Victoria e Mistério

“Victoria e Mistério”- “Vicky and her Mistery”, França, 2021

Direção: Denis Imbert

Oferecimento Arezzo

A natureza sempre foi o lugar da cura daquilo que nenhum outro remédio consegue amainar. Nessa história, baseada num fato da vida real, vamos acompanhar a adorável Vicky, uma garota de uns 8 anos de idade e seu pai. Ambos perderam uma querida mãe e mulher.

Victoria estava vivendo um luto tão pesado que parou de falar. Stéphane (Vincent Elbaz), pai de Victoria (Shanna Keil), muito preocupado, decidiu tirar um ano sabático e levar a filha para as montanhas de sua infância. Lá ainda existia a casa da família dele, toda de pedra, acolhedora e com uma bela vista para o vale. Ele pensava que mudar de cenário iria ajudar Victoria a superar a perda vivida com tanta dor.

Um dia, os dois foram caminhar nos arredores e acabaram se perdendo. Onde tinham deixado o carro?

Foi quando avistaram a casa de uma pequena fazenda, caminharam até lá e encontraram o dono, um senhor de idade, cabelos brancos e que olhava Victoria com pesar. Era uma daquelas pessoas que não precisam de palavras para entender o que se passava com a garota. Sentiu a tristeza e a solidão.

Victoria foi ao galpão próximo à casa enquanto o pai se informava sobre o caminho a tomar. Explorando o local, dentro de uma caixa, uma surpresa. Um filhote estava dormindo enroladinho. Pelos castanhos, orelhas pontiagudas e olhos cor de mel. Victoria alisa com carinho sua descoberta.

Chega o senhor, dono da casa e observa a cena. Diz:

“- Esse é um presente da floresta para você, que tem um coração puro. Vão se dar bem.”

“- Qual o nome dele?”

“- Mistério “, responde o senhor.

E o primeiro milagre acontece pois Victoria está falando.

Quando o pai escuta sua voz, não quer acreditar.

E quando Victoria pede para ficar com o filhote, como negar esse pedido a ela?

Mistério vai devolver para Victoria a alegria de viver. Os dois se tornam inseparáveis e o quarto da menina vira também o quarto de Mistério. Dormem juntos e brincam o dia inteiro. A felicidade volta a reinar naquela casa.

Mas o ser humano não aprendeu a conviver com os animais selvagens. Os pastores locais, armados de rifles, de tempos em tempos, eliminam todos os lobos da montanha. Protegem assim seus rebanhos de ovelhas.

Como Victoria e seu pai vão lidar com tal impasse? Como separar Victoria do seu melhor amigo?

“Victoria e Mistério” tem um final feliz. A menina teve que crescer e compreender que quem ama, cuida.

Mas o filme levanta questões que não estão resolvidas. Muitas espécies tem que ser protegidas de extinção.

Felizmente há ainda pessoas que se dedicam a proteger os animais que não sabem que seu destino depende de  gente assim.

Como seria bom que o ser humano pensasse mais a respeito. Porque não somos donos do planeta. Há outras vidas que precisamos proteger e que trazem beleza e diversidade para nossos olhos e corações.

Ler Mais

A Filha Perdida

“A Filha Perdida”- “The Lost Daugther” Estados Unidos, Grécia, 2021

Direção: Maggie Gylenhaal

A identidade da autora do livro, lançado em 2006, permanece obscura. Muitos procuraram identificar quem é Elena Ferrante. Até agora, o editor chamou de especulações erradas todas as tentativas de decifrar o enigma.

Maggie Gylenhaal, sem se preocupar com quem é Elena Ferrante, manteve um diálogo por correspondência com a pessoa que escreveu o livro e recebeu o aval para a adaptação, com a única exigência de que ela fosse a diretora e roteirista do filme. É seu primeiro longa e ela se saiu de maneira esplêndida.

A primeira cena é misteriosa. É noite. Uma mulher chega até a beira do mar e cai desacordada. Sonho?

Numa praia da Grécia, Leda Caruso, (Olivia Colman, magnífica), 48 anos, professora universitária, parece pronta a desfrutar de férias merecidas. Suas malas estão repletas de livros e ela vai aproveitar a calma do lugar para estudar e escrever seus trabalhos. É uma especialista em literatura italiana e literatura comparada.

Mas dura pouco essa tranquilidade. Pesarosa, vê chegar uma família barulhenta de americanos, se sentindo donos do lugar. Will, o estudante em férias que cuida da praia, conta para Leda que eles vem todo ano e alugam a vila rosa no alto da colina. E recomenda cuidado para não se encrencar com eles.

Leda observa o tumulto e as pessoas. Mas quem mais chama sua atenção é uma jovem mãe (Dakota Johnson) com uma filha pequena, que traz uma boneca maltratada com ela.

A partir de um encontro de olhares, um vinculo se forma entre as duas mulheres. Nina, a jovem mãe, lembra à Leda sua própria juventude e Leda é imaginada por Nina como sendo alguém que ela poderia ser no futuro.

O mundo feminino vai ser encarado em suas camadas profundas e vai obrigar Leda a reviver um passado que ela quer esquecer.

À noite, Leda acorda com uma cigarra pousada no travesseiro a seu lado, no quarto de janelas abertas. Um sinal de algo estranho? Outro sonho?

Em “flashbacks” vemos o que era a vida de Leda aos 20 e poucos anos, com duas filhas pequenas que a solicitam o tempo todo e sua irritação quando tenta dividir com o marido essa invasão constante de seu espaço, o que a impede de se concentrar e estudar, mesmo com fones de ouvido.

Dia seguinte, na praia, Leda vê a pequena Elena enfiar os dentinhos no rosto da boneca semi destruída e encharcada da agua do mar. Isso incomoda Leda. Quando Elena some, a família entra em pânico.

Sentimentos ambíguos sobre a maternidade são universais e inconscientes. São fantasias sobre a mãe poderosa, doadora da vida mas que pode também trazer a morte ou pior ainda, infernizar a vida da filha. E, numa frase da jovem Leda (Jessie Buckley), percebemos uma relação difícil com a própria mãe.

Na praia, a pequena Elena é encontrada mas a boneca sumiu. A menina quer ela de volta e não aceita substitutas. A jovem mãe conta para Leda que ela não consegue dormir porque Elena não dorme e chora o tempo todo.

Vemos aqui um circulo doentio entre mães e filhas que pode se perpetuar. Culpa e remorso tiram o sono dos adultos envolvidos. Uma auto exigência de não repetir a própria infância, torna as crianças dessas mães verdadeiras tiranas sem limites.

Mas há esperança para Leda. Ela acorda para a vida depois de reviver traumas antigos, que eram feridas abertas.

A boneca bem cuidada é o objeto bom internalizado que vai substituir a culpa pelas filhas abandonadas.

Certamente esse filme de mulheres sobre mulheres, assinado por Maggie Gylenhaal, vai figurar em várias categorias no Oscar 2022. Até porque mesmo as pequenas pontas como a de Ed Harris, a jovem Leda na pele de Jessie Brickley e a fotografia belíssima de Helene Louvat merecem indicações.

Não deixe de ver na NETFLIX!

Ler Mais