Os Sabores do Palácio
“Os Sabores do Palácio”- “Les Saveurs du Palais”, França, 2012
Direção: Christian Vincent
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Quem gosta de cozinhar, ou é um “gourmet” que aprecia a simplicidade sofisticada, deve ir correndo ver esse filme delicado, nada pretensioso e tão especial na maneira como conta uma história inspirada na vida de uma cozinheira.
Sim, porque ela não gostava de ser chamada de “chef”.
Talvez porque a comida que ela fazia, era toda uma homenagem à lembrança da avó e da mãe, que lhe ensinaram a arte de cozinhar.
Hortense Laborie (Catherine Frot), foi o nome escolhido para a personagem, que, na verdade, chamava-se Danielle Delpeuch.
Morava no Périgord, com seus campos cultivados, pequenas fazendas e povoados. E lá, ela fazia o “foie gras” e procurava trufas com o seu cachorro treinado.
Amiga de Julia Childs, ela foi também a primeira responsável pela divulgação da culinária francesa, dando cursos a estrangeiros que vinham de longe para aprender com ela os segredos da cozinha francesa tradicional.
De repente, ela recebe um telefonema e alguém vem buscá-la para cozinhar para um alto funcionário do governo, em Paris. Ela hesita, tem o tio velhinho, a fazenda, os animais… Mas fica entre encantada e assustada quando descobre que vai cozinhar as refeições do Presidente da República e seus convidados. No filme não se nomeia o presidente mas era Mitterrand (1916- 1996), no fim de seu governo.
Foi apresentada às regras do protocolo, aos meandros do palácio e à sua cozinha no subsolo, muito bem equipada. Um “chef patisseur”, para fazer os doces, Nicolas (Arthur Dupont), era só dela.
Ela era a única mulher naquele lugar. E, por aí, começaram as invejas, o preconceito e os orgulhos feridos dos machistas que se achavam os donos da cozinha do palácio Elysée.
“- Mas o que ele gosta de comer?”
“- Se o presidente quiser falar com a senhora, será avisada.”
E, na primeira vez que o presidente (o escritor Jean D’Ormesson, 87 anos, novato no cinema) a chama, ficam conversando sobre livros de cozinha, um dos prazeres daquele homem, que gostava do que Hortense fazia, de antemão, porque era a comida de suas avós, a tradicional, que ele queria comer.
“- Madame, me dê o melhor que a França sabe fazer.”
A cena em que o presidente vai à cozinha e ela faz com que ele coma uma “tartine” com trufas, acompanhada de um Chateau Rayas 1979, é marcante. Trufas da fazenda dela, evidente, escolhidas a dedo.
Porque tudo na cozinha de Hortense era artesanal. Mesmo os melhores produtos que a dispensa do palácio possuía, não serviam para ela, que conhecia todos os bons endereços, onde se conseguia o que não existia em outro lugar.
Ciúmes de todos os lados. Ela conseguiu angariar inimigos tanto na cozinha do “chef” geral Le Piq, como nos escritórios dos burocratas que só pensam em cortar orçamentos.
A saúde do presidente também lhe cortava as asas, porque ele não podia comer quase nada do que ela queria fazer para ele.
Laborie ficou dois anos no Elysée e depois partiu para a Antártica, onde o filme começa e vai e vem do palácio para essa base científica, onde, durante um ano ela tentou recuperar-se da experiência ao mesmo tempo maravilhosa e frustrante que vivera.
E nós percebemos, diante da confecção dos pratos que a câmera acompanha passo a passo, que essa tradição culinária pertence a uma época que está acabando e cedendo lugar a produtos industrializados.
Aliás, como ninguém tem tempo para comer e ninguém quer engordar, essa arte tende a desaparecer, mesmo na França. Uma pena…