Django Livre

“Django Livre”- “Django Unchained”, Estados Unidos, 2012

Direção: Quentin Tarantino

Já na abertura, com aquela música típica de faroestes italianos dos anos 70 e os enormes letreiros vermelhos,adivinhamos que Tarantino vai se esbaldar.

O ano é 1858, dois anos antes da Guerra da Secessão que opôs o norte e o sul americanos, numa luta sangrenta, tendo como motivo de discórdia a escravidão, da qual o sul dependia por causa das grandes plantações de algodão, “plantations”, onde a mão de obra era escrava e negra.

De cara, os personagens principais se encontram. Dr King Schultz (Chistoph Waltz, dispensando adjetivos), o alemão escondido atrás de uma falsa identidade de dentista, para melhor fazer o que sabe: vender corpos. Ou seja, é um caçador de recompensas.

 Lembram daqueles cartazes: “Procurado – Vivo ou morto”? Pois é o que ele faz. Traz o morto para receber o dinheiro prometido.

E o outro é Django, que de escravo acorrentado passa a homem livre, companheiro de Schultz, que o ensina a atirar para matar.
Faz mais, devolve ao negro humilhado (Jamie Foxx, espetacular), sua auto-estima e o poder de vingar-se de quem fez mal a ele e sua mulher, de quem foi separado
à força e com crueldade.

Ele vai encontrá-la na “plantation” de Calvin Candie, o malvado interpretado com perfeição por Leonardo DiCaprio.

Como na saga dos Nibelungos cantada no “Anel” de Richard Wagner, Django é casado com Brunhilde,  que tem o mesmo nome da princesa, filha do deus Wotan, uma das Walkirias, que o pai coloca no alto de uma montanha, cercada por fogo. Uma bela adormecida que terá de ser salva por um principe corajoso. Sem medo de dragões nem de fogo. Django, claro.

O racismo é uma chaga ainda aberta em muitos lugares dos Estados Unidos e por isso Tarantino foi criticado. A palavra “nigger”, impolíticamente correta, é usada o tempo todo.

Spike Lee disse:

“- A escravidão na América não foi um “spaghetti western” de Sergio Leone.Foi um holocausto. “

Jamie Foxx respondeu:

“- Era assim que os senhores falavam na época. Reproduzir a fala não significa referendar o conceito deles.”

A Associação de Críticos Afro-Americanos acabou com a discussão, elegendo o filme como um dos melhores do ano.

A infame organização Ku Klux Kan também é alvo de piadas que expõem ao ridículo seus participantes, que também não devem ter gostado nada disso.

Mas isso é puro Tarantino. Seu humor ácido não se intimida e não poupa ninguém. E os banhos de sangue e cabeças cortadas são uma vingança na tela contra seres humanos que não merecem esse nome.

Tarantino é irreverente com tudo mas também sabe fazer o espectador se emocionar. Entre outras, as cenas finais são belíssimas e fazem lembrar de Obama e Michelle, vencedores e enamorados.

“Django Livre” não é indicado apenas para admiradores de Tarantino. O filme é tecnicamente perfeito, a câmara bem dirigida, aumenta a tensão sempre que necessário, as paisagens são muito bem usadas como momentos de respiração e os figurinos recriam a época, com toques de modernidade.

Depois de “Bastardos Inglórios” parecia que ia ser difícil acertar outra vez mas ele fez de novo. É um grande cineasta.

Este post tem 0 Comentários

  1. Sheila Tamasauskas disse:

    Assisti Django Livre no domingo passado e assim como Tarantino, me esbaldei… Muito bom esse filme, Leonardo Di Caprio cada dia mais conquistando meu erspeito e admiração como ator… Sem falar em Samuel L. Jackson, um dos melhores personagens do filme, uma pena as academias e premiações não terem lhe dado uma única indicação, mas enfim… E Waltz realmente dispensa comentários…

    • Eleonora Rosset disse:

      Sheila querida,
      Verdade! Todo mundo se esbalda com o Tarantino! E o elenco formidável mesmo! O Leonardo DiCaprio está muito bem no papel. Como vc diz, ele melhora a cada filme. E
      Christoph Waltz é o ator fetiche que dispensa comentários, Globo de Ouro de ator coadjuvante.
      Se não ganhar nada no Oscar pelo menos levou o Globo de Ouro de melhor roteiro.
      Vamos torcer por ” Django”!
      Bjs

  2. vanderlei do amaral santos disse:

    Eleonora estou muito curioso para ver esse filme,pois creio que deve ser muito bom,vc esta de parabens seus comentarios sao perfeitos.

