Os Filhos da Meia Noite

“Os Filhos da Meia Noite”- "Midnight's Children”, Reino Unido/Canadá, 2012

Direção: Deepa Mehta

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A India é um país diferente. Apaixonante para alguns, estranho para outros.

“Os Filhos da Meia Noite” é um filme para quem já adora a India e também para aqueles que tem curiosidade pelo país, sua história e seu povo.

O filme foi baseado no livro do mesmo nome, do escritor indiano Salman Rushdie, 66 anos, que nasceu na Cashemira e que foi responsável pelo roteiro e pela narração do filme.

Rushdie escreveu “Os Filhos da Meia Noite” em 1981, seu segundo romance, que ganhou o Booker Prize. Seu quarto livro, “Versos Satânicos”, 1988, foi centro de controvérsias e valeu ao autor uma sentença de morte, decretada pelo Ayatollah Khomeini em 1989, já que muitos muçulmanos se ofenderam com o livro. Desde então, Rushdie mudou-se para o Ocidente.

O filme foi dirigido pela indiana Deepa Mehta, 63 anos, radicada no Canadá, que assinou a direção de dois filmes indicados ao Oscar de melhor filme estrangeiro, “Terra”, 1998 e “Água”, 2005.

“- Era uma vez o meu nascimento em Bombaim, no momento em que a India encontra sua independência. Mas minha vida começou trinta anos antes de eu nascer, na Cashemira”, conta o narrador Saleem Sinai (Sathya Bhabba), no início do filme, na voz de Salman Rushdie.

“Os Filhos da Meia Noite” começa em 1917, quando o médico formado na Europa, Aadam Aziz (Rajat Kapoor) se casa e tem três filhas.

Anos depois, uma delas, Amina, está grávida e mora em Bombaim, hoje Mumbai, com o marido. Na hora do parto, ela está na mesma maternidade que Vanita, uma pobre artista de rua. As duas dão a luz a dois meninos, no exato momento em que a India se liberta da Inglaterra, na meia noite de 15 de agosto de 1947.

Só que a enfermeira do berçário (Seema Biswas), resolve trocar os bebês, influenciada pelas idéias de um amigo revolucionário:

“- Que os ricos sejam pobres, que os pobres sejam ricos.”

Assim, Saleem que era filho da pobre Vanita, vai parar nos braços de Amina, a rica filha do médico Aziz e o outro bebê, Shiva, filho verdadeiro de Amina, vai ser criado pelo artista pobre que pensa ser seu pai, já que Vanita morre ao dar a luz.

Salman Rushdie se serve da história dos dois meninos para falar da guerra entre India e Paquistão, que massacrou tanto indús, quanto muçulmanos, estes obrigados a sair de suas terras, numa equivocada partilha da India feita pelos ingleses ao decretar a independência da India, que em 1971 resultou na criação de Bangladesh, e na nunca terminada crise entre o Paquistão e a India.

E um elemento de realismo fantástico enriquece a narrativa, já que as crianças nascidas na data da independência, chamados de “Os Filhos da Meia Noite”, tem poderes mágicos. Uma metáfora de esperança que faz alusão à India como uma terra antiga, onde os deuses milenares do quotidiano são reverenciados.

Paisagens belissimas, cores deslumbrantes e uma trilha sonora que usa música indiana e ocidental, acompanham a narração dessa saga.

Se você for daqueles que gosta do exótico e da magia peculiares à India, não perca esse filme.

Jovem e Bela

“Jovem e Bela”- “Jeune et Jolie”, França, 2013

Direção: François Ozon

A sexualidade de uma linda garota, Isabelle (na pele da ótima Marine Vacth, 23 anos), é o centro das atenções no novo filme do diretor e roteirista François Ozon, que faz muitas perguntas, nos envolve sempre em seus mistérios e nos deixa pensando em questões abertas e impactantes. Ele intriga o público para que as pessoas saiam do cinema levando o filme na cabeça.

O mundo de Isabelle é desconcertante. Seu corpo bonito, seu jeito sensual, os olhares de admiração que a seguem, convivem com uma adolescente que acabou de fazer 17 anos e que parece fria porque não expressa seus sentimentos. Ela é distante e reservada. Mas há lampejos certos de infelicidade em seu olhar.

Conhecemos Isabelle no verão, na praia com seu biquini estampado. Olha para os lados e tira a parte de cima. Um binóculo segue todos os seus movimentos.

Ela se exibe e gosta disso.

Chega o irmão (Fantin Ravat), garoto de uns 12 anos, a pessoa com quem ela tem mais proximidade. E Isabelle escolhe um garoto alemão, alto e louro, para perder sua virgindade.

Parece que a experiência só serve para libertá-la para uma outra vida. Desdobrada, como se num espelho, ela assiste a tudo que se passa consigo mesma, de pé, na praia e vestida. Distante de si mesma.

Voltando a Paris, retoma a escola e começa a se prostituir em segredo.

Por que Isabelle faz isso?

Seus parceiros, que a escolhem na internet, são homens mais velhos, que nem sempre a tratam com delicadeza como Georges (Johan Leysen), que se torna seu cliente preferido.

Ela não precisa do dinheiro que ganha e guarda numa bolsinha escondida no armário. A mãe (Géraldine Pailhas) e o padrasto (Frédéric Pierrot) dão a ela tudo que precisa. Portanto, o dinheiro só pode ter outro significado.

Aos poucos, vai se delineando a figura de um pai distante, que manda dinheiro para ela no Natal e no aniversário. Ela cobra 300 euros dos homens com quem faz programa. É dessa forma que ela conhece o seu valor?

Então é por causa do pai que tudo isso acontece com Isabelle?

Pode ser. Mas tem mais. É sempre com a blusa cinza de seda, que roubou da mãe, que ela sai para as noites de sexo pago. A mãe tem uma sexualidade adulta e livre. Mas não conversa com Isabelle. É afetiva mas a intimidade entre elas não existe.

Ao longo das quatro estações do ano e ao som das canções de Françoise Hardy, vamos acompanhar Isabelle em sua vida dupla. A câmera percorre seu corpo esguio, desvendando, com certo pudor, a dança que ela executa nas camas dos hotéis, aparentemente muito pouco envolvida com esses homens que a desejam. Mas ela gosta disso.

Exibir-se e fazer sexo é mais fácil para Isabelle do que sentir seus próprios sentimentos. Tem medo disso.

É preciso que aconteça uma tragédia para Isabelle parar para pensar.

E uma conversa com uma mulher mais velha, vivida por Charlotte Rampling (musa de Ozon), parece que a redime desse jeito “Belle de Jour” de ser.

Será?