A Grande Beleza

“A Grande Beleza”- “La Grande Bellezza”, Itália/França, 2013

Direção: Paolo Sorrentino

Frases pessimistas de Céline na tela. Um coro canta “a capella” numa das belas fontes de Roma. Turistas tiram fotos e… um japonês cai, sem vida.

De chofre, o filme de Paolo Sorrentino, 43 anos, introduz sua temática: a vida e a morte. A arte e a beleza como criações do homem que dão sentido à vida? O que buscamos?

Corte para cenas da festa de 65 anos de Jep Gambardella (Toni Servillo, perfeito no papel), escritor de um só livro, mas de sucesso e jornalista bisonho. Ele é principalmente o rei das colunas sociais romanas. Chic e esnobe. Em seu rosto, sempre um sorriso irônico. Olhando bem de perto, a melancolia paira sobre sua figura, companheira do sarcasmo.

Sua festa, no enorme terraço do apartamento deslumbrante com vista para o Coliseu, reúne a fauna local. A mistura de tipos é a regra. Seus convidados, entre eles ex-atrizes fora de forma e representantes da aristocracia romana decadente, bebem muito e dançam ao estilo dos anos 70. Ridículos, simulam juventude e alegria.

No meio de todo esse cenário humano inóspito, Jep confidencia para a plateia:

“- Desde cedo eu estava destinado à sensibilidade.”

Desfilando com uma elegância que não combina com a cafonice ao redor, ele busca algo que não sabe ainda o que é mas se distrai no sexo com uma desconhecida.

A beleza e a arte cercam a todos em Roma. Praças, pontes, fontes, igrejas, castelos, monumentos, esculturas e pinturas estão em toda a parte. Para não falar da luz sem igual e da natureza. Esse exagero de beleza faz com que os romanos se esqueçam dela.

A certa altura, Jep sentencia:

“- As melhores pessoas de Roma são os turistas.”

A eles a contemplação da cidade.

Mas parece que Jep vai sair de seu entorpecimento. Numa noite cruza com Fanny Ardant, interpretando a si mesma, vislumbre da beleza esquecida para Jep.

Volta para casa, como sempre já de manhã, com algo e conversa com a empregada na cozinha e vai para a cama.

Olha o teto e vê o mar. Mergulha no azul e começa a lembrar-se de momentos do seu passado. O “voyeur”, viciado em olhar para fora, descobre em sonhos e devaneios, os encontros com a grande beleza, que dá sentido à vida.

Pouco a pouco, Jep revive, às custas das epifanias esquecidas que, relembradas, revigoram. Compreende que a beleza, assim como a felicidade são fugidias, fugazes, mas são tudo que vale nessa vida.

Para nós, espectadores, é oferecida uma travessia do Tibre, ao por do sol dourado. E saímos do cinema levando um pouco de “grande beleza” conosco. Apaziguados.

Este post tem 0 Comentários

  1. carlos dantas disse:

    Escreves encantos! Entregue-se ao rio destas eloquências. Torne-se uma escritora e refaça este Mundo!

    Umas frases escolhida a esmo:

    “O amor nunca vem para ficar, ao contrário do que se quer acreditar.
    Para um casal ficar junto é preciso trabalhar, lutar, ceder, ter paciência, ser criativo e escolher amar novamente aquela pessoa, muitas e muitas vezes.”

    “Pouco a pouco, …, às custas das epifanias esquecidas que, relembradas, revigoram. Compreende que a beleza, assim como a felicidade são fugidias, fugazes, mas são tudo que vale nessa vida.”

    Parabéns e gratidão!

    • Eleonora Rosset disse:

      Carlos querido,
      É só o que eu quero fazer na vida: escrever! Mas ainda não me veio o assunto… Espero pacientemente e vou fazendo o que adoro: escrever sb filmes!
      E chamar as pessoas para a tela grande!
      Bjs

  2. Erandy Bandeira Albernaz disse:
  3. Estevam Vaz de Lima disse:

    Excelentes seus comentários, Eleonora. Gostei muito do filme. Fiquei impressionado com o contraste entre dois mundos que se expressa através da religiosa colocada em meio àquela gente. A cena dos flamingos e do sopro dela para que voem é muito bonita! Interessante que, num filme eivado de ironias e sarcasmo, a velhinha não é alvo destes. O diretor estaria apontando para a beleza da renúncia e do abandono? Bjo!

    • Eleonora Rosset disse:

      Estevam querido,
      Também adorei a cena dos flamingos. A santidade dela é ser humana e estar aberta para os monentos de Grande Beleza que a natureza oferece? Ser parte dela com simplicidade?
      Esse filme é cheio de perguntas…
      Bjs

  4. maria beatriz gambogi disse:

    O olhar de Jep é irônico sim, mas esse personagem é tão humano…passeia pelas ruas e personagens romanos com um olhar cheio de perguntas e perplexidades…olha-se a si mesmo e busca um sentido na sua vida, na sua trajetória…e o final é esperançoso…

  5. Comparações são frágeis, mas este “a grande beleza” é
    o meu filme “oito e meio’’, (Fellini), dos tempos atuais.

    São emoções fortes e idéias em aberto para serem descobertas em sessões repetidas. Assim como o foi o filme de Federico.

    A girafa: onde a mágica? Fazê-la sumir ou fazer-nos achar que a vemos? Hein?!

    Havendo repetição daquela festa musical inicial, avisem-me; quero entrar e vivenciar prazerosamente esse ‘pancadão’ contagiante.

    Enigma da Madre (espelho da de Calcutá): a Beleza e a Bondade não se medem pelos cânones da estética; são pura e simplesmente estados de nossa frágil e ‘decadente’ natureza humana.

    Estava lá nossa Fanny Ardant – suspiros na platéia e fora! – atestando a inexorável condição humana ‘da Passagem’.

    “Coisas do Além”: coisas DAQUI para nos ocuparmos é que nos conduzirão pras ‘coisas do ALÉM’. Quem sabe!

    Aquela cobertura mirando o Coliseum. “Mamma mia!”!

    Enfim, a trilha sonora e as sentenças dos personagens: ondas criativas e sonoros de reflexão e ironia.
    Só mesmo revendo, revendo e revendo pra se descobrir significados que alimentam nossa alma vital.

    Como vc expressou, Eleonora, são Pequenas e ”Grandes Belezas” que garimpamos enqUanto fazemos a travessia de ‘nosso Tibre.’

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