O Abismo Prateado

“O Abismo Prateado”- Brasil, 2011

Direção: Karim Aino

O mar à noite, ressoa em toda a sua imensidão prata e negra, quebrando em espuma de ondas brancas numa praia vazia.

Um homem solitário mergulha naquelas águas, depois olha à sua volta como se procurasse algo. Torso nu, só de sunga, atravessa, como um fantasma, as ruas de uma Copacabana iluminada pelos faróis dos carros, no trânsito pesado.

Depois, uma transa em “close”, o corpo dela sobre o dele, mas sentimos que ali não é tanto o tesão quanto a angústia, que ele trouxe com ele, que assume o comando. Vem o gozo mas não a paz para ele.

E na manhã seguinte, ela se prepara para o trabalho alheia ao que está acontecendo com ele, que se deixa rolar na cama, como se não tivesse descansado naquela noite.

“- Acorda, vai, amor. Vem tomar café com a gente. Que horas é o seu voo?”

E ele respira no escuro, buscando ar.

Quando o filho adolescente vem até o banheiro se despedir do pai, ele ensaia palavras:

“- Deixa eu falar com você…” diz puxando o filho pelo braço.

“- Você tá molhado pai”, responde o garoto se esquivando, “boa viagem.”

Está claro que nada vai bem para esse homem.

E Violeta, a bela e eficiente dentista, mulher dele, vai levar um susto durante o dia. Não com o tombo de bicicleta logo cedo mas com a mensagem que seu marido deixou gravada no celular dela.

Pequeno, delicado, enternecedor. Assim é “O Abismo Prateado”, filme dirigido por Karim Ainouz e roteirizado pelo diretor e Beatriz Bracher.

Inspirado na canção “Olhos nos Olhos” de Chico Buarque, que todo mundo conhece, conta um abandono sofrido por uma mulher.

Alessandra Negrini, atriz esplêndida, brilha no filme que é dela. E seguimos seu percurso dolorido, enquanto ela lava e faz curativos nas feridas de seu corpo por causa dos tombos que levou naquele dia, sabendo que as feridas do coração estão abertas e sangram à sua revelia.

Como é difícil passar pela rejeição… O chão falta, a dor é surda, o choro não ajuda.

Ela anda a esmo pela cidade com um olhar escuro. Nada a conforta, até que encontra outros seres humanos abandonados (Gabi Pereira e Thiago Martins) e descobre que há muitos caminhos pela vida que valem a pena ser trilhados. Entendendo isso, a ferida no coração de Violeta começa a cicatrizar. E ela termina esse dia tomando um sorvete enquanto o sol nasce em Copacabana.

Procure essa memória afetiva dentro de você e vá recordá-la nesse filme lindo.

Este post tem 0 Comentários

  1. newde caruso disse:

    “Procure essa memória afetiva dentro de você e vá recordá-la nesse filme lindo.”

    Será que vou me emocionar com o filme o tanto que me emocionei com essa sua frase?

    • Eleonora Rosset disse:

      Newde querida,
      Que bom que eu te emocionei. Eu tb me emocionei com o filme que me inspirou a frase! Bjs e volte sempre!

  2. Erandy albernaz disse:

    Cada dia gosto mais das suas resenhas, sua escrita elegante e lírica é sua cara.
    bjo, já ficou boa de vez?

    • Eleonora Rosset disse:

      Erandy minha amiga,
      Fiquei boa sim! Deu trabalho mas estou nova em folha, quer dizer, quase rsrsrs
      Meu marido quis me tirar de SP e estamos em Veneza, embarcando hoje para a Croácia!
      Mas adorei ler a sua crítica sb o meu estilo. Devo dizer que tem filmes que são inspiradores!
      Bjs

      • Erandy albernaz disse:

        A Croácia é onde ficava Dubrovinick, não é?
        Ficava não, fica, A Yugoslávia é que acabou, rsrsrsrsr
        A cidade mais linda da Europa, a meu ver
        Não sei o que ficou de pé, depois vc me conta.
        bjo

  3. Yra doce disse:

    Dói até hoje lembrar…

    O menino,,,o pai,,,eu… 17anos de casados.

    Hoje…26 anos depois…eu…ele…

    Quem era para ter ido,,,voltou.

    Quem não era para ir,,,partiu de vez.

    Dor que não tem espaço…

    Travo.

  4. Eleonora Rosset disse:

    Yra querida,
    Que tragédia vcs viveram… Só posso desejar que vc tenha forças para viver momentos felizes…
    Bjs carinhosos

  5. Jordan Henrique Trindade Costa disse:

    Prezada Dra. Eleonora,

    Se permite-me, gostaria de voltar um pouco no tempo, no post de 29/11/2012, sobre o final do filme “As palavras”, que só agora tive a oportunidade e o prazer de assistí-lo, e que até agora, após uma semana de pesquisa, ainda não consegui entender o que de fato o os roteiristas e diretores estreantes Brian Klugman e Lee Sternthal tentaram passar com o final pouco expressivo, se comparado com o conteúdo muito bom do filme.

    Quando você comentou sobre esta possibilidade:
    “Quantos escritores de verdade existem nesse filme? São três, dois ou um só que imaginou tudo isso?”

    Ora, se no final do filme, aparece a imagem da esposa do escritor Rory Jansen(2º escritor) nas lembranças do Clay(3º escritor) que faz a narrativa de uma suposta biografia do escritor Rory Jansen, então o Clay seria o próprio Rory envelhecido usando um pseudônimo?
    Pensei nesta possibilidade, mas por outro lado, que escritor famoso faria uma loucura dessas renegando o seu próprio nome para ficar em paz com consciência?
    MUUUUITO CONFUSO!