Batman, o Cavaleiro das Trevas Ressurge

“Batman, o Cavaleiro das Trevas Ressurge”- “The Dark Knight Rises” Estados Unidos/ Inglaterra 2012

Direção: Christopher Nolan

Oferecimento Arezzo

As primeiras cenas são escuras. Há um lamento que nos invade… É a nota inicial da última parte da impressionante trilogia do diretor Christopher Nolan sobre a mítica figura das histórias em quadrinhos, o Batman.

Mas, quase esquecemos o tom sombrio do começo, como se fosse uma sombra que já passou, porque a história é complexa e exige nossa atenção. O ritmo que Nolan escolhe na narrativa é o de um trem bala. As imagens filmadas em IMAX são grandiosas.

O novo vilão, Banes (Tom Hardy), entra na tela sem apresentação, comandando mercenários. Ele tem uma estranha máscara presa ao rosto e é brutal. Lidera um sequestro incrível e cruel. Pessoas são jogadas de um avião em pleno voo.

Mas, mal dá para registrar tais cenas, porque já nos envolvemos com uma grave acusação que o comissário de polícia (Gary Oldman) joga sobre Batman, que faz sua primeira aparição, em silhueta na noite.

Na mansão do milionário Bruce Wayne, o outro lado do Batman, o mordomo Alfred (Michael Caine, ótimo) que faz as vêzes de um substituto paterno, aconselha seu patrão tristonho a mudar de vida, viajar, espairecer, casar talvez.

Qual o quê… Mais deprimido do que nunca, melancólico mesmo, Bruce Wayne não conseguiu esquecer as perdas que sofreu e vive um luto negro.

Nem a visita de uma Mulher-Gato sedutora, na pele macia de Anne Hattaway, o anima. Mas, pelo menos, ela inspira a única gracinha do filme, tingida, porém, de nostalgia. Olhando o colar que ela acabara de surrupiar de seu cofre, ele diz:

“- Bonito colar… Lembra o de minha mãe.”

Selina é a nota alegre e solitária, em oposição ao soturno Batman. Ela é “sexy” e elegante nos pretinhos que desfila e especialmente provocante na fantasia de couro justa, que revela uma cinturinha de vespa invejável.

Mas as cenas à luz de uma lareira não são com ela. É a rica Miranda (Marion Cotillard) que leva Bruce para o tapete. Porém, a moça terá que se contentar com um erotismo paupérrimo. Dois órfãos que se consolam, nada mais.

Aliás, toda a história é sombria, desesperada mesmo. Todos sofrem à espera do apocalipse. Os cenários mais visitados são os esgotos da cidade. A Batcaverna, que brilha na escuridão, banhada por águas prateadas, é pouco usada.

Gotham é uma Nova Iorque fotografada em tons cinza que sofre com a ameaça de uma crise financeira nunca vista e pior, sua total destruição.

Há um terror kafkaniano que paira sobre todos.

Uma criança, “nascida no inferno”, vai atacar porque foi maltratada e nunca se esqueceu do “Poço”, prisão maldita da qual conseguiu escapar físicamente mas que colou-se em sua mente para sempre.

É claro que as lutas são perfeitas e as perseguições empolgantes com o estreante Morcego, nave supertecnológica que substitue o Batmóvel e tem uma performance estonteante.

Sem falar na Batpod, uma moto futurística que faz tudo parecer antigo e obsoleto. Obras do mago Lucius Fox (Morgan Freeman).

Mas a tristeza impera.

Esse “Cavaleiro das Trevas” traz uma história contemporânea que homenageia a vítima que se imolou para salvar seu mundo.

O tom é melancólico mas a trilogia de Christopher Nolan termina de uma maneira impactante.

Afinal, uma lenda não morre jamais.

 

 

Além da Liberdade

“Além da Liberdade”- “The Lady” França / Inglaterra, 2010

Direção: Luc Besson

A primeira imagem do filme já é comovente. Uma menina pequena, sentada no colo do pai, pede que ele lhe conte uma história.

“- Posso contar uma de quando a Birmânia era chamada de País do Ouro.”

Ela se aconchega. Eles estão num jardim, à sombra de palmeiras, à beira de um lago.

“- Era uma vez um lindo país onde havia florestas de ébano e teca por toda a parte. Naquele tempo, tigres vagavam nas selvas e manadas de elefantes caminhavam nas planícies. Havia muita riqueza nesse país. Safiras azuis e rubis vermelhos… Mas essa é uma história triste porque vieram soldados de um país distante e tiraram tudo de nós. Ficamos muito pobres…”, finaliza, levantando a filha e pousando-a na grama do jardim.

Colhe uma flor e com ela enfeita o cabelo da menina, que o olha encantada.

Vestido em seu uniforme do exército, vira-se e dá um adeus, antes de entrar no carro.

Foi a última vez que ela viu o pai, em Ragum, na Birmânia, onde moravam. Ela tinha dois anos de idade.

Assim começa a história verdadeira de Aung San Suu Kyi,que muito cedo perdeu o pai, herói nacional na luta pela independência do país, colonizado pelos ingleses.

No golpe militar de 1962, instalou-se na Birmânia (hoje Mianmar), um governo de generais, conhecido como um dos mais cruéis e repressivos do mundo.

Michelle Yeoh faz, com elegância e sobriedade, o papel dessa mulher que vai viver fora de seu país, casa-se na Inglaterra, tem dois filhos e que, por causa da doença de sua mãe, volta e se vê compelida a abraçar a causa de seu povo, vítima da tirania.

Ela lidera, então, uma luta de resistência pacifica contra o governo brutal de seu país, discursando em comícios, com sinceridade e firmeza, para uma população que a venera e levanta retratos de seu pai.

Carismática, ela defendeu eleições democráticas, enfrentando ameaças terríveis, prisão domiciliar por mais de15 anos, afastamento do marido (o ótimo David Thewlis) e dos filhos, que ela viu poucas vezes em todos esses anos, impedidos pela não concessão de vistos pelos generais, que queriam forçá-la a deixar o país.

Magrinha, voz suave e firme, rosto bonito, franja, cabelos sempre presos num coque baixo, enfeitados com as orquídeas do jardim, usando a saia longa e blusa do traje local, ninguém adivinharia a força e a tenacidade que a distinguiam, não importa o que acontecesse.

A revista Time colocou-a na capa, chamando-a de “Orquídea de Aço” quando em 1991, seus filhos e marido receberam por ela o prêmio Nobel da Paz.

O filme de Luc Besson é quase austero de tão simples. O roteiro de Rebecca Frayn conta a história sem malabarismos.

Alguns críticos reclamaram que o filme dá muita ênfase ao casamento e vida doméstica de Suu Kyi. Pode-se responder dizendo que, assim fazendo, a roteirista mostrou o tamanho da renúncia afetiva da líder birmanesa em prol da causa de seu país.

De qualquer modo, o diretor Besson oferece a tela a Aung San Suu Kyi e à sua mensagem em defesa da democracia ao mundo.

Recentemente, aos 67 anos, ela foi empossada como membro do Parlamento e fez sua primeira viagem internacional desde 1988, sendo recebida com honras por chefes de estado.

Só por nos mostrar a existência dessa mulher valente, o filme de Luc Besson vale a pena ser visto.

“A Dama de Yanoun”, como Suu Yi é também chamada, emociona e ensina a todos o quanto vale lutar por um sonho em que se acredita.