J. Edgar

“J. Edgar”- Idem, Estados Unidos 2011

Direção: Clint Eastwood

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Ele não era qualquer um. Nada mais nada menos do que o homem que comandou o FBI por 48 anos (1924-1972). Demasiado humano, com tudo que isso pode significar, assim Clint Eastwood nos apresenta J. Edgar Hoover (1895- 1972), seu personagem em seu último filme.

Com “flash-backs” e em tons quase sépia, John Edgar Hoover nos é mostrado em um vasto painel de atuações.

O roteirista, Dustin Lance (Oscar por “Harvey Milk”), conta-nos do menino, esperança da mãe na “reabilitação do nome da família”, ao homem velho que precisava de injeções de estimulantes, todos os dias, na ânsia de reconquistar o vigor dos primeiros anos.

Dirigido por sua paranóia pessoal, Hoover demonizava “os inimigos do país”. Eram reais? Não importava. Assim via os comunistas, estrangeiros, anarquistas e depois os gângsters, os Roosevelt, os Kennedy, Martin Luther King, Nixon, muitos.

Tirânico e implacável, com seus arquivos secretos mantidos a sete chaves pela fiel escudeira Miss Gandy ( Naomi Watts), chantageou e calou muitos poderosos.

De um garoto obcecado em tornar-se um homem forte, como queria sua mãe, ele chegou a ser chefe dos novos gladiadores, os G-Men dos quadrinhos e do cinema.

E os comandava com mão de ferro, como se fossem soldados e ele o general. Mandava e gostava de ser a obedecido à risca.

Clint Eastwood não acusa nem desculpa Hoover. Não força conclusões. Humaniza o personagem. E pontua sua história com a música que ele mesmo compôs para o seu filme.

Mas Eastwood nos revela também as fragilidades de J. Edgar, magistralmente interpretado por um Leonardo Di Caprio irreconhecível e em tudo lembrando o personagem da vida real. Parece mentira que não foi indicado para o Oscar de melhor ator…

Siderado pela mãe narcisista (Judi Dench, atriz impecável), o menino fugia do modelo de um pai fraco e demente. Queria brilhar aos olhos dela e foi com muita luta interna que não se dobrou aos seus desejos de casá-lo.

Identificado aos sonhos de perfeição projetados nele pela mãe, foi com muita dor que aquele homem se entregou ao desejo e ao amor que sentiu por seu companheiro da vida toda, Clyde Tolson (Armie Hammer), o segundo homem do FBI. A mãe quase o convenceu que aquilo que ele sentia era mau.

Assim J. Edgar é visto pelo roteirista e diretor do filme.

Mas não há certezas sobre essas histórias do “amor que não ousa dizer o seu nome”, como querem os puritanos.

Porém, caso isso tenha acontecido assim, o amor não fez J. Edgar melhor. No máximo acrescentou um pouco de vida social e mais humor ao homem de feições carregadas, desanuviando talvez algumas rugas de sua testa sempre franzida.

Em seu quarto, onde morreu, vemos em imagens a história íntima desse homem: a mãe, entronizada, sorri na moldura preciosa, damascos sedosos cobrem a cama de dossel, soldados greco-romanos em estátuas de bronze, espadas desembainhadas, protegem-no de seus inimigos como se fossem arcanjos.

Só não puderam poupá-lo da morte. E, a esta altura, J. Edgar era um dinossauro, fadado à extinção.

Essa história íntima, de um homem que foi uma lenda americana, mereceria mais aplausos da Academia de Cinema pelo diretor, roteirista e ator excepcionais. Mas, talvez, eles ainda representem os puritanos. E, se assim for, a injustiça vira um elogio.

O Artista

“O Artista”- “The Artist”, França/ Bélgica, 2011

Direção: Michel Hazanavicius

Para gostar do filme “O Artista”, mudo, com letreiros à antiga, em preto e branco, são necessários alguns requisitos mas o principal deles é ter imaginação.

O filme é para quem não precisa de palavras faladas para ter empatia pelos atores e interesse pela história. Ou então para quem gosta de construir um filme próprio dentro de si, valendo-se da memória afetiva para escolher as vozes dos artistas, os ruídos da vida que vivemos e fazer parte da história.

É para quem não precisa de efeitos especiais e gosta de uma história de amor contada com simplicidade e eficiência.

Outro desses requisitos é não ter menos de 40 anos e ter visto Chaplin, O Gordo e o Magro, os irmãos Marx e lembrar-se desses e de outros filmes mudos que passavam nos inícios da TV no Brasil.

Mas mesmo quem é muito jovem e tem imaginação mas nunca viu filmes mudos ou não se interesssa por eles, pode gostar de “O Artista” porque o filme tem os ingredientes do sucesso: amor contrariado, uma garota engraçada, bonita e de bom coração, dois parceiros que dançam como Fred e Ginger e um cão muito especial.

O “Jack Russel terrier” Uggie não fala. Seus latidos também são mudos. E esse cachorrinho não precisa de mais nada do que de sua simples presença e seus truques bem aprendidos para detonar a química que existe entre ele e o Artista.

O filme conta a história de um astro do cinema mudo, George Valentin (Jean Dujardin) e começa em 1927, alguns anos antes do “crash” da Bolsa de New York e do aparecimento dos primeiros filmes falados.

Ele encontra uma garota chamada Peppy Miller, que deseja ser estrela de cinema e com ela vai reformular algumas das idéias que ele tinha sobre a vida.

Quem faz a garota brejeira é Bérénice Bejo, nascida em Buenos Aires mas criada em Paris, casada com o diretor do filme. Ela foi indicada a melhor atriz coadjuvante no Oscar.

O filme foi rodado em Hollywood e algumas das locações são cenários verdadeiros da época de ouro do cinema mudo, como a casa da atriz Mary Pickford.

“- É um filme que contraria o que vem sendo feito no momento. Sei que isso é uma das coisas que as pessoas apreciam nele”, diz o diretor francês Michel Hazanavicius.

Mas o filme não tem técnicas ultrapassadas. Foi usado um computador para gerar imagens, como por exemplo a recriação das ruas de Hollywood nos anos 30. O jeito de usar a câmara e a iluminação são sofisticados e contemporâneos. A trilha sonora excelente de Ludovic Bource foi premiada com o Globo de Ouro.

Jean Dujardin também levou o Globo de Ouro na categoria comédia/musical e o SAG (‘Screen Actors Guild Award”), confirmando assim o prêmio de melhor ator no Festival de Cannes no ano passado e a indicação para o Oscar.

Michel Hazanavicius, além das 10 indicações do seu filme para o Oscar, faturou o cobiçado prêmio do “Directors Guild Awards”, seus iguais, e levou também o Globo de Ouro para casa.

Ironicamente, um filme francês e mudo, pode ser o primeiro não americano a ganhar o prêmio de melhor filme do ano.

Será?

Saberemos isso no dia 26 de fevereiro, dia da festa do Oscar.