  3. theodore disse:

    Assisti “Django livre” em Paris (não é meu costume fazer esse tipo de citação, mas percebo que os frequentadores do espaço apreciam…), e, apesar da péssima sala (alias, os parisienses não devem nunca se orgulhar de possuir bons cinemas…), é confortador saber que não é todo o planeta que se rende ao “cineasta” Tarantino. Devo com certeza parabeniza-lo quanto a fidelidade que demonstra, em toda a sua cinebiografia, ao cinema de má qualidade, como o “western spaghetti”, mas ele próprio nunca escondeu que sua “obra” é fruto de colagem, um patchwork construido a base de plagios de alguns de seus diretores favoritos, que ele pelo menos cita (é plagio mesmo, não é “homenagem”, são planos inteiros copiados, em “Django” ele não poupa nem Victor Fleming, que não era la essas coisas..), mas vamos la, um pouco de piedade: pelo menos diverte? Para quem teve adolescencia problematica, como eu, e teve seu bando de coleguinhas arruaceiros, mas um dia cresceu e se tornou “adulto”, NÃO!!! É chato, chato, chato… Mas Tarantino tem fixações puberes e nos aborrece amarrando bombinha em rabo de gato: são tantas cabeças voando, tanto sangue espirrado que ansiamos pelo tédio mal feito de Manoel de Oliveira… Os franceses detestaram (exceto um critico ou outro, afinal o jaba das produtoras hoje em dia chega a todo lugar, inclusive…), mas talvez ainda se lembrem de John Ford, desconhecido por aqui… Comentou-se a frase jocosa de Godard, quanto interrogado pelo fato de Tarantino batizar sua produtora com um nome de seu filme:…” Tarantino escolheu o titulo de meu pior filme, o que é sintomatico…”. Mas talvez eu seja um chato mesmo, que não aprecie as trevas barbaras que Tarantino anuncia com seus games, que ele produz com seus coleguinhas (é curioso notar, nas fichas técnicas de seus filmes, que ele praticamente não trabalha com mulheres, ou seja: menina não entra!!). Mas apesar disso tudo revi em Paris “Le Feu Follet”, de Louis Malle, meu Deus!!! Assistimos esse filme após Tarantino, e o efeito foi devastador: que época terrivel e triste vivemos, tão cafajeste…

  4. theodore disse:

    Gostaria de cometer uma errata com relação ao meu comentario anterior: trata-se de um “mea culpa” com relação a Tarantino e os criticos franceses que elogiaram sua “obra”, bem, na verdade as produtoras associadas a Tarantino não precisam utilizar jaba no seu promocional, pois o publico contemporaneo, em sua maioria, gosta mesmo de seus filmes, e os criticos franceses que elogiam seu trabalho gostam mesmo dele. Foi uma esperança indevida da minha parte.

    • Eleonora Rosset disse:

      Theodore,
      Respeito suas opiniões. Aliás muito bem colocadas e interessantes.
      Eu sou mais condescendente do que vc e gosto do Tarantino porque ele exerce aquela perversidade polimorfa de que falou Freud quando se referiu às crianças.
      Mas não só isso. Suas comédias ou farsas são inteligentes. Ele faz sempre uma gozação com um lado americano muito careta e conservador.
      Principalmente, ele vai contra o ” politcamente correto” que é tão chato.
      Volte sempre, colaborando para esse espaço ficar mais polêmico.
      bjs

  5. vanderlei do amaral santos disse:

    Eleonora considerando suas palavras esse filme deve ser fantastico!!Vou fazer o possivel para assistir logo que possivel..obrigado pela dica

    • Eleonora Rosset disse:

      Vanderlei querido,
      Vá mesmo! O filme é irreverente, engraçado mas muito sério, tudo ao mesmo tempo. Não dá para não admirar a irrecerência talentosa de Tarantino!
      Bjs

  6. Luiz Augusto Ferraz disse:

    Django é catártico em todos os sentidos. Vi como se olhasse uma obra de arte contemporânea, uma fotografia que se impõe, um ar moderno de clip, rápido e voraz, que até nas cenas de sangue impõe algo que vai muito além da violência, na apropriação do pastiche que tanto diz dessa vida, cidadamente falando. Saí do cinema apaziguado ante tantos contextos inteligentes, sarcasticamente bem humorados, referências da melhor qualidade, interpretações magistrais e um apuro estético que vai muito além do que normalmente se vê por aí.

    • Eleonora Rosset disse:

      Luiz Augusto querido,
      Tarantino não tem meio termo. Ou se ama ou se odeia! Eu sou, como vc,do time que gosta do jeito dele dizer as verdades e zonear com o arrumadinho. Vc falou mt bem: linguagem de clip, sangue e violência que são pastiche.
      Precisamos dele para poder rir do óbvio porque como criança adulta que ele é, sabe dizer com todas as letras que o rei está nú.
      Bjs

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