A Árvore da Vida

“A Árvore da Vida”- “The tree of Life”, Estados Unidos, 2011

Direção: Terrence Malick

O diretor de cinema e roteirista Terrence Malick, que é filósofo formado em Harvard, filmou apenas cinco longas em sua carreira iniciada nos anos 60. E são todos obras primas.

Em Cannes, ganhou o prêmio de melhor direção por “Cinzas no Paraiso” de 1978, e foi lá que ele deu sua última entrevista sobre cinema.

Perfeccionista, brilhou em Berlim em 1999 com o seu “Além da Linha Vermelha”, um libelo definitivo contra a guerra, que ganhou o Urso de Ouro.

Uma lenda viva, considerado um tímido porque não fala sobre seus filmes, esperando que o público descubra por si mesmo o seu cinema, ele não apareceu em Cannes esse ano para receber a Palma de Ouro para “A Árvore da Vida”.

A beleza do filme é impactante e envolve o espectador em um clima de poesia e metafísica que seguimos, quase sem respirar, como se estivéssemos numa catedral.

Esse estado de espírito nos prepara para as reflexões de Malick sobre o ser humano, através da vida de uma família comum, nos anos 50 do século XX, no Texas,  onde o diretor nasceu, até os nossos dias em New York.

O diferencial será a maneira como é narrado o filme, sem muitos diálogos, com um ir e vir no tempo e frases ditas em “off”, em quase sussuros, que é a marca registrada de Malick.

Além disso, ele consegue atuações memoráveis de seus atores Brad Pitt, Jessica Chastain, Sean Penn e do jovem Hunter McCracken.

O filme começa com uma colocação intrigante e ao redor da qual vai girar a trama simples do filme:

“Existem dois caminhos na vida: a maneira da Natureza e a maneira da Graça. Nós temos que escolher qual deles seguir.”

A familia, que tem Brad Pitt como o pai de temperamento duro e a mãe, Jessica Chastain, suave e doce, amante da vida e da alegria, vai ser mostrada primeiramente em um momento de perda e luto. Um dos três filhos morreu.

Preparem-se. Porque mais que um filme, “A Árvore da Vida” é uma experiência única, se você se deixar envolver pela proposta de Terrence Malick.

O diretor nos convida a pensar nos nossos começos. E para isso, nos coloca para ver o seu “big bang”, o começo de tudo no universo.

Fogo, água, ar e terra, os elementos fundamentais dos antigos, fazem-se presentes.

Belissimas imagens de visitas a mundos longínquos antecedem a chegada ao nosso planeta. A tela é invadida por fotografias e montagens tão maravilhosas quanto assustadoras, se imaginarmos a dimensão do ser humano frente às forças do universo.

Tudo isso com uma trilha sonora não menos espetacular que traz trechos de Smetana ( The Muldau), Bach,
Brahms, Mahler, Berlioz, Mussorgsky, Mozart (Lacrimosa) e muitos mais.

Os efeitos especiais são de Douglas Trumbull de “2001- Uma Odisséia no Espaço”, amigo de Malick, que lhe
pediu para não usar imagens geradas por computador. Assim, foram utilizados os mais diversos materiais para recriar o universo, desde pinturas, corantes, fumaça, até chamas, pratos giratórios, luzes e fotografia em alta velocidade. O resultado é mágico.

Aqui na Terra, o primeiro mundo que é visitado é o microcosmo, de onde surgiu o elemento gerador da vida, essa combinação misteriosa de forças e circunstâncias únicas.

E de repente, sem que a gente espere por isso, hipnotizados que estamos por aquelas paisagens do mundo invisível, Terrence Malick faz-se nosso guia para uma viagem extraordinária, que nos leva em um salto no tempo/espaço até os dinossauros.

E quão comovente é esse contato com o animal primevo que já contém em si a experiência afetiva da maternidade!

Nas praias do começo do mundo, os elos sagrados entre mãe e filhote, fazem sentir a sua presença.

E, quando o olho do feto se abandona ao escrutínio da câmara, sabemos que estamos em território conhecido: já é o nosso mundo.

Os elementos dos antigos continuam conosco na bela natureza que se oferece aos nossos olhos nos vulcões,
rios de lava, desertos de areia, o sol se pondo em horizontes carregados de nuvens e água que cai em torrentes ou em tímidos pingos sobre paredes de musgo que escoram os meandros de um rio.

E compreendemos que a viagem está chegando ao seu ponto alto. Aproximamo-nos do humano em toda a sua
grandeza, falhas e complexidade.

