O Último Amor de Mr Morgan

“O Último Amor de Mr Morgan”- “Mr Morgan’s Last Love” Bélgica/Alemanha/França/Estados Unidos, 2013

Direção: Sandra Nettelbeck

 É a vida. Num casal, um morre primeiro. O que fica precisa inventar uma nova história. E, às vêzes, é difícil conseguir.

Mr Morgan (Michael Caine, brilhante), ex-professor de filosofia em Princeton, mora há 30 anos em Paris e não fala uma palavra de francês. Para quê? Era sua mulher que falava por ele e traduzia.

Quando ela morre, parece que a vida acabou para ele. Arrasta os pés pelo amplo apartamento, com os ombros caidos, barba, olhos baixos. Não abre as cortinas. Não atende ao telefone.

Pilhas de jornais na entrada do apartamento mostram como ele não se interessa por mais nada. A faxineira vem, faz a limpeza e o almoço mas ele mal a vê.

O luto é tão desesperador que Mr Morgan, num dia pior do que os outros, vai até o banheiro e esvazia um vidro de comprimidos na boca. Cospe todos a tempo, quando se dá conta do que está fazendo.

Olha-se no espelho do banheiro e parece não reconhecer-se na pessoa que se tornou.

Visita a mulher no cemitério. Está desolado. Andando pela rua, ainda sente a mão dela segurando a sua.

Mr Morgan tem dois filhos que moram nos Estados Unidos e netos. Mas nunca se interessou de verdade por eles. A vida com sua mulher lhe bastava. Por isso mudaram para Paris. Para viver a dois.

Mas nossos planos não levam em conta as mudanças que a vida traz, sem nos consultar. É disso que sofre Mr Morgan, que está perdido.

Até que um dia, vendo sua atrapalhação, ela o ajuda no ônibus. Ele, longe de ser agradecido, quer se livrar dessa presença incômoda:

“… agora só me faltava essa escoteira que me aparece…” pensa aflito.

Mas ela o acompanha até o prédio dele e se apresenta. É jovem, bonita, professora de dança e se chama Pauline (Clémence Poésy). E ele lembra o pai dela, falecido há pouco.

“- Venha um dia me visitar na escola!”

Bem que ele tenta tirar a moça da cabeça. Pensa inciar uma coleção de selos, mas descobre que isso também é trabalho de uma vida.

Vai aos almoços com Colette (Gillian Anderson), uma amiga francesa de meia idade, que treina seu inglês com ele. Mas Mr Morgan está distraído, enfeitiçado, só tem Pauline em seus pensamentos.

E, um belo dia, toma coragem e pega aquele ônibus. E a revê.

Até a cidade revive. E contemplamos a Notre Dame das margens do Sena, os parques no outono, as ruas cheias de gente apressada. E as aulas de cha cha cha passam a ser o centro da vida de Mr Morgan.

Sem a barba, remoçado, ele vai inventar novas histórias com Pauline, que tem menos que a metade da idade dele. Será uma relação especial para os dois.

A diretora alemã Sandra Nettelbeck, 48 anos e dois filmes (“Simplesmente Martha”2001, “As Faces de Helen”2009), baseou-se no livro de Françoise Dorner, “La Douceur Assassine” e escolheu bem seus atores. Michael Caine e Clémence Poésy fazem um par sensível e afinado, que merece ser visto.

 

 

Este post tem 0 Comentários

  1. Andei pensando no sentido da palavra francesa ”Assassine” fazendo par com “Douceur”, do título do livro de (Françoise Dorner) que originou o filme. Se ‘doçura’(suave) refere-se à relação da parceira que se foi, vou encorporar qualquer filósofo (existencialista) que traduziria assim: excesso de açúcar – aqui como dependência absoluta ao outro – ‘mela’ ou pode desandar. O filme ‘fala’ disso tbém, não, Eleonora?! Não importa, pois o filme é pacientemente emocionante e contagiante. Tanto para quem quer retomar Vida ou precisa se despedir dela. Todos os ingredientes dessa iguaria estão na dosagem certa. Nada melancólico; ao contrário, estimulante. Só o Michael Cain valeria o filme, mas este tem muito mais história do que sua performance.

    • Eleonora Rosset disse:

      Wilson,
      A ” Doçura Assasina” acho que é referência ao luto, à doce lembrança da mulher que morreu e alimenta pensamentos suicidas. Sabemos que ódio tem mt a ver com o luto e qdo o ódio se volta contra si mesmo… E então ele encontra ela e… Volta a viver!
      O filme se resume a poucas palavras mas a história tem delicadeza e luta.
      Bjs

  2. Anna Gabriela R. Gross disse:

    Prezada Eleonora,
    Não nos conhecemos e não sei como você veio parar no meu face.
    Mas quero lhe agradecer muitíssimo a indicação do filme O último amor de Mr. Morgan. Acabamos de vê-lo e gostamos muito. Extremamente sensível, delicado, sem ser piegas.
    Algo que ou já passamos, ou temos que nos preparar para isto. Estimulante.
    Um abraço e continue recomendando.

    • Eleonora Rosset disse:

      Anna querida,
      Que bom então esse encontro inesperado! Gostei muito de vc compartilhar comigo o gosto pelo bom cinema.
      Leia minhas resenhas e volte aqui para comentar comigo!
      Bjs

  3. Anna A Schvartzman disse:

    Eleonora querida,

    gosto sempre de ler os seus comentários depois de ter visto o filme.
    Hoje resolvi ler sobre esse filme que me comoveu muito,pelo tema e pela superba interpretação do Michael Caine.
    Foi como rever o filme.Muito bom como sempre suas observações.
    abrs

    Anna
    Anna

  4. SylviaManzano disse:

    O filme estava proposto na minha página no Face e aquela cena da moça dançando no filme, me fez querer ver o resto.
    A música “Walking Back to my baby”, country de Nashville e o modo como a moça dança, entraram em mim de uma forma inusitada.
    Dormi e acordei pensando na música, pesquisei, achei e dancei.
    Há quanto tempo eu não dançava.
    Esse filme me deu muita saudade de Paris, que eu conhecia como a palma da minha mão na saída da adolescência para a juventude.
    Não.
    Nunca fui a Paris, mas lia e estava sempre tomando café e fumando no Café de Flore.
    E sp foi muito difícil sair da ficção e cair na realidade: Brasil, um país tropical.
    Foi tão gratificante ver a moça do filme, Clèmence Poésy (pesquisei) dançar.
    Sem alarde, corpo e alma dançavam e, estranhamente (para o Brasil atual) era como se a moça não tivesse bunda e, de repente, eu tb estava “walking back” para casa .
    O filme é o triunfo da subjetividade e percebo como estava com saudade disso.
    Até me permiti falar do filme-em-mim e não do filme-em-si e não vou pedir desculpa, pq a Eleonora já me avisou muitas vezes, que esse espaço é meu tb, essa parte dos “comentários”.

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