Noite do Oscar 2021

Oferecimento Arezzo

Eleonora Rosset

Noite do Oscar 2021

Steven Soderbergh nos prometera uma noite diferente das outras, num ano diferente dos outros. Difícil celebrar a vida quando tantos não estão mais aqui… Mas é nossa obrigação chorar os mortos e abraçar os vivos. Porque enquanto houver vida haverá arte.

E tudo começou como se fosse um filme, a câmara entrando na sala com os créditos, os nomes dos indicados passando na tela.

E não teve vestidos. Bem, alguns. Mas a maioria se conteve e vimos mulheres e homens bonitos mas mais interessados no que acontecia naquela sala, com círculos de mesas distantes umas das outras. Em cada mesa um filme. E enquanto eram entregues os prêmios, a gente escutava a história de cada concorrente.

O início foi solene. Regina King, a diretora de “Uma Noite em Miami”, de azul cintilante, pousou a estatueta dourada num pedestal. E cada um que ganhava pegava o Oscar com delicadeza e orgulho.

E os primeiros foram os roteiristas. Emerald Fennell por “Bela Vingança” e Florian Zeller por “Meu Pai”.

Laura Dern anunciou o Oscar para o melhor filme internacional e quando “Druk – Uma Rodada a mais” foi premiado, seu diretor Thomas Vinterberg contou emocionado que o filme fora dedicado à filha, jovem, que morreu num acidente de carro, pouco antes da data do filme começar. Um luto foi trabalhado com esse filme que mostra o perigo do exagero.

O melhor ator coadjuvante é chamado e Daniel Kaluuya de ”Judas e o Messias Negro” sai da mesa para o palco. Mãe e irmã chorando.

Melhor maquiagem e cabelo vai para ”A Voz Suprema do Blues”. O filme também ganha melhor figurino para Ann Roth, uma lenda de Hollywood, que não estava presente.

Lá de Seul, o diretor de ”Parasita”, Bong Joon-ho e o elenco de seu filme perguntam: o que é ser um diretor de cinema? E Chloe Zhao, a melhor diretora, com o Oscar na mão e trancinhas, faz um discurso amoroso.

Riz Ahmed, o ator de “O Som do Silêncio” entrega o Oscar de melhor som para o seu filme. Muito merecido. Um trabalho original e criativo.

Em seguida “Dois Estranhos Distantes” é o melhor curta metragem e o melhor curta de animação é “Se Algo Acontecer… Te Amo”. “Soul” é a melhor animação e todo mundo concorda e aplaude. “Colette” foi o melhor curta metragem.

Já o próximo prêmio levanta a plateia que também adorou “Professor Polvo”, uma unanimidade. E “Tenet” ganhou pelos melhores efeitos especiais.

Um ponto alto da noite chegou na hora da ganhadora do prêmio de atriz coadjuvante, Youn Yuh-juhg, fazer o seu delicado e bem humorado discurso de agradecimento. Todo mundo riu com ela, olhando admirada para Brad Pitt e dizendo que ia adorar voltar para a festa do ano que vem.

O tão badalado “Mank” leva dois Oscar: melhor design de produção e fotografia. Merecidos. E Harrison Ford anuncia o prêmio de melhor edição para “O Som do Silêncio”.

E Viola Davis entrega o Prêmio Humanitário para Tyler Perry e sua Fundação. Muito aplaudido em suas palavras contra o ódio.

“Soul” confirma seu favoritismo ganhando o Oscar de trilha sonora. Melhor canção foi ‘”Fight for You” de “Judas e o Messias Negro”.

O “in memoriam” foi longo. Muitos se foram esse ano.

E com tudo chegando ao fim, a chinesinha Chloe Zhao ganha o Oscar de melhor filme para “Nomadland”, que consagrou Frances McDormand como a melhor atriz!

O final foi de Joaquin Phoenix que anuncia Anthony Hopkins como o melhor ator em “Meu Pai”.  Estava torcendo por ele! Mas ele não veio.

E lá se foram três horas e tanto. Para quem gosta de cinema e viu todos ou quase todos os filmes, valeu a pena. Eu gostei do tom mais sóbrio e mais íntimo. E ganhei a noite porque acertei em tudo!

