Um Amor em Paris

“Um Amor em Paris”- “La Ritournelle”, França, 2014

Direção: Marc Fitoussi

Oferecimento Arezzo

 

O que pode acontecer quando um casal vive muito tempo junto e um dos dois está inquieto?

O que foi que deu em Brigitte Lécanu (Isabelle Huppert), uns quase 50 anos, mulher bela, forte  e com um lado coquete que a faz desfilar no meio das vacas charolesas que cria com o marido Xavier, com um chapéu de pele de raposa?

O filme começa numa competição em que Ben-Hur, o touro do casal, ganha o prêmio de melhor da raça. Brigitte na plateia e Xavier (Jean-Pierre Darroussin) se orgulham com o resultado.

O filho deles vive em Paris e estuda para ser palhaço-acrobata. Ele vem para uma visita aos pais mas demora pouco.

Na cama, ela lê e ele não insiste muito quando ela não quer conversa. Ficamos sabendo que Brigtte tem um problema de pele que enfeia seu colo. Placas vermelhas que podem denunciar algo de origem emocional. E médico nenhum atinou com o remédio certo ainda.

E, por causa disso, ela vai ter uma desculpa para sair da Normandia, onde vivem, para passar dois dias em Paris, sozinha.

Acontece que não é bem a uma consulta com o médico que Brigitte tenciona ir. Os jovens vizinhos deram uma festa e Brigitte ficou conhecendo um rapaz galante (Pio Marmai) e parisiense.

Trocaram olhares, passearam pelo campo tarde da noite e trocaram um beijo. Nada de mais. Mas bastou para atiçar o desejo de conhecer melhor o rapaz. Ou talvez, Brigitte usou desse expediente para voltar a sentir-se livre e viver novas experiências.

Ela decide ir atrás de algo que não sabe definir o que é.

Acontece nada e muito em Paris. E o marido fica sabendo.

É interessante acompanhar a maneira como os dois vão lidar com esse fato.

“Um Amor em Paris” não é uma pura comédia. Também não é melodrama. É um filme que não quer ser muito sério, nem leviano, mas que tem bom humor.

Notei que as pessoas da plateia onde assisti ao filme com o meu marido, era curiosamente constituída de uma maioria de pessoas mais velhas. Coincidência? Ou foi o tema da história do casal maduro que atraíra esse público em particular para ver o filme? Não sei.

O que sei é que todos ali puderam ter a chance de aprender uma coisa ou duas com a história daquele casal.

“Um Amor em Paris” do diretor francês Marc Fitoussi (de “Copacabana”, também com Isabelle Huppert), é surpreendente no modo como trata de um assunto que poderia ser espinhoso.

Uma cena atrás de uma cortina, quando a emoção enche de lágrimas os olhos da atriz, mostram quão maravilhosa ela é. Vale a ida ao cinema.

 

 

 

Ler Mais

Bem-vindo a Nova York

“Bem-vindo a Nova York” – “Welcome to New York”, Estados Unidos, 2014

Direção: Abel Ferrara

 

Todo mundo ouviu falar desse escândalo acontecido em maio de 2011. Afinal, o homem era presidente do Fundo Monetário Internacional, casado com uma jornalista famosa, herdeira de uma grande fortuna e possível candidato à Presidência da República na França, pelo Partido Socialista, nas eleições de 2012. Professor da Universidade de Paris, sua atuação política incluía o cargo de deputado a partir de 1986, Ministro sob vários presidentes, reeleito três vezes para a Assembleia Nacional.

Como entender que um homem com essa carreira brilhante tenha sido preso em Nova York sob acusação de abuso sexual, cometido em um hotel, com uma camareira humilde?

O filme de Ferrara, 62 anos, começa com os habituais letreiros negando que a história do filme tenha a ver com Dominique Strauss-Kahn. Tudo para evitar processos. Compreensível.

Mas o que diferencia o filme de uma cinebiografia qualquer é o depoimento de Gérard Depardieu, no início. O ator, que não faz muito tempo se indispôs com o governo francês e naturalizou-se russo, em “close”, afirma que odeia políticos, que não gosta do personagem que interpreta no filme, mas que prefere atuar na pele de alguém que odeie porque assim passa mais verdade para o público. E ele está brilhante no papel desse homem.

Ao som de “America, the Beautiful”, numa versão tristonha, a face escondida de Georges Deveraux (Gérard Depardieu) começa a ser mostrada pela câmara de Abel Ferrara. Um debochado homem gordo recebe um alto funcionário da segurança em seu gabinete parisiense, em meio a mulheres vulgares, que se sentam à vontade em seu colo e também no colo do funcionário espantado. Corpos são apalpados por mãos rechonchudas que, sem cerimonia, parecem conhecer bem o caminho. Serviços sexuais explícitos são oferecidos ao homem que não está nada à vontade e são recusados:

“- Estou aqui à trabalho.”

Corte para o aeroporto. Vemos Georges chegar a Nova York. Físico avantajado, feições inexpressivas, ele faz o “check-in” no hotel, recebido com rapapés.

E começa a espantosa noite de orgia. Georges serve-se de mulheres que estão à sua disposição. Bebida e drogas à granel. Ele bufa como um touro, ruidoso e desagradável. Mais um “voyeur” que um garanhão.

No dia seguinte, a camareira bate à porta do quarto dele, sem imaginar o que a espera. Ele sai do banho, deixa cair a toalha e a ataca, submetendo-a, ajoelhada e assustada.

O resto sabemos.

Preso quando já estava no avião para Paris, ele é mantido em prisão domiciliar, sob vultosa fiança, num apartamento que custa 60.000 dólares por mês, à esposa rica (Jacqueline Bisset, esplêndida).

E, adivinhamos na convivência hostil do casal, motivos para a conduta auto-destrutiva de Georges, que foge às responsabilidades que não quer assumir e com isso submete a esposa a seus desejos, derrotando-a.

Com a ajuda de ótimos atores, o diretor americano Abel Ferrara, sugere que atrás de um vício pelo sexo pode esconder-se uma angústia tremenda, da qual se quer escapar e que em todo monstro existe um desejo inconsciente de auto-destruição e morte.

Nesse caso em especial, podemos supor que Georges Deveraux mergulhava em sua carne para fugir de seu espírito atormentado, decepcionado em seu idealismo por um mundo que não quer mudanças.

Um filme pesado e impressionante.

 

Ler Mais