Nebraska

“Nebraska”- Idem, Estados Unidos, 2013

Direção: Alexander Payne

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Sem sonhos, não há vida, só uma sobrevivência ingrata.

Woody Grant, uns 80 anos, vivia assim, sem alento, bebendo muito, desde garoto, casado há 40 anos com uma mulher que só o criticava, pressagiando-lhe um negro futuro, a internação num asilo.

Talvez tudo fosse culpa dele mesmo. Não sabemos.

O fato é que o velho (interpretado com convicção por Bruce Dern, 76 anos, melhor ator no Festival de Cannes e candidato ao Oscar) parece não ter laços afetivos estreitos com ninguém. Dos dois filhos, o mais velho e bem sucedido, âncora de um noticiário de TV, diz claramente ao mais novo:

“- O asilo é a melhor saída. Ele nunca ligou para nenhum de nós.”

Tudo isso porque últimamente, o velho Woody Grant, descabelado e renitente, fugira de casa por duas vêzes, sendo encontrado pela polícia andando a pé pela estrada. Dizia que ia para Nebraska, onde ganhara um prêmio de US$1 milhão.

Só ele acreditava nisso, não dando ouvidos aos filhos e à mulher que explicavam que tudo não passava de um truque publicitário. Apegava-se àquele pedaço de papel que viera pelo correio como se fosse sua tábua de salvação.

Até que o filho mais moço, David (Will Forte, muito convincente no papel), sente pena do pai e decide levá-lo a Lincoln, em Nebraska. Dessa forma, o velho se convenceria por si mesmo que não existia prêmio algum.

Mas, por trás dessa decisão do filho mais moço há motivos mais íntimos. A namorada dele, gorda e prática, acaba de deixá-lo e ele se sente só e sem futuro como vendedor de uma loja. Identifica-se com o pai desnorteado, buscando uma razão para viver. Quer aproximar-se mais e conhecê-lo melhor. Entender o porquê dessa alucinação com o prêmio e desse fim de vida melancólico.

A viagem torna-se uma volta ao passado para Woody e uma oportunidade para o filho de ver com os próprios olhos as testemunhas da vida do pai quando jovem.

A cidadezinha de Hawthorne, no caminho para Nebraska, é a terra natal do pai e seus irmãos e onde ele conheceu a mulher que viria a ser sua esposa.

Lá eles param para pernoitar e participar de um almoço em família, que vai mostrar como o dinheiro mexe com as pessoas.

E é ali que vamos ver a parte mais engraçada  do filme, com cenas a cargo de June Squibb, que faz a malcriada mulher de Woody, indicada a melhor atriz coadjuvante no Oscar.

A bela fotografia em preto e branco, também indicada ao Oscar, ajuda a criar um clima de passado e estagnação. A cidadezinha de Hawthorne, vazia e fria, parece saída de um quadro de Edward Hopper (1882-1967).

Alexander Payne, 54 anos, indicado ao Oscar de melhor diretor, assim como o seu filme, já ganhou dois Oscars com roteiros seus: “Sideways”2004 e “Os Descendentes” 2011. Com “Nebraska” filma o primeiro roteiro de Bob Nelson, outra indicação ao Oscar, que acerta na história que lida com o envelhecimento e as relações familiares.

Mas “Nebraska” fala, principalmente, do amor entre filho e pai, de forma delicada e simples.

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Philomena

“Philomena”- Idem, Inglaterra/Estados Unidos/ França, 2013

Direção: Stephen Frears

 

Tudo começou naquele dia de 2003, em que Philomena, sentada na capela da Virgem, parece melancólica e pensativa. O que será que a entristece?

Stephen Frears, o diretor inglês do filme, que sabe contar histórias humanas como ninguém, usa “flash backs” para que possamos entender o que está se passando com aquela senhora.

Ela se vê no passado, mocinha, comendo uma maçã do amor num parque de diversões. Um rapaz bonito se aproxima, conversam e de repente estão longe de todos, num galpão. A maçã cai no chão.

Enquanto lágrimas enchem-lhe os olhos, ela se vê na frente da Madre Superiora olhando severamente sua barriga crescida.

“- Sua mãe não lhe falou sobre rapazes?”

“- A mãe dela morreu há muito tempo, Madre” informa outra freira.
 “- As Irmãs da escola nunca disseram nada sobre bebês”, diz Philomena aos prantos.

“- Não ouse culpar as Irmãs pelo seu pecado! Sua indecência!”

E logo Philomena se vê gritando de dor.

“- O bebê está atravessado! Chamem um médico!”

“- A dor é a penitência dela”, diz a Superiora, ao lado da mesa ginecológica, onde Philomena se contorce.

Mais tarde, vindo da igreja, sua filha, ao ver um retratinho emoldurado na mão de sua mãe, pergunta:

“- Quem é esse menino? “

“- Hoje é seu aniversário. Faria 50 anos.”

E, no coquetel em um hotel, a moça que serve o vinho, escuta alguém dizendo que quer escrever um livro.

“- Desculpe. Não pude deixar de escutar sua conversa. Quer escrever um livro? Conheço uma mulher que teve um bebê há 50 anos atrás. As freiras o tiraram dela. Aconteceu na Irlanda. Talvez tenha sido dado em adoção, sem o seu consentimento. Ela manteve o segredo por todos esses anos.”

Aquele segredo de 50 anos e sua incrível história aproximou Martin, o jornalista despedido da BBC e a senhora irlandesa. Ele viu em Philomena uma oportunidade de escrever um livro e ela queria tanto encontrar alguém que a ajudasse na sua procura pelo filho.

Martin Sixmith, que vai escrever o livro sobre o drama de Philomena, capta em conversas com ela, sua ingenuidade, sua aceitação do que acontecera mas também sua vontade de voltar a ver o filho. Então, sua atitude inicial de distância, de buscar apenas um meio de ganhar dinheiro, é substituida por uma proximidade com Philomena, uma mulher simples mas inteligente, de natureza apaixonada e bem humorada.

Infelizmente, a história das freiras católicas que acolhiam mães solteiras na Irlanda, desamparadas por suas famíias, é verdadeira. Em troca, as moças trabalhavam por 4 anos no convento, sem nada receber ou tinham que pagar 100 libras.  Uma fortuna que nenhuma delas possuia. Seus filhos eram adotados, à revelia, por casais americanos que pagavam 1.000 libras pela criança.

Judi Dench, empresta à essa mãe, com um segredo pesado, uma espontaneidade e naturalidade desarmantes. Seus olhos azuis se tornam cinzentos com a lembrança do filho que mal conheceu. Foi indicada a melhor atriz do Oscar 2014.

A verdadeira Philomena Lee, 80 anos, foi vista na TV e jornais, há pouco, com o Papa Francisco. Ela trabalha para ajudar as mães solteiras da Irlanda, que sofreram o mesmo castigo que ela, a procurar seus filhos.  Guardou sua fé.

Steve Coogan, que faz o jornalista é também co-autor do roteiro do filme. A trilha sonora de Alexandre Desplat pontua a tristeza de Philomena e nos comove. Também foram indicados ao Oscar.

“Philomena” foi escolhido para estar na lista dos 9 melhores filmes do ano no Oscar. Se não ganhar, não tem importância, o público vai saber apreciá-lo, tenho a certeza.

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