Inacreditável

“Inacreditável”- “Unbelievable”, Netflix, 2019

Direção: Lisa Cholodenko e outros

Marie Adler (Kaitlyn Dever) tinha 18 anos e uma vida difícil. Estudava e morava em um condomínio em Lynwood, Estado de Washington, ano 2008. Era a primeira vez que morava sozinha, com a ajuda de um programa do Governo. Desde os 6 anos vivera em orfanatos e vários lares com pais adotivos, nem sempre adequados. Sofrera abusos físicos e psicológicos. Seu jeito calado e arredio mostrava que ela não confiava nas pessoas e tinha razão para isso.

Uma noite, Marie já dormira, quando um homem, usando uma máscara e uma mochila, invadiu seu apartamento. Ele amarrou suas mãos com cadarços de tênis dela, colocou uma venda e mordaça. Estuprou Marie várias vezes e tirou fotos com flash. Levou os lençóis da cama quando saiu.

A polícia mandou detetives até o apartamento de Marie e ela contou o que havia acontecido. Levaram a garota para o hospital para exames e ela teve que repetir várias vezes o que tinha acontecido. Cansada, estressada e com o peso de sua história de vida, Marie se confundiu algumas vezes diante das perguntas insistentes dos dois detetives que a tratavam, não como a vítima que ela era. Sem nenhuma paciência ou cuidado, a acusavam de estar mentindo.

Marie acabou por concordar e confessar o que todos ao seu redor, inclusive a última das mães adotivas, pareciam acreditar. Todos achavam que ela inventou essa história para chamar a atenção.

Sob pressão, Marie se atrapalhara e, desconfiando de si mesma, ou não contando com nenhum apoio, acabara por confessar que poderia ter sonhado e acreditado no sonho.

Os policiais, sentindo-se agredidos e perdendo tempo que poderia ser usado para ajudar vítimas reais, a acusaram do crime de denúncia falsa. Ela teve que pagar U$500,00 pelo custo do processo, passar por aconselhamento psicológico obrigatório e ficar em condicional, com várias restrições de horários e proibições diversas.

Ficamos divididos entre a revolta que sentimos pelo jeito com que trataram Marie e surpresos quando ela admite que pode ter mentido. Mas por que mentiria? Afinal, todos ficaram sabendo do ocorrido e os colegas da escola passaram a evitá-la. Ela se fechou ainda mais e sofreu com isso. Estava sozinha, mais insegura do que nunca. Pensou até em suicídio.

Passados alguns anos, em 2011, em Golden, Estado do Colorado, uma detetive, Karen Duvall (Merritt Wever) é chamada para investigar um caso de estupro de uma estudante em seu apartamento por um homem mascarado, que ficou abusando dela várias vezes, tirou fotos com flash e mandou ela tomar banho e limpar bem o apartamento. Levou consigo os lençóis.

O marido da detetive, também policial, contou que um caso muito semelhante ocorrera em Westminter, cidade vizinha. Foi então que a detetive Karen conheceu a também detetive Grace Rasmussen, interpretada por Toni Colette. As duas trocam informações e encontram quatro casos parecidos com o ocorrido em Golden.

A diferença de tratamento que as vítimas desses estupros receberam é flagrante. As detetives mulheres se identificaram com essas mulheres traumatizadas e foram delicadas e atenciosas quando as interrogaram. As duas detetives agiram de maneira muito diferente da dos policiais que tinham encurralado a garota de 18 anos em 2008, que sofrera nas mãos do seu agressor e nas dos detetives homens que a induziram a dizer que mentira.

O fato é que o caso do estuprador em série, baseado em fatos reais (todos os nomes dos envolvidos foram trocados) foi levado até o fim pelas detetives que se dedicaram inteiramente a essa investigação com tudo que foram descobrindo e suportando a grande tensão envolvida no caso.

Fica a pergunta de por que os policiais do primeiro caso foram tão desastrados e omissos. Pediram desculpas e ficaram surpresos quando apareceu a prova de que Marie fora vítima do mesmo homem que as detetives prenderam.

A ação machista e preconceituosa do primeiro caso entra em contraste com a emoção que sentimos quando Marie Adler telefona para Karen Duvall para agradecer. Ela diz que por causa do acontecido, voltou a confiar que existem pessoas de bem e a ter esperança na justiça. Sentiu-se acolhida e aliviada. Ela não mentira.

A série “Inacreditável” tem 8 capítulos, atuações perfeitas e o roteiro bem escrito mantém o suspense, tratando de um assunto sério e que interessa à causa feminina no mundo inteiro

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