Inquietos

“Inquietos”- “Restless”, Estados Unidos, 2011

Direção: Gus Van Sant

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“Perdidos… Estamos voltando para casa”, cantam os Beatles na letra de “Two of Us”. E a câmara alta mostra um garoto que desenha com giz uma linha branca ao redor do seu corpo deitado. Sabe como naqueles filmes quando a polícia tira o cadáver da cena?

Em uma cerimônia fúnebre, uma garota se vira e sorri para o garoto do corpo ”assassinado”.

A morte sem tristezas.

O que leva esses dois a tantos funerais?

Ela desenha, gosta de livros de pássaros e da biografia de Darwin. Conta a ele sobre um pássaro que pensa que morre quando o sol se põe e por isso canta uma linda melodia a cada amanhecer.

Ele faz castelos de “crackers” e conversa com o fantasma de um soldado japonês “kamikaze”.

Distrações… Porque algo perigoso assusta aqueles dois.

Quando ele apresenta a ela os pais enterrados no cemitério, compreendemos que ele é órfão, que a morte dos pais foi trágica e que ele tenta se afastar da realidade das mortes que o atingiram através de seu interesse pela morte de estranhos.

“- Quando eles morreram naquele acidente, eu fiquei três mêses em coma. Acho que morri também por alguns momentos…”, conta ele.

Um luto impossível. Abandono e raiva fria.

Ela diz que é voluntária no hospital de crianças com câncer e confessa depois que está morrendo com um tumor no cérebro.

“- Meus testes não foram muito bons. Tenho três mêses…”

“- Você pode fazer muita coisas em três mêses”, responde ele.

Annabel (Mia Wasikowska, a “Alice” de Tim Burton) e Enoch (Henry Hopper, filho de Dennis Hopper (1936- 2010) a quem o filme é dedicado), vão viver uma “love story” diferente.

Com poesia, delicadeza, imagens fluidas e elegância, Gus Van Sant filmou “Inquietos”:

“ – É um filme sobre a morte, não depressivo, com muitos silêncios”, diz o diretor.

O assunto da morte encontrando alguém em plena adolescência é o umbigo desse filme, roteirizado pelo estreante Jason Lew. É um tema que foi explorado na boa literatura e que aqui ganha um tom contemporâneo, apesar dos personagens quase atemporais já que vivem num mundo sem celulares nem computadores, vestidos em roupas “vintage”.

O vencedor da Palma de Ouro em Cannes em 2003 por “Elefante”, o diretor de “Drugstore Cowboy” 1989, “Garotos de Programa” 1991, “Milk” 2008, o original e criativo Gus Van Sant está inspirado em “Inquietos”.

Não tenham medo desse filme. Vocês vão se encantar com Enoch e Annabel.

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A Chave de Sarah

“A Chave de Sarah” – “Elle s’appelait Sarah”, França 2010

Direção: Gilles Paquet-Brenner

 

Todos se emocionam com “A Chave de Sarah”. No final, alguns tem os olhos marejados.

E é compreensível o porquê da platéia envolver-se com o clima criado por esse filme que tem uma trama que nos agarra e surpreende.

A história, que conta um fato real vivido por personagens de ficção, estende-se por quase 70 anos. Há um vai e vem do presente para o passado, conduzido pela jornalista americana que vive na França, Julia Jarmond (a maravilhosa Kristin Scott-Thomas) que investiga a história da deportação dos judeus da França, que nos pega de surpresa.

Pouca gente conhece esse episódio, que ocorreu na França ocupada pelos nazistas, na noite de 16 e 17 de junho de 1942, em Paris.

Grudados em nossas poltronas, presenciamos às cenas de impotência, lágrimas e desespero, quando 13.000 judeus foram arrancados de suas casas e levados para o Velódromo de Paris, de onde saíram para serem levados aos campos de extermínio.

A atuação das crianças é natural e convincente. Sarah é vivida por uma atriz-menina que é um talento raro (Mélusine Mayance). Ela é a figura central, em torno à qual giram os outros personagens da história.

O diretor Gilles Paquet-Brenner, que teve um avô judeu alemão casado com uma francesa e que foi um dos 6 milhões de judeus que morreram nos campos de concentração, sempre quis contar essa parte da história de sua vida. Não conseguia encontrar o tom até que, finalmente, inspirou-se no livro de Tatiana de Rosnay, que foi “best seller”na França, para poder fazer isso sem que o filme parecesse um relato autobiográfico.

“A Chave de Sarah” centra-se em perguntas: como tudo isso pode ter acontecido? Quais as consequências na vida das pessoas que sobreviveram a esse horror?

O colaboracionismo velado dos franceses fica exposto. Até o presidente da França, Jacques Chirac, aparece na TV com um trecho do discurso de desculpas formais dirigido ao povo judeu.

O drama pessoal da menina Sarah e o da jornalista Julia são chaves para as perguntas acima. Apontam para a culpa e a responsabilidade de cada um por seus próprios atos e suas decorrências.

Mais. Faz pensar na passividade frente ao drama do outro. Na falta de empatia, de compaixão, no virar as costas e seguir sem fazer nada.

Pior. Faz lembrar o egoísmo, a cobiça, a inveja, a maldade mas também as boas intenções que se mostram equivocadas.

“A Chave de Sarah” é um filme que agrada por causa da trama bem urdida, das interpretações impecáveis e porque nos faz pensar na vida.

Recomendo para quem e sensível e gosta de histórias bem contadas.

 

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