Aqui, as forças cósmicas estarão presentes de uma maneira diferente mas não menos produtora de embates
conflitivos:o pai e a mãe, a casa, os irmãos. O mundo no qual gravitam pessoas em torno de pessoas.

Malick nos faz aterrissar nos Estados Unidos, Texas, anos 50, para viver os pequenos e grandes dramas de uma família.

A história de um homem (Sean Penn), vai ser contada em episódios que nos fazem revisitar a nossa própria vida.

Amores e ódios, tristeza e alegria.

Na saga dos três irmãos, o mais velho e o do meio vão dramatizar o ciúme e a inveja, bem como uma adoração e fidelidade total à mãe. O pai será desafiado…

Terrence Malik escolheu o Livro de Jó da Bíblia, como epígrafe para o seu filme. Assim, a fé e o perdão são os elementos para a compreensão de tudo que vamos ver acontecer.

E Malick pergunta:

“Será que a desilusão e a desgraça são castigos de Deus para os maus? Ou pura casualidade?”

É um filme surpreendente que coloca mais interrogações do que respostas.

Uma delas aflige a todos os seres humanos quando descobrem o poder acachapante da culpa:

“Desejos matam?”

E aí vamos nos lembrar da criança que fomos um dia.

A fotografia deslumbrante de Emmanuel Lubezki, que usa apenas luz natural, combina bem com esse diretor que não acredita em pessimismo mas sim na esperança e no perdão, como força redentora do ser humano.

Este post tem 0 Comentários

  1. Malu disse:

    Agora consegui entrar no seu blog – essencial para quem gosta de vida, de gente, de inteligência, mesmo que não possa ir ao cinema tanto quanto gostaria.

  2. ” essencial p/ quem gosta de vida, de gente, de inteligencia, …e com classe? Se me permitem, estou nessa também, mesmo que não possa comentar esse filme porque ainda não vi, mas verei e comparecerei como outras tantas vezes o fiz, qdo sua plataforma de lançamento era outra. Vou continuar viajando e aprendendo com seus comentários plenos de Vida, Gente, Inteligência, Classe. Longa Vida a vc, Eleonora e a todos que comparecem aqui nessas viagens de luz, sombra, som e ação que imitam a Vida e cujo caminho vc ilumina.
    Bjs

  3. Eleonora
    Tenho aparecido menos porque vejo os filmes bem depois de seus comentários; por exemplo, postei comentário sobre “Minhas Tarde Com…” agora dia 10/8, qdo vc tem uma coleção de filmes já visto e comentado. E assim acabei nem postando sobre “Gainsbourg…”. Mas tenho acompanhado essa sua “rentrèe” de plataforma e todos os seus textos, agora acrescidos e enriquecidos com “As Curtas”, idéia ótima. bjs

  4. Sonia Clara Ghivelder disse:

    Olá, Eleonora
    “Arvore da Vida” não é um filme comum e o diretor Terrence Malick enfatiza isto porque ele tb não é comum.
    A história daquela familia não é tão diferente de tantas outras famílias. O olhar do diretor a começar pela camera sensacional, que parece pedir licença para entrar na casa,espreitando respeitosamente por assim dizer, o que lá acontece. As ruas e seus verdes jardins simétricos entram em conflito com os conflitos da casa daquela família.
    O pai tirano que transformou a vida de um de seus filhos num veradeiro inferno. É com disse o Sartre “l’enfer c’est les autres” , ou seja , o inferno daquele menino era o seu próprio pai.
    Mas me parece que o grande questionamento deste filme se chama porque?, porque?? e porque??? as coisas acontecem? Não saberemos jamais. Está aí diante dos nossos olhos diarimente, todo o tempo, cada segundo o sem controle das nossas vidas, e a mãe natureza superior, inexpugnável, que não nos contará jamais os seus segredos. Nos permite apenas, e olhe lá, apreciá-la. Acrescentando tb o profundo respeito por ela.
    Jessica Chastain, ótima atriz e o menino MacCracken, mediúnico simplesmente!
    O filme nos traz várias mensagens. Talvez a mais sensível é que não podemos perder a esperança de viver sem esperança.
    Sean Penn, um ator notável em tudo o que faz, caminha pela segunda vez com Malick. A primeira vez qdo fez “Thin red line” em 98 e agora outra vez fazendo o papel atormentado de um dos irmãos.
    Bjos para vc e todos os seus amigos que te acompanham.
    Sonia Clara

