As melhores coisas do mundo

“As melhores coisas do mundo”, Brasil, 2010

Direção: Laís Bodanzky

Oferecimento Arezzo

Quem não se lembra de sua adolescência com saudades, fique longe desse filme. “As melhores coisas do mundo” não é para você.
Agora, se sente saudades ou se você ainda é um adolescente, vai se apaixonar por Mano, Pedro, Carol, Bruna e toda a galera.
Porque esse filme não se dirige somente ao mercado “teen”.
Acolhe de boa vontade quem quer saber mais sobre os jovens de hoje ou deixar-se levar por recordações de sua própria adolescência.
Certo. Outras gerações não tiveram essa liberdade que vemos no filme e na vida. A sexualidade também não era escancarada à vista dos pais. Meninas não fumavam abertamente no recreio. As conversas tentavam ser mais policiadas pelos próprios jovens de outrora.
O que se vê em “As melhores coisas do mundo” pode chocar e dar inveja a quem pensa que o importante é o comportamento externo. Ao longo do filme porém, vai ver que questões de mundo interno são sempre as inevitáveis e as que mudam o rumo do destino.
O herói da história é Mano (Francisco Miguez) e através dele, sua família e seus colegas de escola, Bodanzky vai nos revelar seu olhar interessado sobre esse mundinho: temos Pedro (Fiuk), o irmão depressivo e intelectualizado, a mãe patética (Denise Fraga), o pai problemático, a melhor amiga (Gabriela Rocha), a aparentemente liberada Valéria, a indiscreta Dri e outros mais.
Cada geração faz essa passagem do seu jeito mas o trânsito pela adolescência traz à tona sempre as mesmas velhas perguntas sobre a vida.
Bem lá no fundo, só as roupas e a música são diferentes. Nem isso, talvez, já que a canção “Something” dos velhos Beatles é tocada durante todo o filme e faz a ponte com os ouvidos da velha guarda.
Dedilhada de forma bisonha no início por Mano e seu pobre violão, ao final será o tema do solo potente de uma guitarra vermelha, nas mãos de um Mano mais amadurecido. Cantada com vozinha de bossa nova no início, no fim do filme não precisa de vozes. O toque firme das cordas daquela guitarra faz com que a gente entenda que quem a toca agora aprendeu lições não só de instrumento mas sobre si mesmo e o mundo.
A figura do professor mítico que ensina atitude e é reconhecido como o modelo que os adolescentes precisam, aparece duas vezes nessa história. Um deles é o professor Artur (Caio Blat), que rouba beijo e corações das alunas, além de possuir carisma e empatia para ensinar. O outro é interpretado com doçura e firmeza por Paulo Vilhena que ensina Mano a abraçar o violão para alcançar a tão sonhada e poderosa guitarra. E conquistar a gata.
Sem falsos moralismos mas com ética é que se aprende a ser gente. Assim, meninos saudáveis transam com meninas da mesma idade com camisinha e não gostam de bordel.
Há uma preocupação pedagógica que não é chata nem se acha dona da verdade nesse filme.
O roteiro de Luiz Bolognesi foi baseado nos escritos de Gilberto Dimenstein e Heloisa Prieto que são adultos que se sentem responsáveis pelas novas gerações.
A música da trilha original de BiD pontua e ressalta o conteúdo emocional de cada momento do filme. A câmara de Laís Bodanzky também se faz jovem: ousa enquadramentos, corre atrás, fica lenta de cansaço e, assim fazendo, mostra bem como é o ritmo do corpo e mente dos adolescentes.
Na verdade esse filme fazia falta no cinema nacional. Falar com frescor e espontaneidade sobre o presente através da turma de uma escola de classe média em São Paulo, é mostrar de um jeito diferente um Brasil que só aparece na TV no formato novela.
Recomendo vivamente à garotada visitar o site do filme que é interativo e tem um projeto gráfico atraente. Lá você encontra informações, “downloads”, fotos e pode fazer a lista das 10 melhores coisas da vida gerando um “wallpaper” especial. De quebra pode entrar nos dois blogs que aparecem no filme e perceber que adolescentes não são todos iguais. E pode também postar um vídeo. Se for escolhido, vai aparecer no YouTube.
A voz do grande Arnaldo Antunes encerra o filme e resume tudo a que acabamos de assistir na sua canção “As melhores coisas”.
É isso aí. Uma coisa bonita de se ver.

