12 Anos de Escravidão

“12 Anos de Escravidão”- “12 Years a Slave”, Reino Unido, 2013

Direção: Steve McQueen

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Na tela, homens negros, pobremente vestidos, nos olham num misto de medo, raiva e censura. Dentre eles,  Salomon Northup. Ele era um homem livre que vivia em Saratoga, Nova York, em 1841, com mulher e filhos e foi sequestrado por gente sem moral mas com muita ambição e vendido como escravo para trabalhar na lavoura. Através de “flash backs”, começamos a conhecer sua história, que é real.

Ele tocava violino e essa foi a sua desgraça, pois valia mais, num mercado que pedia negros saudáveis, que, se tivessem algum talento, tanto melhor para os seus senhores.

Os malfeitores que o enganaram, o embriagam e, à custa de surras num porão imundo, Salomon é obrigado a abrir mão de sua identidade verdadeira para tornar-se um negro fugido, recapturado para ser vendido para os donos das plantações de cana e algodão no sul do país.

Logo, ele entendeu que o matariam se negasse ser um escravo. Mas sua mente consegue cicatrizar essas feridas e não o deixa esquecer-se de quem ele é. Por 12 anos Salomon Northup serviu como escravo, até libertar-se e contar sua história em um livro.

O filme é uma adaptação desse livro, feita por John Ridley, indicado ao Oscar, e que nos envolve com a vida de Salomon, vivido com intensidade por Chivetel Ejiofor,  britânico, que ganhou o Bafta inglês, também indicado ao Oscar, como melhor ator.

Michael Fassbender, outra indicação ao Oscar de coadjuvante, interpreta com nuances bem trabalhadas, um fazendeiro alcoólatra e perverso. Esse homem doentio e atormentado por culpa, tem uma paixão pela bela negra Patsey, na pele da talentosa atriz nigeriana Lupita Nyong’o, mais uma do elenco com indicação ao Oscar de atriz coadjuvante.

São cenas de cortar o coração e indignar nosso senso de humanidade, que percebe nesses negros maltratados, irmãos de outra cor, como diz o personagem de Brad Pitt, numa ponta.

“12 Anos de Escravidão”, do diretor inglês, 44 anos e negro, Steve McQueen ( “Shame” 2011), parece ser o primeiro filme a mostrar profundamente o horror da escravidão, sem medo de descortinar um cenário de horrores e injustiças.

McQueen é um conhecido ativista pelos direitos civis dos negros e seu filme é um libelo chocante que homenageia um homem negro que, conseguindo se libertar de 12 anos de escravidão ilegal, colocou sua pena a serviço da libertação de todos os negros dos Estados Unidos, o que aconteceu em 1865.

Nove indicações ao Oscar, inclusive melhor filme e melhor diretor, coroaram “12 anos de Escravidão”, que ganhou o Globo de Ouro de melhor filme/drama e o Bafta de melhor filme e ator.

Mesmo se não ganhasse prêmio nenhum, o filme serviu para mostrar a atrocidade da escravidão, baseada na crença da superioridade de alguns seres humanos sobre os outros. Uma falsidade repugnante.

Her (Ela)

“Ela”- “Her”, Estados Unidos, 2013

Direção: Spike Jonze

Ele escreve cartas para quem não sabe fazer isso. E tão bem, tanto para homens quanto para mulheres, que um colega de trabalho brinca:

“- Você deve ser um pouco homem e um pouco mulher! Senão como poderia escrever cartas tão sensíveis?”

É verdade. Mas também é verdade que Theodore Twombly está claramente deprimido. Está se separando da mulher (Rooney Mara) e não está fácil para ele.

Percebe-se pelo seu rosto expressivo (Joaquin Phoenix está incrível e foi indicado para o Oscar de melhor ator) que ele sofre, que está vivendo mal a solidão, que pensa na ex e se culpa pela destruição da relação mas não tem com quem desabafar.

Até tenta um “sex chat” mas não dá certo.

Vai conversar com o casal que vive no mesmo prédio que ele mas eles também estão se separando. A mulher do casal, Amy (Amy Adams), é quem quer desabafar e ele escuta porque é um ser humano compassivo.

Tudo vai mal, até que ele escuta a voz dela.

Theodore comprou um novo sistema operacional que promete um amigo/a. Uma entidade intuitiva que escuta, entende e conhece a pessoa que utiliza essa forma de inteligência artificial, que é mais do que você imagina. “É uma consciência” diz a publicidade.

Assim, Samantha (Scarlet Johansson, invisível e bela) a voz amiga dele, vem preencher um espaço vazio. E torna-se o centro da vida de Theodore.

Virtual mas sensível e muito inteligente, ela é mais do que uma secretária que organiza e-mails e limpa o computador dele de tudo que é inútil. Samantha é uma companheira divertida, bem humorada, falante, que levanta a moral de Theodore. Ela cresce com as experiências que vive com ele. Ela é a personificação de um sistema operacional do futuro e interage com Theodore de uma forma íntima, calorosa e bem humana. Só lhe falta um corpo.

Claro, ele se apaixona por ela e vice versa. Ele a leva no bolso para que o olho da máquina possa ver o mundo dele e trocar idéias o dia todo. Já não consegue viver sem ela.

Spike Jonze dirigiu e escreveu o roteiro de “Ela”, premiado com o Globo de Ouro e indicado ao Oscar de melhor roteiro original.

O filme pode ser visto como uma fábula, com um toque de ficção científica, numa Los Angeles do futuro (filmado em Shangai), sobre a solidão, o sentimento de perda, a busca pelo amor. Será que um ser humano se apaixonaria realmente por uma voz/consciência, um ser incorpóreo?

Spike Jonze acena com um cenário futurista mas mostra que as necessidades básicas do ser humano permanecem as mesmas. Theodore busca um amor que o faça esquecer a ex. Um luto tem que ser trabalhado e Samantha o ajuda. Mostra que vale a pena viver e amar novamente.

Em um pensamento de psicanalista, poderia dizer que Samantha é o lado acolhedor de Theodore que ele usa para os outros, nas cartas que escreve tão bem mas que não sabe utilizar consigo mesmo.

E soa cabível, o entrevistador perguntar para Theodore, antes de dar Samantha para ele:

“- Como você descreveria o relacionamento com sua mãe?”

“Ela” é um filme doce, amoroso,romântico. Comove. Foi indicado entre os nove filmes melhores do ano para o Oscar.