No Fim do Túnel

“No Fim do Túnel”- “Al Final del Tunel”, Argentina, Espanha, 2015

Direção: Rodrigo Grande

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A chuva e trovões molham e iluminam uma rua onde está uma casa antiga, escondida por um jardim que virou uma pequena selva descuidada.

Ouvimos uma voz de criança dizendo que está brincando com Casimiro:

“- O jantar está pronto!”diz quem parece ser a mãe.

Mas são vozes do passado porque naquela casa habita um homem só. Ele está numa cadeira de rodas. Casimiro, o cão velhinho, dorme numa almofada. Onde estão a menina e sua mãe?

Há um drama na vida de Joaquín (Leonardo Sbaraglia, ótimo), um homem ainda jovem, apesar do cabelo grisalho, bonito e tristíssimo. No porão da casa, ele trabalha no conserto de computadores. O acesso ao porão é através de um elevador para a cadeira de rodas.

Joaquín liga para o veterinário. Preocupa-se com Casimiro, que não consegue andar mais. Que fazer para que ele possa dormir para sempre sem sentir dor? Parece que o dono do cão também quer parar de sofrer.

Vemos que ele injeta o que poderia ser veneno em biscoitos para Casimiro.

Mas a campainha toca e uma mulher jovem e bonita entra casa adentro com sua filha pequena. Berta (Clara Lago) quer alugar o quarto com terraço do segundo andar da casa de Joaquín. Este mostra-se desconcertado e mesmo irritado com a entrada das duas. Fica sabendo que a menina não consegue falar. Ela logo aproxima-se de Casimiro, que mostra os dentes:

“- Ele é muito velhinho. Estranha as pessoas. Cuidado!” avisa Joaquín.

Mas a mãe da menina, falando muito, não dá chance a que Joaquín diga não a seu pedido de instalar-se imediatamente no quarto para alugar.

A intromissão na vida daquele homem recluso causa um certo desconforto também no espectador. Porque a identificação com o personagem é imediata.

Através de Berta, bisbilhoteira, ficamos conhecendo o que provavelmente prendeu Joaquín à cadeira de rodas e a existência de um luto pesado. Ele transpira uma culpa sem perdão.

No jardim selvagem, a moça vê restos de um escorregador e de um carro amassado e queimado. Numa caixa, fotos de Joaquín com uma mulher jovem e uma menina.

O convite para uma surpresa no terraço pega Joaquín desprevenido e ela dança, sensual e bela. Joaquín já se envolveu, contra sua vontade.

Enquanto isso acontece nos três andares da casa, que volta à vida com a presença das inquilinas, algo chama a atenção de Joaquín, que ouve vozes masculinas na casa ao lado. Usa um estetoscópio que cola à parede compartilhada e surpreende-se. Falam dele. Quem são esses homens?

Não é difícil para o espectador juntar o que já sabe ao túnel do título do filme. Mas não espere uma história morna e previsível. Há reviravoltas e acontecimentos inesperados.

Rodrigo Grande, diretor e roteirista, 42 anos, assina um filme de suspense e afetos. Em entrevista, disse que o assunto principal de “No Fim do Túnel” é a culpa:

“É sobre um homem que se reconstrói.”

O cinema argentino, mais uma vez, demonstra que um bom roteiro é a matéria prima de um bom filme. Quando os atores são ótimos e bem dirigidos, fica melhor ainda. Este é o caso de “No Fim do Túnel”, um filme que envolve o espectador de maneira eficaz.

 

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O Lar das Crianças Peculiares

“O Lar das Crianças Peculiares”- “Miss Peregrine’s Home for Peculiar Children”, Inglaterra, Estados Unidos, Bélgica, 2016

Direção: Tim Burton

Jake (Asa Butterfield) é um adolescente que adora as histórias que o avô (Terence Stamp, 78 anos e ainda belo) conta para ele desde que era pequeno. Ele as conhece de cor mas pede sempre para ouvir de novo.

O avô tinha fugido da Polonia quando era jovem, perseguido por monstros terríveis, dizia ele, e antes de chegar na América, vivera num orfanato numa ilha no País de Gales, dirigido pela senhorita Peregrine (Eva Green, a nova musa de Tim Robins).

Quando Jake levava para a escola as fotos que o avô guardava, todos riam muito e achavam que eram montagens. Tudo que Jake contava era inacreditável. Seria ele tão louco como o avô? Perguntavam uns aos outros, caçoando dele.

Como era possível existir uma menina que flutuava? E aquela então que tinha uma boca enorme, cheia de dentes na nuca, escondida atrás do cabelo? Para não falar do menino invisível que andava nú, da outra garota pequena que tinha a força de dez homens, do garoto que abria a boca e dela saiam abelhas, da que punha fogo em tudo que tocava e da diretora que virava um falcão peregrino.Quanta mentira! Quanta fantasia!

Mas no dia em que o avô liga para o neto na escola e pede que não venha cuidar dele depois das aulas, porque poderia ser perigoso, Jake correu para lá. Ele acreditava no avô dele e não queria que nada de mal acontecesse a ele.

A professora que dá uma carona para ele pergunta se o avô sofre de Alzheimer e Jake responde como o pai diz, mesmo sem acreditar nisso:

“- Demência…”

E, quando chegam lá e quase atropelam um estranho tipo com olhos brancos (Samuel L. Jackson) na frente da casa, Jake vê as coisas do avô reviradas e um enorme rombo na cerca de arame no jardim. Ele procura o avô e o encontra no chão, fora da casa, quase morto:

“- Você tem que ir para a ilha… Procure Emerson… 3 de setembro de 1943… sei que pensam que estou louco… eu devia ter te contado tudo há muito tempo…”

“- Vovô? Me contar o quê?”

Tarde demais. O avô olhava para ele sem olhos nas órbitas.

Jake apavorado olha para a professora que chega para ajudar. Atrás dela, um monstro enorme sem olhos, muitos dentes, braços e pernas afiados como grandes facas, prepara-se para atacá-la.

Esse começo eletrizante do novo filme de Tim Robins, baseado no livro de mesmo nome de Ransom Riggs, que é um bestseller para a juventude, com roteiro de Jane Goldman, intriga e envolve a atenção da plateia.

Mas o melhor ainda está por vir quando conhecemos o orfanato das histórias do avô de Jake. Tim Burton nos encanta com as imagens surreais das crianças “peculiares”, com os detalhes da casa vitoriana que as abriga, com as cores intensas que tem o cenário maravilhoso do jardim inglês com árvores centenárias e as falésias que despencam para o mar azul, lá embaixo.

Ali é sempre o dia 3 de setembro de 1943, véspera da tragédia, que a fenda no tempo não deixa acontecer, protegendo as crianças “peculiares”, que por isso não envelhecem.

É a Segunda Guerra e a história é uma fantasia sobre o Holocausto. As crianças “peculiares” são os judeus perseguidos pelos monstros nazistas.

Tim Burton assina um belo filme, com tudo que ele gosta de mostrar para seus fãs, apesar da história ser às vezes muito condensada, já que se baseia em uma trilogia e não em um só livro.

Não é um filme para crianças mas para jovens e adultos que gostam de se encantar com imagens impossíveis.

 

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