Boneco de Neve

“Boneco de Neve”- “The Snowman”, Estados Unidos, Inglaterra, Suécia, 2017

Direção: Tomas Alfredson

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As primeiras cenas do filme, que mostram uma casa perdida nas montanhas cobertas de neve da Noruega, são da maior importância na trama. Nelas, um garoto vê sua mãe sofrer por causa de um homem brutal, que ele chama de “tio”. Depois de uma briga entre os dois, a mãe o acusa de ser pai do menino. Nervosa, ela dirige perigosamente o carro onde estão e o menino não consegue salvá-la depois de um acidente.

Há um salto no tempo e vemos o detetive Harry Hole (Michael Fassbender, sempre excelente ator) tentando voltar à boa forma, prejudicada pelo seu vício com a bebida, que fez com que perdesse sua mulher Rakel (Charlotte Gainsbourg). E a oportunidade de redimir-se aparece quando uma policial, Katrine Bratt (Rebecca Ferguson), vinda de Bergen, precisa de ajuda para seguir a pista de mulheres desaparecidas.

Na verdade, tais mulheres tidas como desaparecidas foram assassinadas de modo cruel por um “serial killer”, que tem como assinatura um boneco de neve, sempre encontrado no local do crime. Tem grãos de café na boca, qual dentes pretos e olhinhos cruéis. Outras mulheres terão o mesmo fim durante o filme.

A bela detetive companheira de Harry é corajosa e vai atrás de pistas que incriminariam homens poderosos de Oslo. Uma clínica médica e um empresário milionário estão em sua mira.

O diretor Tomas Alfredson se saiu muito bem no encantador “Deixa ela entrar” de 2008, com a história de uma menina vampira e assinou “O Espião Que Sabia Demais”. Nesse “Boneco de Neve”, adaptado do best-seller de Jo Nesbo, sentimos que falta continuidade à história que é contada, deixando o espectador às vezes perdido. A montagem de Thelma Schoonmaker faz cortes abruptos, o que agrega uma sensação de confusão.

Em entrevistas, o diretor responde às críticas negativas sobre o filme, dizendo:

“Nosso tempo de filmagem na Noruega foi muito curto e ainda não tínhamos a história toda e quando começamos a edição descobrimos que faltava filmar muita coisa. Foi como se tivéssemos feito um grande “puzzle” e algumas peças estivessem faltando, o que faz com que não se veja a figura inteira. ” Assim, cenas adicionais tiveram que ser filmadas na primavera em Oslo.

A explicação do diretor esclarece essa sensação de descontinuidade, que é uma pena, porque o resultado são personagens rasos que impedem a possibilidade do espectador entrar mais emocionalmente na história.

No entanto, “Boneco de Neve”, com todos os seus defeitos, é entretenimento de muito melhor qualidade quando pensamos nos roteiros pobrinhos dos filmes de super-heróis que atravancam os cinemas da cidade.

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Barreiras

“Barreiras”- “Barrage”, Luxemburgo, Bélgica, França, 2017

Direção: Laura Schroeder

Estamos num cenário onde o feminino reina. Só elas tem direito ao jogo em curso. Uma disputa.

Tudo começa na tela com a figura de uma moça que se confunde com Isabelle Huppert. É ela? Não é? É a filha dela, Lolita Chammah, que se parece muito com a mãe.

Catherine, filha de Huppert na vida real, também é filha de Elizabeth, a personagem de Isabelle Huppert no filme “Barreiras”. Não descobriríamos logo esse detalhe importante se a semelhança não fosse tamanha. É quase como se víssemos Isabelle Huppert em duas fases da vida. É de propósito. Porque existe uma confusão na história. Quem é quem aqui?

Isabelle Huppert aparece depois que Catherine busca alguém numa escola de tênis. Uma partida entre duas meninas acontece na quadra, onde ela se senta na plateia.

Atrás da rede Elizabeth, que sempre foi professora de tênis, critica os erros e corrige os gestos de Alba (Themis Pauwells), uma garota de 11 anos, magrinha, olhos claros, cabelos presos numa trança. Mas quem é Elizabeth na vida de Alba?

Em outra cena, um senhor mais velho pergunta a Catherine se viu a mãe dela:

“- Ela não atende ao telefone…”

“- Mas ela não pode tratar você assim! Você tem direito! ”

E vemos quando Catherine encontra Alba no jardim da casa:

“- Sabe quem sou? ”

A menina quieta, baixa os olhos.

“- Da última vez que nos vimos, você era menor do que essa raquete. Vi você jogando lá no clube. Eu também jogava mas desisti… Acha que vou embora de novo? ”

“- Não sei… Mas você não tem nada a ver aqui ” e entra correndo na casa.

Vamos descobrir as relações entre as três quando Catherine vai atrás de Alba e encontra Elizabeth comandando exercícios  abdominais da menina. Quando Elizabeth vê Catherine, seu rosto mostra surpresa e cautela. E diz, depois de um silêncio:

“- Você usa vestido agora? Fica bem em você. Também gosto do seu cabelo. É um prazer ver você. Vem comigo”, diz levando Catherine para fora do quarto. E continua em outro tom, bem mais frio:

“- Você devia ter prevenido que vinha. Alba está se preparando para o campeonato. A viagem com você está fora de questão. “

Então as gerações estão em conflito. Compreendemos que Catherine, mãe de Alba, deixou a filha com a avó Elizabeth. Por que? Ela tinha problemas. Drogas? Mãe solteira? Imaturidade? Não sabemos. Só o que fica claro é a relação nada amistosa entre as duas.

A reaproximação entre mãe e filha será difícil.

Elas tem muito a se dizer? Não. Não viveram as experiências da vida juntas. E esse vazio entre elas Catherine preenche com músicas que ela canta para Alba. Como se fossem acalantos. E dançam, uma de frente para a outra.

Os vazios são também preenchidos com belas imagens da floresta e do lago da barragem. Um corredor para permitir a passagem dos peixes é metáfora para brechas nas barreiras entre Catherine e Alba.

Mas como pode ser mãe quem não foi filha? Um sonho de Catherine ilustra a distância e o estranhamento que ela viveu com a mãe.

Há no filme uma lentidão que pode irritar. A situação e a forma como foi tratada pela direção de Laura Schroeder agradará a pessoas mais maduras. Os mais jovens podem se entediar.

Mas agora só o tempo e paciência podem ajudar. Nada mais.

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