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Desejo e poder

“Desejo e poder" - "Brideshead revisited", Inglaterra, 2008

Direção: Julian Jarold

Um homem de costas caminha na tela. Murmura:
“- Só tenho uma certeza… Meu nome é Charles Ryder. Não sei mais quais emoções sinto… Aliás só me resta uma. A culpa…”
Pelo fim. Assim se inicia “Desejo e poder – Brideshead revisited“, a versão filmada do livro de Evelyn Waugh de 1951.
Muitos se lembram ainda da mini-série em 11 capítulos que passou na saudosa TV Cultura, em 1981, com Jeremy Irons e Claire Bloom. Foi memorável. E mais fiel à obra de Waugh. Dizem os atuais responsáveis pelo roteiro que mudanças mais ao gosto de nossos tempos se impuseram. Há quem discorde.
Em todo caso, o mesmo deslumbrante cenário do castelo Howard em Yorkshire, Inglaterra, volta a encantar os nossos olhos: fontes pontuando o verde de gramados infinitos, árvores seculares, moitas esculpidas como muros altos escondendo jardins secretos e a imponente construção em suas simetrias aristocráticas. Dentro impera o mármore, os tetos são ornados de afrescos e pesados lustres de cristal, as escadarias tem gradil de renda de ferro dourado, há tapetes que sufocam passos e quadros com retratos de antepassados reais.
Poder, luxo, elegância.
Quando o plebeu Charles Ryder (Mattew Goode) encontra Sebastian Flyte (Ben Wishaw) em Oxford, numa roda boêmia, seu futuro está traçado.
Acompanha o amigo a Brideshead, a morada da família e parece embasbacado com tanta ostentação de riqueza:
“-Você pode visitar a casa por cinco xelins no dia se Santa Alexandria…”, ironiza Sebastian.
E o rapaz que queria ser pintor, começa a entrar em contato não só com a ostentação mas com os costumes decadentes do amigo.
Charles, que tinha um pai ausente, pouco interessado no que ele sonhava para a sua vida, vai querer pertencer àquela família nobre e acaba conhecendo o fim de uma época e testemunhando a agonia de uma classe social que não era a sua.
Vai amar e ser amado por Sebastian e sua irmã (Hayley Atwell), a bela Julia e será atingido pelo rigor católico da mãe dos dois, Lady Marchmain (Emma Thompson de cabelos brancos, traços envelhecidos e boca cruel).
Cara (Greta Scacchi), a simpática amante italiana de Lorde Marchmain (Michael Gambon), nos braços de quem ele se refugiou de sua mulher oficial, confidencia a Charles:
“- Aquela mulher quase o sufocou. O mesmo com os filhos. Todos tem que fazer o que ela quer.”
“- A senhora também é católica?” pergunta Charles.
“- Sim. Mas na Itália é diferente. Não temos tanta culpa”, responde Cara sorrindo ao sol de Veneza.
Os figurinos do filme são perfeitos e cada detalhe nos remete a um tempo onde ainda havia algo que desapareceu para sempre com a Segunda Grande Guerra.
Bem cuidado e com um elenco de pessoas bonitas e atores convincentes, “Desejo e poder – Brideshead revisited” vai seduzir o seu olhar. Mas talvez não deixe marcas profundas em sua memória.
Descartável? Se formos tão rigorosos como Lady Marchmain, pode até ser.

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