Camille Claudel 1915

“Camille Claudel 1915”- Idem, França, 2012

Direção: Bruno Dumont

 

Juliette Binoche é uma estrela. Daí a possibilidade de filmar com todos os diretores de cinema que ela admira. Dessa vez, o escolhido foi Bruno Dumont, que fez dela Camille Claudel (1864-1943), na época em que já estava internada no hospício, onde ficou dos 49 aos 79 anos, quando morreu.

Não foi fácil para ela. Bruno Dumont é um diretor exigente e original. Para compor a personagem, Binoche não tinha nada além das cartas que Claudel trocou com Auguste Rodin, de quem tornou-se amante aos 20 anos.

O romance teve um final deplorável. Camille fez um aborto, Rodin não se separou da mulher, houve um escândalo e a artista, que também era escultora, destruiu obras do amante e as dela. Por isso são raros os museus que possuem esculturas de Claudel.

Dizem alguns que Rodin se aproveitava do talento dela para que suas obras fossem finalizadas. Outros ainda vão mais longe e dizem que era ela quem na verdade fazia muitas das obras que ele assinava. Ninguém jamais saberá a verdade.

Essa história foi contada no cinema pelo filme “Camille Claudel” interpretada por Isabelle Adjani em 1988, dirigida por Bruno Nuytten.

Diz Juliette Binoche sobre a loucura de Camille Claudel:

“O homem que ela mais amou na vida virou seu maior inimigo. A crise de paranoia dela foi gerada pela solidão, pela pobreza e pela traição que sofreu.”

Como cenário para o seu filme, Bruno Dumont escolheu um hospício verdadeiro, onde Juliette Binoche conviveu com pessoas internadas que sofriam de diversos distúrbios mentais.

Foi difícil mas a experiência, além de “visceral”, como ela a descreve, foi um presente para o seu público. Porque a atriz encarna Camille Claudel com um talento e sensibilidade raros.

É extraordinário vê-la fazer dois grandes monólogos, nos quais alterna lucidez e delírios sobre Rodin tê-la envenenado e poder continuar a fazê-lo. Uma fragilidade extrema está estampada em seu rosto muito pálido, com olhos que escurecem para olhar dentro de si mesma e escapar ao horror da convivência com os gritos, choros e expressões daquelas pessoas loucas ao seu redor.

“Um filme como esse esvazia o ator,” disse ela.

Porque exige uma entrega total, a ponto da própria Binoche pedir que fosse assistida durante toda a filmagem, com medo de enlouquecer como sua personagem.

Foi escolhido o ano de1915 para o filme porque foi quando o irmão de Camille, o escritor católico famoso, Paul Claudel, vai visitá-la no hospício.

A expectativa de liberdade se desmorona para Camille, ao encontrar no irmão um muro intransponível. Ela perde toda e qualquer esperança de sair dali e se entrega a uma aceitação de seu destino, magistralmente sugerida por Binoche na cena final.

Um filme difícil de assistir mas, também recompensador, porque raras vezes veremos outra interpretação da qualidade da Camille Claudel de Juliette Binoche.

Uma atriz excepcional.

Este post tem 0 Comentários

  1. Ellaine disse:

    Excelente resenha. Despertou em mim a vontade irresistível de assistir a esse filme, pois tanto a atriz Juliette Binoche como a escultora Camile Claudel são duas artistas cuja genialidade devemos reverenciar sempre.

    • Eleonora Rosset disse:

      Ellaine querida,
      É um filme raro. A Binoche vive a trágica escultora. Não é uma mera interpretação.
      Mas a nossa sensibilidade tem que estar disponivel e a mente/ coração aberta para que a sintonia entre nós e a artista presente no filme aconteça.
      Filme pra gente grande!
      Bjs

  2. Hugo Ferreira disse:

    Olá Eleonora. Amor e ódio caminham sobre uma linha tênue e a sua análise muito bem mostra isso.Achei interessante, em meio a toda a trama, o marco temporal “1915”, aparentemente sem relevância.
    No entanto… define-se nesse ponto o marco de separação entre os projetos da Psiquiatria e da Psicanálise, apontado por Freud já em 1915, ou seja, a Psiquiatria firmando-se na busca de causas orgânicas e a Psicanálise postulando a historicidade do corpo.Muito inteligente o autor…

    • Eleonora Rosset disse:

      Helio querido,
      Essa data tb marca o ano da visita do irmão, Paul Claudel, famoso escritor católico. Ela ansiava por ele pq pensava que voltaria para a casa da familia com ele… Depois disso ela tombou na aceitação de seu destino, como vemos na última cena triste e bela…
      Filme fora do comum.
      Bjs

  3. Todo dia entro aqui, Eleonora.
    Primeiro, pra ver as resenhas, segundo, os comentários e terceiro pra ler suas respostas, sp tão cheias de sabedoria.
    Vc é um farol.

    • Elenora Rosset disse:

      Sylvia querida,
      Fiquei sem palavras… Essa imagem que vc usou é demais!
      Vc é dez e um amor de pessoa. Espero merecer a sua amizade sempre!
      Bjs

  4. Danian Dare disse:

    Eis ,aqui, um filme ideal para uma psicanalista ir ao cinema, rsrsrs…Mas, também, um filme para entendermos o processo de gerar a loucura por parte sociedade humana. Camille Claudel em sua arte já era obsessiva, pois buscava e extraia formas perfeitas. Obsessiva no amor, pois como mulher daquela época deveria se submeter totalmente ao seu homem, eles , possuidores de todos os direitos e elas , possuidores de todos os deveres. A sua loucura foi ainda mais acentuada por viver num mundo de loucos, onde a ignorância aliada a uma incrível estupidez agravava qualquer desequilíbrio, por menor que fosse. Se a própria Juliette Binoche temeu a loucura interpretanto a personagem no ambiente que recontituia um hospício, imagina a própria Claudel internada num deles. Certamente a sua loucura era um estado de lucidez num mundo de loucos numa realidade cruel. Não foi em hospícios que a nossa Nise da Silveira nos mostrou artistas????? No mais, através de sua sensível e bem explicada resenha, é possível visualizar como deve ser o filme e o desempenho da atriz. Que a psicanalista continue indo sempre ao cinema.

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