Paterson

“Paterson”- Idem, Estados Unidos, 2016

Direção: Jim Jarmusch

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O cotidiano pode ser prazeroso e belo. E quando se vive um grande amor, tudo gira em torno desse sentimento. O tempo passa rápido, voando para o encontro.

Adam Driver, com o tom certo, vive o poeta Paterson, que escreve com a naturalidade com que pensa o mundo.  Na tela, lemos seus poemas em inglês, porque como diz um personagem do filme, um poeta japonês, o ator Masatochi Nagase, ler um poema traduzido “é como tomar banho com capa de chuva.”

Paterson ama Laura, a deslumbrante iraniana Golshifteh Farahani, falante e sonhadora, que também ama Paterson. Acordam abraçados todos os dias da semana em que os vemos acordar, menos um.

Na cidade de Paterson, Nova Jersey, viveu o poeta americano William Carlos Williams (1883-1963), admirado por Paterson, que não se crê poeta mas escreve seus versos sem rima num caderno. Laura insiste para que ele faça uma cópia, porque nunca se sabe o que vai acontecer. Ele promete que vai fazer. Porque concorda com tudo que ela diz e faz. Seu amor é generoso, aconchegante e irrestrito.

Esse casal convive com um terceiro personagem, Marvin, um buldogue inglês que não gosta de Paterson porque tem ciúmes de Laura. Paterson sai com Marvin todas as noites, amavelmente obediente a Laura. E no bar toma uma cerveja enquanto o cão espera do lado de fora.

Paterson não tem celular porque não quer tecnologia em sua vida mas Laura tem telefone, Ipad e computador e entende o jeito dele de ser. Ela faz “cupcakes” e pinta tudo de preto e branco, especialmente com bolinhas, como Yayoi Kusama, a famosa e excêntrica artista japonesa. E sonha em ser cantora de música “country”. E ele gosta de tudo nela. Até do jeito infantil com que fala com Marvin, que só não rosna para ela.

“Paterson é uma homenagem à poesia dos detalhes, das variações e das mudanças cotidianas. É um antídoto ao alarde dos filmes dramáticos e de ação” disse em Cannes o diretor e roteirista Jim Jarmusch, que dedica seu filme à memória de Nellie, a buldogue que faz Marvin e que ganhou a Palma de Ouro canina e morreu logo depois do filme.

“Paterson” é um tempo de doçura e tranquilidade no cinema. Coisa rara.

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Fragmentado

“Fragmentado”- “Split”, Estados Unidos, 2017

Direção: M. Night Shyamalan

Antes mesmo dos créditos, já somos jogados no clima do filme. Três garotas, dentro do carro do pai de uma delas, são surpreendidas com a entrada de um estranho, que as ameaça usando uma máscara contra gazes. Põe todas para dormir, sem dizer uma única palavra.

Entram os créditos, entremeados com cenas rápidas do sequestrador levando as meninas para o cativeiro.

A partir daí, a atmosfera pesada de suspense e medo do que virá se instala entre as sequestradas e a plateia. O que vai acontecer? O que quer aquele estranho com ar severo?

James McAvoy arrasa com uma interpretação soberba, demonstrando, sem exageros, seu talento camaleônico em personificar um homem com transtorno dissociativo de personalidade. Ele tem nada mais nada menos que 23 identidades, diferentes em tudo. A original, Kevin, sofreu na infância nas mãos de uma mãe tanto louca como cruel. As outras identidades teriam surgido para ajudar Kevin a suportar os traumas sofridos.

Numa procura de recriar uma realidade nova para escapar do sofrimento, Kevin caminha em direção a uma perigosa perda de contato com a realidade do mundo onde vive. Embrenha-se em explicações esotéricas e alucinações sobre um mundo espiritual, para perpetrar crimes nos quais a sexualidade é exercida com perversidade.

Dentre as sequestradas, a que melhor compreende o que  acontece é a que passou por maus bocados na vida. Tal qual o sequestrador, foi abusada na infância e percebe os sinais de loucura no homem que as tem submissas. Anya Taylor-Joy, de “A Bruxa”, se destaca, bem como a pequena Izzie Coffey que é ela quando criança mas as novatas Haley Lu Richard e Jessica Sula também se saem bem e vivem com convicção seus papéis.

O diretor e roteirista nascido na Índia e criado nos Estados Unidos, na Pensilvânia, M. Night Shyamalan, 46 anos, com seu talento para contar histórias fora do comum, foge de mostrar a violência crua e apega-se ao detalhe, ao “close” do rosto dos atores, à sugestão do que pode estar acontecendo, o que assusta ainda mais e é eficiente porque conta com a ajuda da imaginação do espectador.

Shyamalan, do inesquecível “Sexto Sentido” de 1999, conta que pensou nesse filme “Fragmentado – Split” quando sua mulher estudava psicologia e ele descobriu a possibilidade das múltiplas personalidades. Criou a psiquiatra dra Karen Fletcher (Betty Buckley) para ilustrar melhor o que seria esse transtorno psíquico.

Mas o filme tem explicações mais sobrenaturais do que psicológicas para o vilão. Porque “Fragmentado” não é uma história real que o diretor quer contar. É pura ficção. É uma fábula, um conto fantástico, uma alusão ao mito do super-homem.

E parece que ele já está filmando a sequência para completar a trilogia que começou com “Corpo Fechado” (2000). Quem for ver “Fragmentado” note Bruce Willis, o “Mr Glass”, na última cena, já preparando o que virá e que aguardamos com impaciência.

 

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