O Que Está Por Vir

“O Que Está Por Vir”- “L’Avenir”, França, 2016

Direção: Mia-Hansen Love

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O que virá com o futuro? Não sabemos mas vamos ter que enfrentar. Talvez ajude se nos prepararmos para esse momento…

Nesse filme raro, dirigido pela diretora e roteirista de 35 anos, Mia-Hansen Love, casada com outro diretor de cinema francês, Olivier Assayas, 25 anos mais velho do que ela, vamos acompanhar uma transição importante na vida de Nathalie, uma professora de filosofia.

Quando o filme começa, a família dela, marido e dois filhos, faz uma visita à ilha de Grand Bé na Bretanha, para conhecer o lugar do túmulo do grande escritor francês Chateaubriand. Em uma placa está escrito que ele escolheu a ilha porque queria ouvir a música do mar e do vento. Já se apresenta aqui o fim de todo ser humano, mas no qual pensamos pouco. A morte é sempre a dos outros.

Passam-se anos e Nathalie acorda, no meio da noite, com o telefone tocando. É a mãe dela (Edith Scob), ex-modelo, que não está envelhecendo bem. Grita pela filha, pedindo socorro. Está tendo outro dos seus ataques de pânico. Se ela não vier, vai chamar os bombeiros.

Mas Nathalie enfrenta a mãe e sua velhice da mesma forma que se recusa a ser barrada na porta da escola onde leciona, por estudantes que protestam contra o governo. Com coragem e determinação.

“- Não vim aqui para fazer política. Vim para ensinar crianças a pensar.”

E, apesar de marido e mulher serem ambos professores de filosofia, não há citações maçantes ou discussões filosóficas. Há a vida quotidiana, num apartamento ensolarado, onde os livros ocupam várias estantes.

A vida intelectual vai mostrar, entretanto, seu valor, na maneira como Nathalie vai enfrentar o que o futuro próximo lhe reserva. Ela não faz tragédia. Há um controle sadio das emoções, mesmo quando o marido (André Marcon) anuncia que tem outra e vai sair de casa.

Ela, apesar de acusar o baque dizendo “eu pensei que você fosse me amar para sempre”, não hesita em despachar o marido e jogar no lixo os buquês de flores que ele insiste em mandar para ela. Com uma raiva delicada.

Para Nathalie tinha chegado o momento da liberdade. Filhos saindo de casa e nenhum marido para compartilhar a vida.

Entra num cinema onde passa o maravilhoso filme de Abbas Kiarostami, “Cópia Fiel”, que trata da vida de um casal. E, para sua surpresa, um homem a assedia e ela sai do cinema com ele atrás.

“- Não estou interessada”, diz ela e dispensa o homem com tranquilidade.

Com o ex-aluno preferido, Fabien (Roman Kolinka), há um flerte e a sensação de que poderiam começar algo, mas Nathalie percebe que tudo com que ele e seu grupo anarquista se preocupam, não faz mais sentido para ela:

“- Não compartilho mais radicalismos…”

Mostra sua fragilidade só para a gata Pandora, que relutantemente herdou de sua mãe. Chora na cama acariciando a bichana, procura por ela quando some no bosque perto da casa de Fabien e agarra-se a ela quando a gata volta com um ratinho como presente.

Nathalie é Isabelle Huppert, divina aos 63 anos, cabelos semilongos soltos, olhos de avelã e porte de adolescente. Interpreta a personagem com tanta sinceridade, que impressiona e comove. Os anos não passam para ela mas seu trabalho interior é visível em seu olhar e rosto expressivo.

E quando “Unchained Melody” toca no final, ficamos com pena de deixar Nathalie, mas sabemos que , tanto para ela, como para todos nós, a vida continua. E vai sempre valer a pena.

 

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Sully – O Herói do Rio Hudson

“Sully – O Herói do Rio Hudson”- “Sully”, Estados Unidos, 2016

Direção: Clint Eastwood

Quando o filme começa vemos na tela um piloto falando com a torre de controle. O avião sobrevoa a cidade de Nova York. Só que baixo demais. Todos gritam. O avião bate num prédio e explode. Horror. Tudo isso em cenas em meio aos créditos iniciais.

Ficamos atrapalhados. Mas não tanto quanto o piloto Chesley “Sully” Sullenberger (Tom Hanks, perfeito), que acorda de um pesadelo no quarto de hotel, onde espera a investigação oficial sobre o que aconteceu na manhã daquele 15 de janeiro de 2009 com o Airbus A320, que levava 155 pessoas, pilotado por ele, em direção a Charlotte.

A TV está ligada e, como todo mundo no país, ele vê de novo seu avião, que pousou no rio Hudson, com os passageiros ilesos sendo retirados por barcas da Guarda Costeira. Chamado por todos de herói, ele está preocupado. Parece que algo o atormenta.

Sai do quarto para correr pela pista que margeia o rio Hudson, na noite fria e, quando vai atravessar a rua, um taxi quase o atropela. A mente de Sully está em outro lugar. Refaz mentalmente, mil vezes, tudo que aconteceu entre a decolagem do aeroporto de La Guardia e a decisão que ele tomou de tentar uma arriscada manobra: pousar no rio.

A inesperada colisão com uma revoada de pássaros, causara estragos fatais nas turbinas do avião, logo depois da decolagem do La Guardia. Ele perde altura.

Há uma tensão que cresce na cabine de comando do voo 1549 e o comandante Sully pede ao co-piloto Jeff Shiles (Aaron Eckhart), 35 segundos para tomar uma decisão, depois da torre de controle dizer que haveria pistas disponíveis para a aterrissagem tanto em La Guardia quanto em Teterboro, em Nova Jersey.

Conduzindo aeronaves há mais de 30 anos, há em Sully uma experiência adquirida que ele vai usar nessa situação de trágica emergência. Seguirá sua intuição. Mas o que o atormenta agora? É a pergunta que o repórter da televisão faz:

“- Sabemos agora que a escolha foi errada. Novas informações mudam tudo. Sully Sulenberg, você é um herói ou uma fraude?”

Mas ele acorda. É um novo pesadelo.

Clint Eastwood, 86 anos, quatro Oscars, dirige com maestria esse filme e confessa que se interessou pelo “milagre” do rio Hudson desde o começo. Por isso leu atentamente o roteiro de Todd Komarnicki, baseado no livro escrito pelo próprio Sully, onde ele conta como foi difícil acreditar que tinha acertado em sua decisão, quando uma equipe começa uma investigação no dia seguinte, para avaliar se o piloto perdera o avião por negligência, sem obedecer à torre de controle que mandara voltar a La Guardia, ou pousar em Teterboro, pondo em risco a vida de 155 pessoas.

O ritmo do filme cria suspense e as cenas do pouso na água alternam-se com conversas angustiadas do piloto com sua mulher, repórteres cercando o hotel onde ele está e a casa da família.

É a dúvida, do homem que é chamado de herói, mas que se martiriza, que é o centro do filme. A verdade pode consagrá-lo ou colocá-lo no ostracismo.

“Sully” é um filme que nos sobressalta e faz pensar na imensa responsabilidade de qualquer pessoa que esteja numa situação de comando e que tenha que decidir o que fazer, sabendo que vidas serão salvas ou perdidas.

Ótimo filme.

 

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