  5. Sonia Clara Ghivelder disse:

    …Esqueci de dizer que saí deste filme, medindo apenas 1cm.
    bjs,
    Sonia Clara

    • Eleonora Rosset disse:

      Sonia Clara querida,
      Sublime,né?
      Adoro que todos vcs voltem a mim. Pq foi com vcs que eu comecei( Sylvia Manzano e ser Amigo) e me solidifiquei (Sonia Clara).
      Que bom tido mundo de volta!
      E, querida Sonia Clara, que filmão, ein?
      Bjs mil

  6. Querida Eleonora

    So agora tive a oportunidade de assistir a Arvore da Vida

    Não quis ler o seu comentário antes.Mas confesso que depois de assistir o filme entendi quão profundo e detalhado

    foi seu comentário. FOI FUNDAMENTAL Deu vontade de ver o filme novamente

  7. PAULO OCTAVIO disse:

    So assisti a este filme neste final de semana que passou. Filme Americano dirigido por Diretor com perfil Europeu, totalmente fora do padrão mainstream de hollywood. Eu particularmente adorei, mas confeso que se tivesse ido em uma sessão das 10 durante a semana teria sido mais dificil ( assisti na sessão das 6 no cine livraria cultura – meu cinema preferido de SP ! ) o que ajudou bastante. A cena do ” paraíso ” ( a da Praia com o Sean Penn procurando o seu irmão e familia do passado ) foi talvez uma das cenas mais emocionantes que eu assisti no cinema nos ultimos 10 ou 20 anos…Não contive as lágrimas, inclusive porque a música e a direção de imagens são fantásticas. Ok a situação a idílica ( voltar ao seu passado com a consciência da sua atualidade e reflexões do presente ) um perfeito ” tear jerker ” para amantes do cinema inteligente. Imperdível ! Bjs

  8. Carla Pestana disse:

    Querida Eleonora,
    Estou indo alugar um filme, e ao invés de escolher os filmes na locadora, eu optei em fazer uma busca no seu blog Top! escolhi esse! achei bem legal os comentários, e suas dicas são sempre incríveis.

  9. Ligando os possíveis “talvez” explicativos do filme, aparecerão algumas idéias “aleatórias” como também parece ser o filme, pois o que o diretor Malick nos mostra é o “inominável”, pra ele e para nós todos. Tanto que Malick prefere não pontificar ao contar a história da família entremeando-a com imagens evolutivas que falam mais de DÚVIDAS do que das FORMAS de se relacionar com o significado da existência Humana.
    Percebe-se uma carga bem forte autobiográfica do diretor, pois a história está mais centrada no universo masculino (a Natureza), “satelizado” pelo Feminino, (a Graça), que (não) consegue neutralizar a força. (O filho grita isso pra mãe).
    O Diretor faz longa explicação em off …. “onde o caminho da Graça tudo perdoa e compreende….. enquanto que o da Natureza massacra.”
    “Há controvérsias” sobre,….assim como a de que “a menos que você ame, a Vida passará mais depressa”.
    Impressionou-me a cena do “bípedesauro” que reconhece em seu semelhante debilitado a necessidade de poupá-lo da Vida sem forças para sobreviver. Com ela, talvez a sugestão de idéias que nem OUSO levantar; (tipo, Eutanásia; tipo, mais fracos não sobrevivem e por aí vão as possíveis sugestões).
    Quem não reconheceu no filme a ideia da ressurreição e/ou da reencarnação, que levante a mão!
    Um Filme essencialmente Religioso, se não nas formas conhecidas, pelo menos nas de tratar e se relacionar com os elementos todos da VIDA. Até mesmo a forma de memória de infância transformada em praia sugerindo o reencontro num paraíso feliz e harmonioso.
    Quem não identificou na história, a célebre frase de (quase) todo pai e mãe: “faço isso pelo seu próprio bem?” Só que os jeitos aplicados às vezes ou frequentemente foram além da dose recomendada trazendo como efeito colateral uma Vida amarga, rancorosa e sem sentido.
    O diretor dicotomiza a escolha dos caminhos da Vida:
    o da Natureza ou o da Graça.
    E sob os efeitos do filme, de seu texto, Eleonora e dos comentários, ouso, se me permite(m):
    Por que não harmonizá-los numa unidade
    fazendo uma escolha… o da “NATUGRAÇA”?!

  10. moacyr disse:

    Peço licença para Carla Pestana e adiciono que aprendi muito com o que li e vou correndoassitirofilme.Obrigado.chau.

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