A Melhor Escolha

“A Melhor Escolha”- “Tha Last Flag Flying”, Estados Unidos, 2017

Direção: Richard Linklater

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O que faz as pessoas voltarem a um passado que elas lutam para esquecer? Talvez percebam que o peso dessa lembrança precisa ser aliviado.

Foi isso que aconteceu com Larry “Doc” Shepard (Steve Carrell), quando uma tragédia faz ele perder o filho, meses depois da morte da mãe dele.

Sai à procura daqueles que estiveram com ele no pior momento de sua juventude, na guerra do Vietnã. Mesmo depois de mais de 30 anos, aqueles dois companheiros voltam à sua mente e “Doc” precisa estar com eles. São as únicas pessoas que podem ajudar a enfrentar essa outra tragédia.

Entra naquele bar decadente e Sal Nealon (Bryan Cranston), o dono, não o reconhece:

“- Não se lembra mais de mim? ”, pergunta.

“- Jesus! “Doc”! Soube que foi preso por abandono do dever…Como me encontrou? ”

“- Internet.”

E o ex médico da Marinha convida Sal, o fuzileiro naval, como ele, a ir a um lugar. Uma igreja. Desta vez a surpresa é maior ainda para Sal. No púlpito, um pastor gordo e negro, está pregando. É Richard Mueller (Laurence Fishburne), o terceiro fuzileiro.

“- Oh! Meu Deus! O que ele está fazendo? Esse homem era um “bebum”, mulherengo… Como encontrou esse lugar? “

“- Internet.”

Aqueles três homens viveram algo terrível juntos. Mas ainda não estão preparados para conversar sobre isso.

“Doc” precisa deles para buscar o corpo do filho e enterrá-lo. Mas não vai ser tão fácil assim. Inúmeras dificuldades e algumas mentiras terão que ser encaradas para que a melhor escolha possa ser feita.

E, durante esse tempo, os três vão se estranhar, brigar, tentar evitar a proximidade, principalmente o pastor que é o único casado e não bebe mais. Mas com o correr do dia e noite que tem que passar juntos, e a audácia de Sal que bebe muito e faz perguntas que ninguém ousa fazer, os três vão rememorar os bons momentos, rir muito e falar de mulheres e contar piadas. Preparam-se para finalmente enfrentar o que não querem.

O filho de “Doc” morreu na guerra do Iraque, que mal tinha começado, já que estamos no filme em 2003. Os três mais velhos já não mais idealizavam a guerra deles, a do Vietnã.

Sabem o quanto o governo mentiu para eles sobre os motivos daquela guerra. O mesmo pensam sobre a que vitimou o filho de “Doc”.

Richard Linklater diretor de “Boyhood” de 2014, faz do encontro dos três fuzileiros navais uma viagem tanto pela terra deles, de carro e de trem, como pelo tempo, voltando ao passado e ao que aconteceu no Vietnã e que eles guardam por tanto tempo como uma zona proibida que, entretanto, queima por dentro. A viagem vai ser uma ocasião para uma reparação necessária e uma elaboração da culpa que é um bálsamo para as feridas ainda abertas.

Ninguém é julgado aqui.  As coisas ruins acontecem e temos que lidar com elas, parece dizer o diretor através dessa história. Ele é um observador atento, interessado nos conflitos que habitam as almas humanas.

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Amante por um Dia

“Amante por um dia”- “L’Amant d’un Jour”, França, 2017

Direção: Philippe Garrel

Amor? É um sentimento buscado pela maioria das pessoas e quase sempre é difícil de ser vivido.

O diretor francês, Philippe Garrel, 69 anos, faz desse sentimento o tema de seu cinema que é simples e sofisticado, ao mesmo tempo universal, já que fala sobre a natureza humana e seus conflitos.

“Amante por um Dia” fecha uma trilogia que começou com “O Ciúme – La Jalousie” de 2013, já resenhado nesse blog. Nele há um personagem que aconselha Louis Garrel, filho do diretor e o protagonista:

“- Ela te ama na medida da capacidade de amar que ela tem. Todos vivemos uma história pessoal. Barreiras, receios, dificuldades… Existem limitações no amar.”

E quando o jovem responde que seu amor pela mulher que ele ama não tem limites, o personagem mais velho e mais experiente adverte:

“- Cuidado Louis, isso é perigoso…”

Ficamos sem o segundo filme, “A Sombra de uma Mulher”, que não passou por aqui e agora temos em cartaz o fecho da trilogia, “Amante por um Dia”.

O ângulo escolhido para falar sobre o amor, agora é a fidelidade.

Na cena inicial, uma morena bonita, jovem, de cabelos longos, transa de pé no banheiro da faculdade com um homem mais velho. Ela é intensa e vemos em seu rosto em “close” que parece usufruir um grande prazer com aquela transa. Repete “Oh mon Dieu!” antes do orgasmo.

Depois vemos uma garota que chora aos soluços, sentada na calçada, à noite. Uma grande mala está a seu lado. Sempre chorando muito, ela arrasta a valise pesada. Sobe uma escada e toca a campainha de um apartamento.

“- Filha? O que aconteceu?”diz o pai com carinho.

Uma voz feminina em “off”, marca dos filmes de Garrel, conta que o namorado colocou ela na rua. Essa mesma voz vai aparecer de tempos em tempos explicando a trama. Para o diretor não interessa ir e vir com outras cenas.

Gilles (Eric Caravaca) é professor de filosofia na faculdade e Jeanne (Esther Garrel, filha do diretor), é sua filha.

Ao observer uma bolsinha de maquiagem sobre a mesa onde estão sentados, Jeanne fica sabendo que o pai tem uma namorada morando com ele, aluna da facudade, Ariane (Louise Chevilote, alta e bela). Reconhecemos, quando ela aparece, a moça da transa no banheiro.

Jeanne e Ariane tem a mesma idade, 23 anos.

No começo se estranham, competem pela atenção de Gilles, que está preocupado com a filha. Para apaziguar Ariane, numa noite em que ela está brava com ele por causa de Jeanne, ele solta uma frase infeliz. Diz que ela tem a liberdade de sair com quem quiser.

As duas garotas, agora sobre o mesmo teto, acabam se aproximando e trocando confidências. São opostas no que se refere à fidelidade no amor.

Jeanne, que diz que ama Matteo, o namorado que a expulsou de casa, não admite pensar em infidelidade. Já Ariane acha que fazer sexo sem amor, ter “um amante por um dia”, não tem nada de mais. O importante é que o homem não fique sabendo.

“- Os homens são infiéis mas ficam muito frágeis quando é a mulher que trai.”

Vamos ver em “Amante por um Dia” as idas e vindas do amor, que quase sempre é possessivo.

Philippe Garrel que escreveu o roteiro com Caroline Deruas, sua mulher, e com o escritor Jean-Claude Carrière, que trabalhou com Bunuel, filma sempre em preto e branco. Isso faz com que se concentre no detalhe, no “close”dos rostos, na emoção da cena.

Um filme simples mas longe de ser simplório, que colabora para que pensemos sobre questões imortantes  não tão fáceis de ser vividas

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