O Futuro

“O Futuro”- “The Future”, Estados Unidos/ Alemanha 2011

Direção: Miranda July

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Esse é um filme singular. Dirigido, roteirizado e interpretado por Miranda July, é o segundo longa dela, obra de uma “videomaker”, isto é, alguém que é mais uma artista plástica (ela também é escultora e faz instalações) do que uma diretora de cinema.

“O Futuro” trata de muitos temas, todos ligados à angústia de ser, de existir. São vivências de um casal jovem, que mora em Los Angeles e os dois parecem não saber que pertencem à humanidade, que sempre teve que lidar com os mesmos assuntos com que eles se debatem, só que com outras roupagens.

Sophie (Miranda July) e Jason (Hamish Linklater) beiram os 35 anos e fazem de tudo para não se mexer, não fazer escolhas, não desperdiçar o futuro para o qual se preparam, deixando o tempo passar e só fazendo o básico. Mas não são preguiçosos, estão paralisados pelo medo da inadequação e pela angústia de não saber o que acham que devem saber.

Na verdade idealizam a vida para não pensar na morte que os assusta.

Quando começa o filme, eles decidem que estão preparados para um grande passo: a adoção de um gato. Mas não qualquer um. Vão adotar Paw Paw, o Patinhas, que tem seis meses de vida porque sofre de insuficiência renal.

Miranda July, que escreve o roteiro, também faz o gato, um marionete do qual vemos em “close” as duas patas, uma embrulhada em gaze, curativo necessário para as injeções na veia diárias. Com uma vozinha infantil, Miranda diz as falas de Patinhas, que é o único personagem do filme que assume sem medo suas próprias carências e está encantado porque, pela primeira vez, ele que era um gato sem dono, vai ser cuidado e amado, vai pertencer àquele casal que o escolheu e que vai lhe dar uma vida feliz.

Ficamos penalizados com essa parte dissociada de Sophie e Jason que quer pertencer, ser amada e não tem medo de expressar sentimentos. Deduzimos que Patinhas é um lado dessa geração de Miranda July que só pode viver um sonho de futuro. De certa forma, idêntico ao que vive o casal Sophie/Jason. Só que Patinhas fala o que eles não dizem.

E as perguntas afloram. Quanto tempo demora para o futuro chegar? Quem não vive o presente vai ter futuro? Quem sabe o dia que o futuro vai chegar? O futuro existe?

Os sentimentos que jorram da gaiolinha onde está Patinhas, são censurados no casal que tem medo de assumir responsabilidades e não poder fazer o que pensam que realmente fará sentido em suas vidas, mas que ainda não sabem o que é. Perdem-se rejeitando as vidas alternativas possíveis, buscando os sinais que os levarão à vida certa. Puro auto-engano.

Dessa forma, condenados a sentimentos opacos, são sombra do que poderiam ser, presos na armadilha de não viver para não sofrer.

Pobre Patinhas, pobres Sophie e Jason.

“O Futuro”, que tem um ritmo lento proposital, precisa que a plateia abra seu coração para aprender a lição que a ruiva de olhos azuis e pele muito branca tem para ensinar: corram porque o futuro já chegou!

Depois de Maio

Depois de Maio”- “Après Mai”, França 2012

Direção: Olivier Assayas

Assim que o filme começa, somos avisados que estamos em 1971, “não longe de Paris”.

Em uma sala de aula, vemos um professor ler para sua classe de jovens de 16, 17 anos:

“Nada existe além da vida, que é a coisa mais frágil.”

Esses jovens, que ainda eram crianças em 68, quando aconteceu em Paris uma mobilização da juventude como nunca antes se vira, também vão ter seus choques com a polícia, em cenas onde existe um corpo a corpo violento, jovens e policiais se enfrentando para valer, porrete na mão, em meio à fumaça das bombas, sirenes, balas de borracha e correria.

Gilles (Clément Metayer) está lá, com seu grupo do liceu e parece que concretizam o que toda juventude exercita: a ideia de mudar o mundo e rebelar-se contra o “status quo”.

Mas claro que o amor e o sexo convivem mão na mão com a política.

E Gilles encontra Laure (Carole Combs) em meio a árvores verdejantes de um bosque de verão, ela de vestido branco comprido de rendas, ele com uma camiseta colorida, pintada a mão.

Mas é uma despedida. Ela conta que vai para Londres com a família, mas que vai escrever para ele:

“- Você tem outro?” pergunta Gilles.

“- Não sei. Pode ser. Tenho que pensar. Mas não quero te perder.”

Para Gilles resta outra alternativa. Voltar seus olhos para sua colega Christine (Lola Créton) que também gosta de cinema como ele e é menos complicada do que Laure.

O ativismo dos garotos do grupo de Gilles é a pichação com palavras de ordem e a confecção de um jornalzinho com ideias anárquicas, fruto de discussões intermináveis. Mas tudo vai desembocar perigosamente numa noite de “coquetéis Molotov”, lançados contra os vigias que tinham delatado os pichadores na escola. Algo saiu errado e um dos vigias é gravemente ferido, o que leva o grupo de jovens a debandar cada um para um lado.

Gilles e Christine vão para a Itália e em meio à garotada de várias partes do mundo, conhecem um grupo de cinema engajado e Christine identifica-se com eles. E lá vai ela para destino ignorado com esse pessoal.

Gilles e seu amigo Alain (Felix Armand), que compartilham o gosto pela pintura, visitam Pompéia e é se inspirando nos afrescos, mosaicos e corpos cobertos de lava do Vesúvio de um passado distante, que os dois percebem que escolheram a arte e que esse é o caminho deles.

E o filme que começa com todas aquelas ideias de mudar o mundo onde vivem, vai dar numa viagem de autoconhecimento e escolha do que vão fazer com o resto de suas vidas.

Olivier Assayas fez um filme bonito e terno, com uma reconstituição maravilhosa de época, para contar a história de sua geração, onde prepondera o idealismo e o amor sobre a autodestruição e no qual, o fazer cinema é colocado em relevância.

Alguns cobraram o fato de que o diretor teria falado só da “sua” geração, de experiências de uma juventude burguesa, mais dada a descobertas de prazeres do que a um trabalho duro de sobrevivência como a grande maioria.

De qualquer modo, Olivier Assayas que dirigiu um filme altamente engajado como “Carlos”, tem o direito de nos mostrar como foi que chegou a ser quem é. Um grande nome do cinema, sem sombra de dúvida.