Que Horas Ela Volta?

“Que Horas Ela Volta?”, Brasil, 2015

Direção: Anna Muylaert

“Que horas ela volta?” é uma pergunta feita por duas crianças no filme de Anna Muylaert. Acontece na primeira cena, onde Regina Casé (numa interpretação extraordinária), babá do menino de classe média alta, liga para a filha dela, que está longe e chora. O garoto pergunta pela mãe que trabalha fora:

“- Que horas ela volta?”

Val, a babá pernambucana, põe o menino no colo e o enche de beijos.

Na segunda vez, a pergunta é lembrada pela filha de Val, Jessica (Camila Márdila, ótima) que reclama por ter passado a infância vendo raramente a mãe e sempre fazendo a pergunta:

“Que horas ela volta?”

Ironicamente, é o dinheiro que Val manda para Recife que dá uma vida melhor para a filha.

Esse é um filme comovente. Mexe com nossos sentimentos porque faz lembrar a mãe ou a substituta dela. Tanto que, no exterior, o filme ganhou o título “Second Mother – Segunda Mãe”.

Val é aquela empregada devotada à família para a qual trabalha, a faz-tudo da casa e que adora Fabinho (Michel Joelsas), o único filho do casal.

O garoto é mimado pela empregada, que, certamente sente falta da filha e que é naturalmente maternal e atenta. Ela está sempre de braços abertos para ele, mesmo quando o adolescente, bem crescido, pede para dormir com ela e se aconchega feliz ao lado dela, na cama estreita do quartinho abafado.

A patroa (Karine Teles) é simpática mas desatenta com Val. Não a trata mal em nenhum momento, mas vê-se que a empregada é bem-vinda para trabalhar e fazer tudo que se pedir a ela. É sintomático desse jeito de ser, o modo com que dispensa, gentilmente, o presente de aniversário que ganhou de Val.

Mas tudo muda na casa do Morumbi quando chega Jessica, a filha de Val. Não se veem há dez anos e a menina se transformou numa jovem bonita.

Mas são duas gerações de brasileiras que foram educadas de maneira diferente. Val “conhece o seu lugar”sem que ninguém precise dizer isso para ela. Já Jessica, acha que a mãe é tratada como cidadã de segunda categoria e não quer isso para ela.

As duas nasceram em momentos diferentes do país.

Jessica participou de uma real ascensão das classes menos favorecidas. Estudou e veio para São Paulo para prestar o vestibular na FAU (Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP). A mesma escolhida por Fabinho, o “filho adotivo”de Val.

Articulada e segura de si, Jessica não se conforma com a fronteira que lhe é assinalada: “da porta da cozinha para lá”, como enfatiza a patroa, principalmente porque o patrão (Lourenço Mutarelli) está encantado com a garota.

Ela vai ser um elemento de mudança na vida da mãe.

O filme ganhou o Prêmio do Público no Festival de Berlim e o e melhor atriz para Regina Casé e Camila Márdila no Sundance Festival. Exibido em 22 países, teve excelentes críticas na Europa e Estados Unidos e está sendo falado como um forte candidato ao Oscar de melhor filme estrangeiro.

Anna Muylaert (“Durval Discos”2002 e “É Proibido Fumar”) acertou no roteiro e pediu para seus atores que recriassem suas falas, o que deu espontaneidade e verdade aos personagens.

O humor é um grande tempero para amaciar os temas amargos do filme. Mas lágrimas teimam em aparecer, principalmente no final antológico.

Este post tem 0 Comentários

  1. Regina Casé é maravilhosa e ninguém melhor que ela pra mostrar ao mundo que a filha da empregada e o filho dos patrões tentam prestar vestibular na mesma FAU e na mesma USP.

  2. suely suchodolski disse:

    Vi o filme e saí emocionada.
    Regina Cazé é verdadeira como parece ser como pessoa.
    Na simplicidade a diretora mostra a preocupação doentia de status
    sem insistir no assunto. Ana Mulayert é delicada na abordagem de varios aspectos que
    permeiam a vida de pessoas muito próximas a nós.

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