O Orgulho

“O Orgulho”- “Le Brio”, França, 2017

Direção: Yvan Attal

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Preconceito e racismo são questões candentes na França atual. Dado o passado de colonização, o país herdou milhares de pessoas que buscam ali abrigo de guerras, fome e perseguições políticas em seus países natais. Tais pessoas e seus descendentes são malvistos por membros de uma França aristocrática e orgulhosa de sua cultura.

O filme do israelense, filho de argelinos, Yvan Attal, atual companheiro de Charlotte Gainsbourg, coloca na arena dois típicos contendores: a filha de argelinos, Neila Salah (Camelia Jordana) e o representante da França preconceituosa e que julga inferiores os imigrantes, Pierre Mazard (Daniel Auteil).

Ela mora no subúrbio de Paris e chega atrasada no primeiro dia de aula na Universidade Panthéon-Assas, escola da elite.

Já na entrada do prédio, ela é discriminada. O porteiro pede sua carteira de estudante, o que não faz com nenhum outro aluno. Suas roupas e a cor de sua pele a denunciam como uma “avis rara” naquela escola.

Neila está inscrita no curso de Direito e a aula inaugural no anfiteatro é do professor Mazard, conhecido por suas ideias antiquadas e preconceituosas. Parece que ele se diverte ao torturar a aluna atrasada com comentários irônicos sobre sua origem, levando os colegas à indignação. Filmam tudo com seus celulares.

Viralizou. E agora? Como fica o nome da Universidade?

O professor Mazard é chamado pelo reitor e é obrigado, para redimir-se de sua atuação xenófoba e antipática à imagem da instituição, a convencer Neila a participar de um concurso de retórica, como representante daquela universidade. O objetivo não é ganhar tal concurso, que reúne os melhores alunos das escolas de Direito prestigiadas, mas limpar o nome da Panthéon-Assas.

E é o mais delicioso combate que iremos ver na pele de dois atores brilhantes. Camelia Jordana ganhou o César de atriz revelação por esse papel e o famoso Daniel Auteil, filho de argelinos na vida real, faz com ironia ácida o professor racista que engole com dificuldade a tarefa imposta mas que descobre pelo caminho que Neila é inteligente e aprende rápido.

“- Vou ensinar você a ter sempre razão. A verdade pouco importa. Entende?”

Ela custa um pouco a levar a sério o professor e suas aulas mas é uma guerreira e, quando percebe que falar bem, articular as palavras e conseguir bons argumentos é peça fundamental na profissão que escolheu, aplica-se cada vez mais. Incluindo a ideia de que é imprescindível uma boa apresentação, vestir-se de acordo e mostrar-se orgulhosa de si mesma.

É bem verdade que passa a estranhar um pouco seus amigos da periferia e se pega corrigindo o francês deles. Mas isso não impede seu amor por Munir (Hiasin Houicha).

Mas o roteiro não se aprofunda e parece que essa não é a intenção de Attal.

“O Orgulho” sugere a ideia de que, para vencer em uma determinada profissão, temos que nos comportar e apresentar como é o costume do local que escolhemos para viver. Pode parecer preconceito mas é o que funciona. Respeitar as regras não significa rebaixar-se mas reinventar-se, como fez Neila.

Puro bom senso.

 

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Custódia

“Custódia”- “Jusqu’à la Garde”, França, 2017

Direção: Xavier Legrand

Acompanhamos uma mulher pequena, de óculos, pelos corredores de um prédio, com uma assistente. Depois nos damos conta de que é uma juíza que vai presidir uma audiência de custódia de um menino de 11 anos.

O casal de pais, recém-divorciados, cada um com sua advogada, exibem rostos sérios, apreensivos. Nada sabemos sobre eles.

Quando a advogada da mãe de Julien (Léa Drucker) começa a falar, muito rápido, ficamos sabendo que há outra filha do casal, Joséphine, que vai fazer 18 anos logo e que, portanto, não entra na questão da custódia. Abruptamente, uma carta é lida e desperta em nós um desconforto. A advogada acrescenta:

“- Julien não quer ver seu pai. Há uma total rejeição. Joséphine foi tratada com violência pelo pai. A criança em questão quer ficar com a mãe.”

A outra advogada, de óculos e muito segura de si, diz simplesmente o oposto do que a advogada da mãe afirmou:

“- Pai e mãe são responsáveis pela educação dos filhos. A mãe acusa o pai de violência. Não há provas. Ele é descrito por pessoas que convivem com ele como sendo equilibrado, generoso, normal. Não combina com o que a mulher diz dele. Meu cliente está aterrado com a imagem que a mãe faz dele. Se ele não foi um bom marido, isso não quer dizer que foi mau pai. Pedimos a guarda compartilhada de Julien.”

E, apesar de haver um relatório da enfermeira da escola sobre sinais de comportamento violento do pai contra a filha, a juíza decide pela guarda compartilhada.

“Custódia” merece ser visto pelo espectador que não tem informações sobre o  filme. Porque o diretor nos convida a fazer um juízo próprio sobre essa cena da introdução. Paira no ar uma dúvida. Afinal, quem fala a verdade?

Mas se a juíza deu a guarda compartilhada…

E vamos ver acontecer as discórdias familiares cada vez que o pai vem buscar Julien para o fim de semana com ele. Alto, corpulento, ele se mostra empenhado em ter a companhia do filho, que o olha com apreensão. O close da câmera em seus olhos assustados, diz tudo.

Mas nos perguntamos ainda se a mãe ou uma outra pessoa não foi o responsável por fazer a cabeça do filho contra o pai (Denis Ménochet).

O filme do estreante Xavier Legrand, 39 anos, é um convite para o espectador viver essa relação de pai, mãe e filhos. Dentro da casa, do carro, onde eles estiverem. Vamos sentir na pele o que está acontecendo ali.

A tensão inicial vai num crescendo até que o filme vira um thriller. E o espectador se envolve e fica também muito assustado com tudo aquilo, até a aterrorizante cena final.

“Custódia” é um filme surpreendente, com excelente direção de atores bem escolhidos e menção especial para o ator mirim Thomas Gioria. O roteiro inteligente foi escrito pelo próprio diretor.

Grande filme, que não somente conta uma história bem contada, mas faz também uma reflexão sobre a violência doméstica e suas vítimas.

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