Sniper Americano

“Sniper Americano”- “American Sniper”, Estados Unidos, 2014

Direção: Clint Eastwood

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Na mesa do almoço, dois meninos apreensivos, aguardam a fala do pai. O cinto dele está sobre a mesa e o ambiente é tenso. O menor está com um olho roxo e sabemos que o irmão mais velho entrou numa briga para defender o menor:

“- Na vida, existem pessoas que são lobos, agressivos por natureza, que tem que ser eliminados. Há as ovelhas e os cães pastores que as protegem. Vocês precisam entender que o seu dever é defender os nossos. Não admito que vocês não sejam cães pastores. Você acabou com ele Chris?”

“- Yes, sir.”

Depois vemos o menino com o pai, aproximando-se do seu primeiro troféu. O animal foi abatido com um só tiro. O pai o encoraja e se orgulha dele.

Não é de se admirar que esse menino tenha se tornado o maior matador individual da história militar dos Estados Unidos. Tinha no sangue a agressividade do pai e foi estimulado desde criança a matar. Ao contrário do que desejava o pai, Chris Kyle (Bradley Cooper) era um lobo.

Acompanhando sua história, no filme inspirado em seu livro de memórias, vemos que até foi difícil atirar em sua primeira criança mas durante seus 1.000 dias de guerra ele tornou-se um viciado em matar. Para Chris, ter o tiro certeiro do melhor atirador de elite, era um triunfo sem o qual não podia mais viver.

A guerra foi uma boa desculpa para ele soltar o bicho que morava dentro dele. O psiquiatra que o atende em sua volta, pergunta:

“- Você matou 160 pessoas. E voltou quatro vezes para a guerra. Agora quase matou o cachorro que brincava com o seu filho… Isso não o preocupa?”

Ele, que era amoroso com Taya (ótima Sienna Miller), a garota que ele escolhera para se casar, foi ficando cada vez mais distante, mais frio e duro:

“- Eu queria que você voltasse a ser humano!”, implora Taya, estranhando o jeito dele com ela e os filhos.

Mas, sentado na frente da TV desligada, Chris assiste a seu programa favorito. Os sons e as imagens da guerra, seu cenário ideal, estão instalados para sempre em sua mente psicótica. Só no meio da batalha ele se sente vivo, fazendo o que mais gosta. E isso foi também a sua perdição.

Clint Eastwood, 84 anos, ganhador de dois Oscars de melhor filme com “Os Imperdoáveis” e “Menina de Ouro”, volta a ocupar a imprensa americana, desde que seu último filme, lançado na temporada do Oscar, ganhou 6 indicações: melhor filme, ator (Bradley Cooper), roteiro adaptado, montagem, edição de som e mixagem de som.

Quer se goste ou não das posições políticas de Clint Eastwood, uma coisa é certa. Ele sabe como atingir o emocional das pessoas. “Sniper Americano” é um filme que faz com que se pense em como a guerra afeta de modo terrível a mente de certos indivíduos, além de matar e ferir outros tantos. E mais, como lidar com os que voltam estropiados no corpo e na alma?

Selma – Uma Luta pela Igualdade

“Selma – Uma Luta pela Igualdade”- “Selma”, Estados Unidos, 2014

Direção: Ava DuVernay

Enquanto ocorriam os episódios que esse filme conta, sobre a luta pela reinvidicação ao voto dos negros americanos, no sul dos Estados Unidos, nós brasileiros, brancos e negros, não podíamos votar por causa do golpe militar de 1964. Depois de 20 anos, esse direto nos foi devolvido pelo empenho que a sociedade mostrou, querendo democracia. Mas ainda existem países no mundo que anseiam por maior participação política.

Assim, “Selma” traz à tona um tema que ainda preocupa muita gente mundo afora ou seja, a negação de seus direitos civis, o que inclui escolher seus representantes numa democracia.

E o que o filme também põe em relevo é a persistência, o destemor, a vontade férrea daquele grupo de pessoas na cidade de Selma, Alabama, que consegue atrair a simpatia de outros cidadãos americanos, que se juntaram a eles e protestaram pelo direito dos negros votarem, mesmo não sendo negros, porque esse é o fundamento da democracia, que garante ao cidadão a escolha de seus representantes para reger os destinos de uma nação.

Tratava-se de salientar a posição de que é o voto que legitima um governo democrático. Não precisa ser obrigatório, como muitos ainda pensam, mas há que ser um direito para aqueles que quiserem exercê-lo.

O filme centra a história em Martin Luther King e a marcha pelos direitos civis em Selma em 1965. O ator David Oyelowo faz o conhecido líder dos negros e prêmio Nobel da Paz com muita força e foi indicado ao Globo de Ouro de melhor ator. A canção “Glory”  foi colocada na lista das melhores do ano do Oscar.

Oprah Winfrey, sem a qual o filme não teria existido, produz e atua de forma emocionante. Sua cena como a ativista Annie Cooper, entregando o documento que a capacitaria ao voto, é uma das melhores coisas do filme. Salienta a forma perversa como, mesmo estando na lei, o direito ao voto pelos negros era negado, sem complacência e com desrespeito.

A direção e o roteiro de “Selma” são de Ava DuVernay, que se sai muito bem nas duas tarefas e consegue emocionar e até revoltar aqueles da plateia que tenham se esquecido de como foi sangrenta essa batalha.

Aliás, o tema dos direito civis dos negros, está atualmente nas manchetes dos Estados Unidos por causa da morte dos jovens Eric Garner e Michael Brown pela violência policial. E, mostrando seu repúdio, o elenco de “Selma” vestiu no lançamento do filme uma camiseta onde se podia ler as últimas palavras de Eric Garner antes de morrer nas mãos de um policial, em junho do ano passado: ”I can’t breathe”.

Essa é uma luta que parece que ainda não acabou.

E pensar que, debaixo da pele que vemos, somos todos iguais…