Ler Mais

Nomadland

“Nomadland”, Idem, Estados Unidos, Alemanha, 2020

Direção: Chloe Zhao

Na tela negra, letras brancas contam que, em 31 de janeiro de 2011, a fábrica de gesso da pequena cidade de Empire, Nevada, foi fechada, após 88 anos dando emprego e vida a seus habitantes que, com isso, saiu do mapa.

Um cenário desolado, vento, neve, frio e neblina.

Fern (Frances McDormand, dois Oscar por “Fargo” e “Três anúncios para um crime”) prepara-se para partir. No depósito onde estão as coisas de sua casa, ela pega uns pratos e abraça um casaco, emocionada. Deixa o resto para trás, despede-se do encarregado e na tela aparece o título “Nomadland”.

Em sua van branca, preparada para nela viver como se fosse casa, Fern cantarola uma canção de Natal, cercada de neve. Seu rosto sem expressão, os olhos vazios. Canta triste para si mesma.

Seu destino é um estacionamento. Vai trabalhar num imenso galpão da Amazon, repleto de caixas e esteiras rolantes.

“Lar é só uma palavra ou é algo que se leva consigo? ” lê-se na tatuagem no braço de um homem que também trabalha lá e almoça com Fern e os demais. Todos mais velhos. Não há jovens entre eles.

Linda May, uma senhora que mais se aproxima de Fern, pergunta qual foi o nome que ela escolheu para a sua van. “Vanguard”, responde ela. Nós entendemos sua necessidade de proteger-se.

Serão retalhos da vida dessa mulher que veremos. Uma viagem onde acontecem pequenos encontros, alguns relatos e na qual os rostos marcados pela idade, vão estar ao lado de Fern.

Em algum momento, histórias serão contadas. Todos tem motivos para estar na estrada. A crise de 2008 bateu neles como uma onda gigante. E deixou marcas profundas. Semeou morte e desespero. A estrada os salvou.

Ao longo do caminho, gestos de solidariedade, fogueiras à noite, cantorias, danças, vão levando Fern que quando, por acaso, encontra uma sobrinha, diz que não é uma “homeless” mas uma “houseless” (não é sem teto, é sem casa).

Pequenos trabalhos pelo caminho dão o dinheiro para a gasolina e comida.

E encontros marcantes abrem a carapaça que Fern criara para sobreviver. E eis que ela conta do marido Bo, tão amado que casaram meses depois de se conhecer. E o seguiu para Empire, porque ele gostava do trabalho dele e lá era amado por todos.

Perder o marido, a cidade, o emprego, a casa e os amigos não é pouca coisa. Ela, que sempre fora a excêntrica da família, não quis ser consolada, quer viver esse luto, lembrar-se dele, um homem bonito numa foto antiga que ela guarda com carinho.

O cenário por onde ela vai é feito de deserto e montanhas, rochas enormes, o por do sol é sempre lindo e as nuvens ficam cor de rosa. Mas ela segue em frente e vai até o mar bravio, de espumas geladas levadas pelo vento, outra imensidão que ela observa do alto de uma falésia.

Essa conexão com a natureza vai, aos poucos, devolvendo a Fern a dimensão da vida dela. Como diz uma senhora, observando a aliança de Fern:

“- Esse círculo é como o seu amor por seu marido. Não vai acabar nunca. ”

Ouvimos, de vez em quando, notas tocadas por um piano lírico e discreto que amacia as cenas.

Quando Fern terminar essa viagem em busca de regeneração, quem sabe outro amor? Mas não importa. O que fica é o aprendizado de que o amor está dentro dela. Para onde for, ele estará sempre com ela.

A diretora Chloe Zhao, nascida em Beijin, tem 38 anos e poucos filmes. Ela conta que foi reescrevendo o roteiro pelo caminho. Escolheu outros nômades para figurantes e atores que interpretam a  si mesmos. Ela adaptou um livro, “Nomadland: Surviving America in the Twenty First Century” de Jessica Bruder, jornalista americana.

Zhao ganhou quase todos os prêmios do ano por sua direção. Começou com o Leão de Ouro de Veneza, Globo de Ouro, Prêmio do Sindicato dos críticos, dos diretores, dos produtores, Bafta, o Oscar inglês. Vai ser difícil não ganhar o de melhor direção no Oscar.

“Nomadland” recebeu merecidas 6 indicações ao Oscar.

Vai levar muitas estatuetas para casa.

Ler Mais