Vocês Ainda Não Viram Nada
“Vocês Ainda Não Viram Nada”-“Vous N’Avez Encore Rien Vu”, França, Alemanha 2012
Direção: Alain Resnais
Nuvens na tela esgarçam-se sobre uma paisagem de montanhas. Depois, ânforas gregas e mosaicos bizantinos sugerem que vamos ouvir falar de mitos antigos.
Mas, antes de continuar, um aviso importante: é preciso que o espectador deixe-se levar por Alain Resnais, 90 anos. É necessário acompanhar o diretor sem preconceitos nem críticas, dizer sim à novidade e maravilhar-se com sua imaginação grandiosa.
“Vocês Ainda Não Viram Nada” alerta para que não prejulguemos algo que ainda não conhecemos. Resnais escolhe sempre esse nome para todos os seus filmes, antes do definitivo. Dessa vez, o título temporário foi o que ficou.
Adaptação de duas peças de Jean Anouilh, “Eurydice” e “Cher Antoine”, é uma homenagem aos textos de teatro e aos atores que os dizem. E Resnais confessa que escolher uma peça faz ganhar tempo. Um roteiro original levaria uns dois anos para ser escrito. E compreendemos que ele tem pressa. O tempo, tema de todos os seus filmes, é agora escasso.
Quando o filme começa, vemos que uma mesma mensagem é dita por telefone a 13 pessoas, grandes atores do cinema e teatro franceses. Mas não importa se você não conhece esses nomes. O importante é entender a situação que o escritor morto, amigo deles, propõe que aconteça em sua casa no cume de uma montanha.
Quando eles chegam lá, uma frase os saúda: “Quando passou a ponte, os fantasmas vieram ao seu encontro” (do “Nosferatu” de Murnau).
O mordomo leva os atores à sala de cinema e, quando se sentam nos sofás negros da sala adornada com pinturas nas paredes, são convidados pelo amigo morto, que aparece na tela, a julgar se a peça dele, “Eurydice”, que todos eles interpretaram no passado, pode ser reencenada por uma companhia de atores jovens que será vista por eles.
E o momento mágico acontece quando os pares Orfeu/Eurydice (Sabine Azéma/PierreArditi e Anne Consigny/Lambert Wilson) começam a se formar novamente e a peça se desenrola então, atuada por atores que se situam em três idades da vida: a juventude, a meia-idade e a maturidade.
Na tela são os jovens desconhecidos, na sala os atores consagrados. E há nuances diferentes em cada interpretação.
É como se a memória do texto trouxesse com ela o momento afetivo que esses atores viveram no palco.
E, numa espécie de transe, eles se levantam e passam a viver os personagens da peça encenada pelos jovens. Ora em uníssono, ora em eco, ora apenas eles, ora apenas os jovens. Ora atores consagrados e os jovens, dialogando.
Resnais, em sua imensa sabedoria, nos faz pensar em temas universais que aparecem na peça encenada: o amor idealizado, os ciúmes, o horror à solidão, a impaciência dos amantes, o para sempre, o que estimula e o que mata o amor, sentimento delicado que pode ser confundido com a vontade de amar e ser amado.
E a questão principal, trazida por Mathieu Almaric, que interpreta o Destino: não é a morte que faz sofrer, é a vida. Tudo que vivemos fica em nós. São os fantasmas que assustam Eurydice e fazem que o amor deles seja difícil. A culpa por não poder ser aquela que Orfeu idealiza faz Eurydice fugir dele.
E só a morte vai unir para sempre os amantes ideais que a vida não poupou.
Resnais, de filmes antológicos como “Hiroshima, mon amour”1959, “O Ano Passado em Marienbad”1961, “Mon Oncle D‘Amérique”1980, para só citar os mais conhecidos, aos 90 anos quer viver e produzir filmes. O próximo começa a ser rodado no fim do ano. “Aimer, boire et chanter”, titulo provisório, é baseado na peça de Alan Ayekbourn.
O cinema precisa de gênios como ele, ainda que só uma elite intelectual e pessoas com sensibilidade o apreciem. Não importa. Porque seus filmes sempre se tornam inspiração para essa gente.
Nossa, pelo seu texto, como sempre impecável, fiquei curiosíssima para assistir este filme, deve ser maravilhoso, e o título vai mesmo continuar? porque este filme não quero perder.
Sonia querida,
Alain Resnais não dá pra perder. Poucos filmes dele passaram no Brasil pq infelizmente, o nivel de cultura do nosso povo deixa a desejar… Em todas as sessões metade do público sai. E não há nada de mt misterioso para entender. É que essa homenagem ao texto teatral tem que ser dita por atores maravilhosos e assim é. Mas dizem que o texto é mt comprido, que tem mt diálogo… Enfim, pérolas aos porcos…
O titulo não vai mudar. Ele assumiu o provisório!
Bjs
Ja elegantemente informado da minha desimportância, volto como fui: um molambo critico… Mas mesmo assim fui a Resnais e seu ensaio sobre a antropofagica arte de representar, numa mistura picante de corporativismo teatral entre gerações distintas da voragem ficcional, aonde o mito de Euridice e seu Orfeu funciona como tomografia da própria vida, o pé na cova de todos nós… Resnais é um remanescente da direção de câmera, algo perdido nos dias de hoje, e é maravilhoso acompanhar suas lentes… Mas no resta um fica: ver cinema no teatro ou teatro no cinema? As fronteiras sempre existiram, e transpo-las talvez seja impossivel, até para Resnais. Quanto ao publico, esse hoje não distingue porta de parede. Não sou fã de Resnais, e dei graças por não estar de volta ao inferno de Marienbad, mas de fato são pérolas… Cultivadas, mas pérolas… Eleonora, senti uma tendencia trapista na repetição de roupa na foto (é a “meeesma” do post abaixo..!). Socialismo chic?
Caro Theodore,
Achei bem humorado essa coisa de molambo.
E vc notou a minha roupa… Não sabia que era ligado em vestes. Mas eu só coloquei essa foto à falta de outra. Estão acabando! Vc não vai mais ter do que reclamar no quseto fotografias.
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Minha Sinopse
Nasci em São Paulo, Capital. Sou a primeira filha de sete irmãos nascidos de Yvette e Octavio Pereira de Almeida, casada com Ivo Rosset. Estudei Psicologia na PUC de SP e Direito no Mackenzie. Sou psicanalista, membro associado da Sociedade Brasileira de Psicanálise de SP. Atendo em meu consultório há mais de 30 anos. Sempre adorei cinema, desde as sessões Tom e Jerry, passando pelo Cine Bijou até o saudoso Belas Artes. Meus filmes preferidos: “Morte em Veneza” de Visconti e “Asas do Desejo” de Wim Wenders.
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