafio. Quando Alice cai no buraco da árvore, dessa vez para fugir a um noivado, o País das Maravilhas está destroçado.
Passou um dragão por lá, a mando da Rainha Vermelha que, além de cortar cabeças, quer destruir também o que restou dos domínios de sua irmã, a suave Rainha Branca, e colocar para sempre a coroa em sua própria cabeça.
Claro que quem não é criança reconhece nessa metáfora a perda da idade da inocência, a destruição necessária do casulo da criancice para que possamos nos transformar em adultos. E escolher a vida que queremos.
Será que só somos felizes na infância? Outro filme que está passando (“As melhores coisas do mundo”) tem uma resposta a essa questão: podemos ser felizes também na idade adulta. Só que é mais complicado.
O diretor Tim Burton carrega nas tintas sombrias nesse filme em deslumbrante 3D em que cada cena é um espetáculo à parte.
Alice não veste mais o seu vestidinho azul com avental branco e sapatos pretos com meia três quartos. Já no mundo lá fora ela se recusa a colocar espartilho e nada de meias, para desgosto de sua mãe. Alice agora é uma feminista em processo.
O pior aconteceu para Alice. Seu rosto está pálido, seus ombros caídos e ela perdeu o brilho da menininha que ela foi um dia. Seu pai querido morreu…
Descendo ao mundo das maravilhas perdidas, Alice faz também uma descida às regiões do luto, que sabemos como são sofridas. E só há um caminho de volta. Passa pelo reconhecimento de quem somos e da percepção de que o que foi perdido não voltará, a não ser dentro de nós.
Por isso todos perguntam a Alice:
“- Qual é o seu nome? Quem é você?”
Alice se dá conta de que aquilo não é mais um sonho infantil. Porque perder a identidade e encontrar-se nas sombras é um pesadelo.
Mas ela se apruma, reencontra a chave perdida da imaginação e vence o dragão da morte do pai, reencontrando-o em seu coração.
Quanto à infância, quem quer acha, quem quer lembra.
Felizmente é o que acontece com Alice.
Os mesmos personagens da primeira história também estão lá e vão ter que passar pela mesma repaginação que Alice sofre. Para reconquistar o próprio brilho precisam urgentemente que Alice empunhe a espada e ponha ordem no seu reino.
Johnny Depp como o Chapeleiro Maluco veste o seu papel como uma luva. Sua dança em homenagem a Michael Jackson surpreende e arrepia. Helena Bonham Carter está perfeita como a cruel e ambiciosa Rainha Vermelha e Anne Hattaway toda neve, prata e luar encanta como a Rainha Branca (de batom preto para não esquecermos que estamos em um pesadelo daqueles).
Um grande achado da figurinista Colleen Atwood foi vestir Alice com roupas de “top model” que ela vai aproveitando e refazendo conforme cresce ou diminue. Porque ela não perdeu a mania de comer o bolo e beber da garrafinha da primeira história e diminuir e aumentar de tamanho.
Mia Wasikowska empresta seu arzinho sexy e matreiro à personagem e faz com graça a Alice mocinha. Arrasa no modelo de tule preto e vermelho com faixa de estampa animal. E quando coloca a armadura reluzente parece um Arcanjo.
A moral da história é: aceite as transformações e encare as próprias encruzilhadas, sabendo que o que você escolher será para sempre você.
Alice, no fim do filme, livre como uma borboleta, parte para novas aventuras.
Afinal, já sabemos que ela não foi feita para ficar em casa obedecendo a marido.

Este post tem 0 Comentários

  1. mbevilaqua2003@yahoo.com.br disse:

    A diferença entre esta e outras críticas que li está na análise bem mais refinada do que significa a viagem de Alice. Super! Parabéns! Montserrat

  2. sylviamanzano@uol.com.br disse:

    A Montserrat tem toda razão: a crítica da Eleonora refina, depura, decanta o filme e voa livre como uma borboleta.

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